quarta-feira, 23 de junho de 2010
DE SARAMAGO...
Cheguei até aqui.
De agora em diante, Cuba seguirá seu caminho e eu fico.
Divergir é um direito que se encontra e se encontrará inscrito com tinta invisível em todas as declarações de direitos humanos passadas, presentes e futuras. Divergir é um ato irrenunciável de consciência. Pode ser que divergir conduza a traição, mas isso sempre tem que ser demonstrado com provas irrefutáveis.
Não acredito que se tenha agido sem deixar margem à duvidas no julgamento recente de onde sairam condenados a penas desproporcionais os cubanos dissidentes. E não se entende, se houve conspiração, porque não foi expulso o encarregado da Seção de Interesses dos EUA em Havana, a outra parte da conspiração.
Agora chegam os fuzilamentos. Sequestrar um barco ou um avião é um crime severamente punível em qualquer país do mundo, mas não se condena a morte os sequestradores, principalmente tendo em conta que não houve vítimas.
Cuba não ganhou nenhuma batalha heróica fuzilando esses três homens, mas perdeu minha confiança, quebrou minhas esperanças, traiu meus sonhos.
Cheguei até aqui.
Será que Frei Betto, Chico Buarque ou Niemeyer terão coragem política e honestidade intelectual um dia pra escrever coisa semelhante???
Registro, com enorme pesar, o falecimento do escritor português José Saramago, um sujeito a quem eu atribuo o título de Gênio das Letras sem qualquer vacilação.
Quando tomei contato com sua literatura, lendo Memorial do Convento no começo dos anos 80, senti um verdadeiro choque. A primeira coisa que me veio à cabeça foi que, a partir de Saramago, toda prosa de ficção em língua portuguesa teria que ser revista. Lendo O Evangelho Segundo Jesus Cristo, reforcei e consolidei esta minha convicção.
E passei a dividir os romancistas em duas categorias: os Escritores com “E” maiúsculo, assim feito Saramago, e os contadores de história, assim feito eu e outros que conheço. Não é por acaso que Saramago é o único Prêmio Nobel de Literatura da Língua Portuguesa, recebido em 1998.
À grande admiração que tenho por ele como Escritor, somou-se a admiração recente como pessoa humana e militante político. Comunista de carteirinha, Saramago teve ombridade e coragem moral e intelectual para fazer a célebre declaração “Cheguei até aqui”, ao tomar conhecimento das últimas prisões e execuções de dissidentes cubanos. Era a proclamação que marcaria o fim da admiração que tinha pela tirania de Fidel Castro. Achei fantástica e corajosa a sua decisão, pois tratava-se de coragem para enfrentar a Confraria dos Cegos a nível mundial. Mas de cegos ele entendia muito, tanto que escreveu a obra-prima “Ensaio Sobre a Cegueira” .
Ele morreu hoje, sexta-feira, em Lanzarote, Ilhas Canárias, aos 87 anos. Nasceu em 1922, em Azinhaga, aldeia ao sul de Portugal, numa família de camponeses.
O mundo perde um gênio e um grande sujeito.
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