quarta-feira, 12 de setembro de 2012

LITERATURA DE CORDEL...



Arievaldo Vianna e Moacir Morram glosando o mote:
Se você já se esqueceu,
Eu vou te fazer lembrar.
Arievaldo Vianna
No meu tempo de criança,
Eu assistia reisados,
Lendas de reis encantados,
Que não me saem da lembrança:
Os Doze Pares de França
Com turcos a pelejar,
Cantador improvisar…
E tudo me comoveu!
Se você já se esqueceu,
Eu vou te fazer lembrar.
Moacir Morram
Rebuscando a tradição,
Eu me lembro de Trancoso
E do Pavão Misterioso,
Como marcas de um brasão,
Que simboliza a nação
Tão digna, desse lugar,
Que soube bem preservar
Tudo aquilo que era seu!
Se você já se esqueceu,
Eu vou te fazer lembrar.
Arievaldo Vianna
Lembro a famosa “Chegada
de Lampião no Inferno”
Um clássico, logo, eterno,
Por sua forma engraçada.
Lembro a Peleja inventada
De Aderaldo a travar
A língua, para enganar,
E o Pretinho se perdeu…
Se você já se esqueceu,
Eu vou te fazer lembrar.
Moacir Morram
Está no livro da mente,
Todo escrito com a lembrança,
O passo de cada dança,
O segredo do repente!
E cada aboio estridente
Que se escuta, num cantar,
É a tradição popular
Que, pro povo, não morreu!
Se você já se esqueceu,
Eu vou te fazer lembrar.
Arievaldo Vianna
Quem bebeu água de pote,
Atirou de bolandeira,
Trepou-se na cumeeira,
Chamou turma de “magote”,
Chamou sapo de “caçote”,
Foi pra novena rezar,
Viu a fogueira estalar,
Em noite escura de breu…
Se você já se esqueceu,
Eu vou te fazer lembrar.
Moacir Morram
 
Tem Mateus e Catirina,
Tem Jaraguá e Papangu,
Embolada e cururu,
Tem sanfona e concertina!
Tem até Festa Junina
Pra quem gosta de dançar!
E hoje eu vou te ensinar
O que não tem no liceu:
Se você já se esqueceu,
Eu vou te fazer lembrar.
Arievaldo Vianna
 
Tem quixó e tem preá.
Tem arataca e mocó.
Tem macumba e catimbó.
Tem batata e tem cará.
Jangadas, do Ceará,
Deslizando pelo mar!
Tem quenga, tem lupanar,
Tem Zé Ramalho e Alceu…
Se você já se esqueceu,
Eu vou te fazer lembrar.
Moacir Morram
Procissão para Maria,
Na igreja e no candomblé,
A batida do toré,
Vodu e feitiçaria,
Que revelam a magia
De um mosaico secular!
E que é preciso estudar
Do começo ao apogeu!
Se você já se esqueceu,
Eu vou te fazer lembrar.
Arievaldo Vianna
Relembre o Cego Aderaldo
E o Pinto do Monteiro,
Um professor verdadeiro
Do poeta Arievaldo…
Uma feijoada, seu caldo,
O compadre vai provar…
É um prato secular,
Que o africano nos deu.
Se você já se esqueceu,
Eu vou te fazer lembrar.
Moacir Morram
A História, oral e escrita,
Nesse país de mistura,
É o que alimenta a cultura,
A popular e a erudita!
Coco, Frevo e Pau-de-Fita,
E saraus, pra te encantar…
Tanta coisa pra citar
Que encheria o Coliseu!
Se você já se esqueceu,
Eu vou te fazer lembrar.
Arievaldo Vianna
Folguedos da Cavalhada,
Papangu, Mineiro-pau,
Canjica, angu e curau,
Em bela noite estrelada!
Na fogueira iluminada,
Num fole velho a tocar,
Num violeiro a cantar
Cantigas que aprendeu!
Se você já se esqueceu,
Eu vou te fazer lembrar.
Moacir Morram
O pastoril, o Xaxado,
Ciranda e Maracatu!
Um caldinho de aratu,
Um carneiro bem guisado.
Um alpendre ventilado,
E uma rede pra deitar
Olhando, de noite, o luar,
Que, lá em cima, apareceu!
Se você já se esqueceu,
Eu vou te fazer lembrar.
Arievaldo Vianna
Lembro do feijão tropeiro,
Do cuscuz com rapadura,
Da nossa Literatura,
Do cordel mais brasileiro!
Lembro o trovão de janeiro,
Quando a chuva vai chegar
No Nordeste, meu lugar,
Recanto que Deus me deu…
Se você já se esqueceu,
Eu vou te fazer lembrar.
Moacir Morram
Todos os Cordéis da vida,
Cantorias do sertão,
As obras de um artesão,
Todo tipo de comida,
A tradição aprendida
Como sangue, a circular…
É que nos faz avançar
E descobrir nosso “eu”!
Se você já se esqueceu,
Eu vou te fazer lembrar.
* * *
Pedro Ernesto Filho glosando o mote:
Minha casinha é aquela
no pé de serra esquisito.
Você que passa na estrada
doente, com fome e sede,
não tem lençol nem tem rede,
procure minha morada;
lá ninguém ouve zoada
nem discussão nem atrito,
perseguição e conflito
passam bem distante dela.
Minha casinha é aquela
no pé de serra esquisito.
Lá não tem televisão,
a luz elétrica é a lua,
só anda gente da rua
no tempo de eleição,
lá se faz renovação
com reza, graça e bendito,
homem não pensa em delito,
mulher não fala em novela.
Minha casinha é aquela
no pé de serra esquisito.
O teto é feito de palha,
só tem telha no capote,
a geladeira é um pote,
o gás butano, a fornalha;
uma cerca é a muralha,
o cadeado, um cambito;
a campainha é um grito;
o portão, uma cancela.
Minha casinha é aquela
no pé de serra esquisito.
Quando quiser um “socorro”
vá por um caminho estreito
e siga o lado direito
logo que passar o morro;
se encontrar um cachorro
não tem que ficar aflito,
só basta dar um apito
que vou tirando a tramela.
Minha casinha é aquela
no pé de serra esquisito.
Que seja fora de hora
ou sol quente como brasa,
você dizendo ô de casa,
eu lhe respondo ô de fora,
querendo você demora
no lugar onde eu habito,
não tem piso de granito,
mas tem feijão na panela.
Minha casinha é aquela
no pé de serra esquisito.
A água se traz do rio
em ancoreta e cabaças,
são mais de trezentas braças
entre a casa e o baixio;
no mês de junho faz frio
que a neve cobre o infinito,
parecendo um manuscrito
que Deus escreveu na tela.
Minha casinha é aquela
no pé de serra esquisito.
Lá a gente pode ter
o azul do horizonte,
devido o topo do monte
o sol demora a nascer,
da calçada dá pra ver
sapo engolindo mosquito,
cabra chamando o cabrito
para estar na sombra dela.
Minha casinha é aquela
no pé de serra esquisito
No oitão tem um quintal
que até protege a cozinha,
dois chiqueiros de galinha
bem pertinho do curral;
para amarrar animal,
um pé de árvore bonito;
no frechal tem um cambito
para enganchar sua sela.
Minha casinha é aquela
no pé de serra esquisito.

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