ELOGIO DO SORRISO
Erasmo de Rotterdam, no séc. XVI, escreveu um Elogio da Loucura, em que a loucura aconselha aos homens em diversas situações da vida, principalmente em questões políticas. O meu Elogio do Sorriso apenas no título é uma analogia àquela célebre obra de Erasmo. Mas a minha consideração também trata de referências políticas.
Estamos em período eleitoral. Todos os dias cruzamos com centenas de fotos de candidatos a cargos políticos. Em eleições anteriores nunca tinha reparado, como agora, que, nestas fotos, tantos políticos estivessem rindo, ou, se quiserem, sorrindo.
No séc. XX a obra mais importante sobre o Riso é a do filósofo francês Henri Bergson. Neste seu livro “O Riso”, Bergson explica que somente o ser humano é capaz de rir. Portanto, os sorrisos de nossos candidatos são uma atitude tipicamente humana. É verdade, alguns etnólogos conjeturam que, no mundo animal, alguns quadrúpedes emitem sons que lembram risadas, como as hienas, os cavalos…, mas isto apenas são conjeturas. Dali a convicção de que o sorriso dos nossos candidatos é uma demonstração humana. Contudo, o riso humano pode ter vários motivos e sentidos. Por isto me pergunto: por que tantos rostos sorridentes antes das eleições? Será uma terapia do riso? Será a alegria antecipada da eleição ganha? Ou estarão rindo sarcástica e ironicamente dos incautos que, ingenuamente, se deixarão encantar com a magia do sorriso?
Qualquer que seja o motivo subjetivo de tantos candidatos se apresentarem sorridentes, não penso que o povo deva escolher os seus representantes políticos a partir da qualidade dos sorrisos, porque um tem dentes mais brancos que outro, ou porque um sorri por debaixo do bigode e outro sem bigode. Na realidade do dia-a-dia não cruzamos com tantos sorrisos. Basta observar as paradas de ônibus, quando o povo vai ou volta do trabalho; um dia cheio de canseiras, mas, muitas vezes, sem um resultado compensador; as filas do SUS; os desempregados; o medo da violência, a falta de moradia digna, os sem-terra, os sem-teto…
Diante de tantas necessidades o sorriso dos políticos não parece oportuno. Quando observamos os risos humanos, constatamos que há pessoas que riem morbidamente. Em enterros, às vezes, acontece que o choro se inverte em riso. E todos se escandalizam com tais risos fora de hora. Esquizofrênicos, em suas angústias, podem rir absurdamente. E tais risos provocam a nossa compaixão.
E quantos risos diante de desgraças humanas! Há pessoas que gritam “bem feito”, e dão uma risada, quando algum desafeto seu cai em desgraça. Diante de tantas motivações e sentidos relacionados com risos e sorrisos, da minha parte, tomo cautela frente a tantos quadros sorridentes de candidatos políticos. Oxalá estejam rindo no sentido dos antigos romanos, que diziam: “é rindo que se mudam os costumes”.
Se este for o motivo de tantos candidatos sorridentes, então estamos diante de uma nova era política em que costumes viciados de Assembleias e Câmaras serão definitivamente extirpados. E o povo elegerá representantes que somente cuidarão do bem comum, da justiça e da felicidade geral dos cidadãos. E todos poderemos rir e sorrir abundantemente.
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