quarta-feira, 27 de abril de 2011
UMBIGOFOBIA...
SIMONE MOURA E MENDES.
Muito respeito pela integridade daquela cavidade redonda e cheia de reentrâncias, localizada em seu abdômen; pois, em algum tempo da infância, alguém lhe dissera que uma mínima perfuração no umbigo seria capaz de matar uma pessoa. Cresceu acreditando nesse mito e, mesmo com o advento da razão, jamais permitia que a esposa, os filhos, ou quem quer que fosse, introduzissem o dedo no centro de sua vida, no ponto a partir de onde fora separado da mãe.
Ao descobrir esse esdrúxulo ponto fraco, sua família logo deslindava se, quando estava com as mãos cruzadas sobre o peito e a respiração suspensa, estaria a repetir a rechaçável brincadeira de se fingir de morto. O simples ato de ter o umbigo invadido por um dedo alheio culminaria no milagre da ressurreição – era cediço. Essas cenas foram tantas vezes repetidas, que ele já fingia sucumbido com as mãos sobre a cavidade proibida; assim, sua interpretação novelesca angariaria o benefício da dúvida. Mas, confesse: dessa vez não fui perfeito? Sempre indagava. Nunca, enquanto estiver a proteger o umbiguinho – respondia quem fosse o suposto enganado.
Por ironia do destino, submetera-se a extração de uma hérnia umbilical, mediante uma pequena incisão no orifício místico, após quatro anos de velada resistência. Ao invés de deixar um dreno para a liberação das impurezas orgânicas, o médico lhe fez uma razoável abertura no interior do umbigo, incumbindo a esposa de reabri-la sempre que lhe substituísse os curativos, o que recomendara ser feito duas vezes ao dia até ulterior avaliação. Nessa ocasião, a esposa incrédula lia seus pensamentos, seu pânico contido, a ponto de quase se desconcentrar das explicações médicas. Pobrezinho do meu marido ou seria a oportunidade de curar sua umbigofobia?
Décimo quarto curativo e, ui,ui, uiuuiii… Que foi dessa vez, rapaz? Mal trisquei em você?! Com uma fisionomia de insuperável sofrimento, lágrimas dispostas à precipitação, o marido respondeu aflito: você não sabia que tenho agonia quando o meu umbigo é violado? Por favor, não ria de mim, que a coisa é séria!
A esposa se despira do personagem da enfermeira doce e dedicada e irrompeu em ruidosas gargalhadas… Não concebia que um homem daquele tamanho fosse capaz de verter lágrimas pueris por causa de um cotonete no umbigo, sobremodo, quando da iminente cicatrização do orifício propositadamente elaborado pelo competente cirurgião.
O passo seguinte será uma consulta ao psicólogo na esperança de que haja alguma abordagem psicoterapêutica que cure a umbigofobia. Será que há?
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário