quarta-feira, 18 de maio de 2011
SOBRE PERFUME...AINDA NÀO VÍ UM SÁBIO QUE NÀO SE PERFUMASSE...SIMONE DE BEAVOIR...
CADA JOCA COM O SEU PERFUME
Festa da padroeira de Nazaré da Mata.
A cidade era toda rebuliço.
Roupas novas, matutos chegando da roça com os seus trajes de missa de Natal. Parque de diversões animando a garotada e a juventude. Jovens namorados trocando juras pelas esquinas e bancos de jardins. Cadeiras nas calçadas. Velhos relembrando os chamados “bons tempos” de outras festas semelhantes da mocidade.
Nazaré da Mata seria, no dizer do poeta, um “céu aberto”, “um paraíso terreal”, naquela noite em que se comemorava a festa de Nossa Senhora da Conceição, tal a movimentação que existia nas até então pacatas ruas.
As bandas de música Capa Bode e Revoltosa, com seus uniformes novos, sapatos engraxados, instrumentos reluzentes, marchavam garbosas pelas ruas, recebendo aplausos de seus aficcionados.
No coreto, bem em frente à matriz, Mestre Joquinha, da Revoltosa, reunia os seus músicos em mais uma grande retreta, para alegria de todo o povo nazareno, que tem em suas bandas as melhores expressões de sua cultura.
Porém, um perfume de forte e enjoado odor “incensava” o ambiente do coreto, de a Revoltosa deveria tocar.
Mas, parecia que havia sido derramado um tonel daqueles “extratos” só vendidos nas feiras do interior.
Músicos se interrogavam entre si – seria a brilhantina de um ou a loção do outro (?) – a pergunta pairava no ar e até alguns espectadores estavam a notar a movimentação.
Saindo da tranquilidade que lhe era peculiar, Mestre Joquinha iniciou a sua pesquisa entre os músicos da Revoltosa.
Finalmente, sentiu que tal “cheiro” era causado por Joca da Trompa, preto alto, magro, cabelo estirado à força de banha, barba feita, que tomara um verdadeiro banho de tal “extrato” para assim poder melhor se apresentar no dia da padroeira.
Perdendo a calma, fulo de raiva, incomodado com o tal perfume que tomava conta do ambiente e tirava a seriedade de toda a banda de música, com o acúmulo de brincadeiras por parte dos componentes, o Mestre Joquinha aproveitou o intervalo da retreta para passar um “rela” em Joca da Trompa.
Erguendo a batuta, esbravejando na ponta dos pés, o velho regente da Revoltosa disse o que quis e o que não queria dizer ao “perfumado” trompista.
Ouvindo tudo em silêncio, Joca esperou que o Mestre terminasse a sua preleção para lhe fazer uma pergunta que ficou famosa pelos anos que se seguiram.
Feito o silêncio, foi a vez de Joca interrogar o Mestre, diante dos demais músicos, na mais pura inocência de homem de poucas letras:
– “Ô mestre Joquinha?! Qua é a leis que improíbe o oroma da fulô?!”
Os músicos da Revoltosa caíram numa só gargalhada e o Mestre Joquinha morreu sem saber explicar o que parecia simples, no raciocínio de Joca da Trompa:
Cada flor com o seu aroma, cada Joca com o seu perfume…
LEONARDO DANTAS.
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