terça-feira, 3 de maio de 2011
A MOÇA QUE HEITOR ARRANJOU...POR BERNARDO CELESTINO PIMENTEL.
Há quarenta e cinco anos tenho amizade com Heitor Felipe...é um homem que toca violão e cavaquinho, e gosta de tocar...conhecí Heitor com dez anos,no bar de Domício Vicente,em Nova Cruz.Tocamos as vezes, cinco horas seguidas...ele gosta tanto de tocar, como eu.
Heitor foi coletor em campestre e em João càmara, e começou como guarda de porteira em Passa e Fica.Sempre passou a semana no interior, e o fim de semana na capital.Numa destas viagens, trouxe uma moça do sítio,para ajudar maezinha, sua esposa.
A moça era um bicho,criado no mato...era fanha, era gaga,e de vocabulário restrito...
No domingo, as seis horas da matina,Dona maezinha lhe deu uma nota de dez reais e dissse:VÁ NA PADARIA E COMPRE CINCO REAIS DE PÃO,ALÍ NA ESQUINA...A Moça prendeu o dinheiro na palma da mão, pressionando com os dedos,esboçando toda a responsabilidade do mundo para executar a tarefa...Deu oito horas e a moça Não voltou,Deu doze, deu dezoito horas e nada da moça, e o dia foi de chuva...maezinha já estava aperreada...será que ela se perdeu? houve algum acidente? foi uma angústia e expectativa para todos da casa...já se queria procura-la no ITEP...Mas, as vinte e uma horas, chega a moça toda molhada, de mão fechada apertando o dinheiro,e o dinheiro estava quente, e mecânicamente fala:NÃO TEM CANTO NENHUM...ou seja , a moça procurou o dia inteiro,andou kilometros, foi nas quintas, foi na praia, procurando o pão em lugar errado, SEM COMER E SEM BEBER...ESTAVA EXAUSTA.
Certa vez, maezinha deixou-a mexendo uma canjica,ela muito séria, compenetrada, mexia a colher de pau, com toda a seriedade e responsabilidade do mundo...lá para as tantas maezinha perguntou:está perto? ela respondia:CHEIRINHO DE CÚ...maezinha dizia , o que? tá perto de tirar do fogo? ela voltava a responder:CHEIRINHO DE CÚ...traduzindo, ela queria dizer que estava longe, que o milho ainda estaca CRU...
O máximo de Maria, foi um sábado que Heitor chegou de João Câmara e tocou na campanhia... Maria brechou, viu um homem, e não abriu a porta...Heitor tocou na campanhia, uma hora...Maria brechava e voltava pra cozinha...Heitor resolveu fazer hora na rua, enquanto chegasse outra pessoa, em casa.
AO conseguir entrar em casa questionou a esposa:eu toquei a campainhia uma hora, e Maria nem falou, nem abriu a porta...maezinha foi interroga-la:MARIA, POR QUE VOCE NÃO ABRIU A PORTA?ELA RESPONDEU:ABO NÃO,ERA UM HOMEM BANCO... tem medo...ELA QUIS DIZER,NÃO ABRÍ POR QUE ERA UM ESTRANHO, UM HOMEM BRANCO...OU SEJA, Não RECONHECEU O DONO DA CASA.
Heitor hoje está com oitenta e quatro anos e botou marca -passo...mas,já engomando, ainda tem prazer em tocar...Na segunda feira de carnaval,nos encontramos na Barra de Cunhaú,tocamos a noite toda...eu tocando violào, ele no cavaco e Elson Menezes na percussào...cantamos muito, eu e a mana Violante,e a música mais tocada foi:ELA DESATINOU...
Ela desatinou
Chico Buarque
Composição : Chico Buarque
Ela desatinou, viu chegar quarta-feira
Acabar brincadeira, bandeiras se desmanchando
E ela inda está sambando
Ela desatinou, viu morrer alegrias, rasgar fantasias
Os dias sem sol raiando e ela inda está sambando
Ela não vê que toda gente, já está sofrendo normalmente
Toda a cidade anda esquecida, da falsa vida, da avenida
Onde Ela desatinou, viu morrer alegrias, rasgar fantasias
Os dias sem sol raiando e ela inda está sambando
Quem não inveja a infeliz, feliz
No seu mundo de cetim, assim,
Debochando da dor, do pecado
Do tempo perdido, do jogo acabado
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