domingo, 27 de novembro de 2011

UM FOLHETO DE CORDEL...





Um folheto de José Honório da Silva

A volta de Virgulino para consertar o sertão

Conta Caetano Veloso
Num verso espetacular:
“Minha mãe me deu ao mundo
De maneira singular
Me dizendo uma sentença
Pra eu sempre pedir licença
Mas nunca deixar de entrar”.

E por isso eu peço à História
E aos guardiões da verdade
Permissão para escrever
Com natural liberdade
Solto no tempo e no espaço
Um tema sobre Cangaço
Justiça, Moralidade.

O tempo bom já se foi
Muita gente pensa assim
E se a vida era difícil
Por certo está mais ruim
Parece até que este mundo
Mergulha num caos profundo
Já decretando o seu fim.

Hoje em dia só se vê
Guerra, sequestro, atentado
Miséria, fome, doença
Vulcão, enchente, tornado
Desemprego, violência
Corrupção, indecência
Se espalham por todo lado

Os jovens sem esperança
Que haja melhores dias
Se entregam logo às drogas
Às badernas e às orgias
Amparando-se em galeras
Se tornam vorazes feras
Fazendo selvagerias.

Políticos demagogos
Jurando santa inocência
Só se elegendo por serem
Uns ladrões de consciência
Mantendo o povo carente
E por isso dependente
Dos programas de assistência.

Também os capitalistas
Que lucram com a pobreza
Dão apoio a esses homens
Pensando só na riqueza
Nos bancos seu saldo cresce
Enquanto o povo padece
Sem comida sobre a mesa.

Pior mesmo são aqueles
Que plantam a tal da maconha
Vendendo falsa alegria
A quem a ela se exponha
Perde a liberdade, o tino
Se tornando um libertino
Viciado e sem-vergonha.

Mas a praga mais atroz
Atende por Impunidade
Quem tem poder pinta e borda
Quer no campo ou na cidade
Porém nada lhe acontece
Só o pobre é quem conhece
O rigor da autoridade.

E aí o povo pira
Sem saber o que fazer
Quem é reto raramente
Prova o gosto do vencer
Já o troncho se sai bem
Mangando sempre de quem
Vive no mundo a perder.

Mas no Nordeste houve um tempo
Que a coisa foi diferente
Os poderosos de antanho
Sentiram que à sua frente
Um outro poder nascia
Afrontando a tirania
Sem temer ouro ou patente.

Velames e macambiras
Deram moldura à odisséia
E muitos já escreveram
Sobre essa grande epopéia
Como eu nunca pesquisei
Com o pouco do que eu sei
Aqui dou só uma idéia.

Quer força seria esta
Que causou apreensão
A quem achava ter o
Mundo na palma da mão
Foi ela um cabra-da-peste
Este El Cid do Nordeste
VIRGULINO, LAMPIÃO

Por muito tempo causou
Grandioso rebuliço
Enfrentando os poderosos
- O povo precisa disso -
Desde quando começou
Virgulino demonstrou
Que não brincava em serviço.

Igual ao vate Camões
Na luta perdeu uma vista
Mas em termos de campanha
Foi um bom estrategista
Em fileira a tropa andava
E o derradeiro apagava
Seus rastros, pra não dar pista.

Se morresse um cangaceiro
Levavam o corpo consigo
Escondendo pois a baixa
Confundindo o inimigo
A outro seu nome dava
E a macacada pensava
Que ainda era o antigo.

São estes rasos exemplos
Da sua pródiga malícia
Por isso Lampião foi
Expoente na milícia
Sendo assim, anos a fio
Com astúcia conseguiu
Dar um quinau na polícia.

A quem tinha o bom guardado
Pedia contribuição
Se atendesse ao pedido
Dava eterna gratidão
Mas ai daquele sujeito
Que dissesse “não” ao pleito
Do Grande Rei do Sertão.

Não há bom sem ter defeito
Sempre ouvi do meu avô
Se matou gente inocente
E moçoilas profanou
Foram cenas isoladas
Em horas desatinadas
Isso Deus lhe perdoou.

O que vinga para a História
É que o grande Virgulino
Procurou fazer justiça
Forjado pelo destino
À elite fazendo ver
A pujança e o poder
Do matuto nordestino

Porém na Fazenda Angicos
Essa fase se findou
O poder dos potentados
De novo sozinho reinou
Mas para o povo sofrido
Lampião não foi vencido
Não morreu, só dormitou.

Mas o Sino-Salomão
Acabou de revelar
Que esses modernos algozes
Não perdem por esperar
Pois pra nossa salvação
O nosso herói, Lampião
Breve, breve, irá voltar.

Já formou sua nova tropa
Seu roteiro está traçado
Muita arma e munição
Deixa o bando preparado
Da alpercata à testeira
Pra cantar “Mulher Rendeira”
E se esbaldar no xaxado.

Pra não perder muito tempo
Nem sair da direção
Se verá na próxima estrofe
Uma curta relação
Cujos nomes metem medo
E revelam um segredo:
São os cabras de Lampião.

Inocêncio, Meteoro
Pau-de-Sebo, Mutirão
Torpedo, Dila, Vandame
Zé Orvalho, João Tufão
Raio Laser, Mó-Sentado
Rola-Grossa, Delegado
Terremoto e Folião.

Começarão perseguindo
O cafajeste que ilude
Crianças que mal adentram
No verdor da juventude
Pra vender corpo e moral
Esse vai morrer no pau
Sem ninguém que lhe ajude.

Prefeito que contratar
Trio Elétrico no São João
Renegando a melodia
De xote, coco e baião
Ficará nuzinho, pelado
Para dançar um xaxado
De costas pra Lampião.

Mas também quem só gastar
Grandes somas de dinheiro
Com essas bandas medíocres
Que tocam forró fuleiro
Inventado por cearense
Manda avisar que não pense
Que escapa do cangaceiro.

Sua Excelência, o político
Que não honrar seu mandato
Crescendo às custas do sangue
Do povo ordeiro e pacato
Lampião já avisou:
A esse perdão não dou
Mas lhe surro, capo e mato.

Salteador das estradas
Cantadas por Marcolino
Se não der um basta nisso
Será triste o seu destino
Vai comer quilo de sal
E engolir um Sonrisal
A mando de Virgulino.

E o plantador de maconha
Perdição da juventude
Trate logo de parar
Peça que o bom Deus lhe ajude
Mas caso não se arrependa
Faça logo a encomenda
Ligeiro, dum ataúde.

Onde e quando voltará
Ninguém tem convicção
Mas parece que o Nordeste
Só tem mesmo solução
Com a vinda de um sujeito
Com raça, coragem e peito
Do valente Lampião.

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