terça-feira, 20 de dezembro de 2011

SIVUCA...








Filha do músico fala com exclusividade sobre o livro que ela organizou e editou

A filha do músico paraibano Sivuca (in-memoriam) a socióloga Flávia Barreto colocou no mercado editorial o livro “Sivuca e a Música do Recife”, a única obra existente no Brasil sobre esse que foi um dos maiores gênios da música brasileira e mundial.
Severino de Araújo Dias (o Sivuca) nasceu na cidade de Itabaiana, interior da Paraíba, e depois ganhou o mundo. Sivuca morou na Europa e nos Estados Unidos, aonde chegou a gravar grandes discos e até recebeu um elogio de Miles Davis (um dos maiores e mais geniais solistas e arranjadores do Jazz) que confessou só ter passado a suportar o acordeom depois de ouvir o albino paraibano tocá-lo.
Flávia Barreto me concedeu uma entrevista exclusiva na qual fala do livro e de outros projetos que devem se concretizar muito em breve.
Confiram a entrevista na íntegra a seguir.
- Por que situou o livro apenas na atuação de Sivuca no Recife?
O livro “Sivuca e a Música do Recife”, foi a conseqüência de um enorme esforço de pesquisa que gerou, sobre a cidade do Recife material bastante substancial e que não podia ser desprezado. Em conseqüência do estímulo que recebi por parte de Fernando Duarte, atual Secretário de Cultura do Estado de Pernambuco, e que na ocasião estava à frente da Fundação de Cultura Cidade do Recife, vinculada à Prefeitura, decidi fazer uma primeira publicação que tratasse especificamente desta etapa da vida de meu pai.

- A formação musical dele começou no Recife?
Sim. Recife foi a cidade em que Sivuca se formou, entre as décadas de 40 e 50, e ali alcançou um prodigioso desenvolvimento do seu talento natural. Uma conjugação de fatores contribuiu para que isso se desse. Desde o convívio com grandes nomes da cultura musical brasileira, vinculados a variados gêneros musicais, à inúmeras oportunidades de tocar com instrumentistas de formação variada, popular ou clássica. Dentre muitos, todos igualmente relevantes, posso destacar o maestro Guerra-Peixe, que introduziu o jovem Sivuca nos mistérios da harmonia e da orquestração. O livro trata especificamente da relação de Sivuca com a cidade do Recife e busca situar em minúcias as peripécias vividas por ele na juventude, além das experiências com a Orquestra Sinfônica pernambucana.

- Tem algum outro projeto em livro sobre o mestre Sivuca?
Certamente, o livro “Sivuca e a Música do Recife” não abarca toda a trajetória da vida profissional de meu pai. Estou nos últimos arremates do projeto gráfico do próximo livro, que estará disponível ao público no início de 2012. Agora sim, virá a biografia completa, disposta em sete capítulos que tratam com maior abrangência da vida e da obra dele “Magnífico Sivuca Maestro da Sanfona”. Diferente do primeiro, em que compartilhei a elaboração com um jornalista, que acompanhou de perto o processo de pesquisa, “Magnífico Sivuca” foi exclusivamente escrito por mim. Trata-se de livro direcionado para um público mais diversificado, com o objetivo de sensibilizar principalmente os jovens sobre a contribuição de Sivuca para a cultura musical brasileira. Por isso, o texto está mais acessível, com a preocupação de ter um tom menos acadêmico do que o primeiro, que foi destinado a um público de apreciadores.
- Pretende investir no mercado estrangeiro com esse livro?
O segundo livro está programado para um processo de divulgação mais abrangente do que o primeiro. “Sivuca e a Música do Recife” trata de um ambiente bem definido e acredito que pode ser considerado como uma referência para quem quer entender melhor o contexto musical recifense. “Magnífico Sivuca Maestro da Sanfona” inclui as experiências de meu pai em vários países, e com certeza, vai atrair a curiosidade de um público de apreciadores do trabalho musical de Sivuca, nos Estados Unidos e na Europa. A tradução para o inglês está avançadíssima e espero que tão logo seja lançado no Brasil, o mesmo aconteça no exterior. Além do lançamento do livro para o exterior, pretendo cumprir uma agenda bem planejada de lançamentos por vários estados brasileiros. Isso inclui a Paraíba e demais estados do nordeste, locais em que devo estar ainda no primeiro semestre de 2012. Temos organizado um circuito de eventos institucionais, além de universidades e livrarias.


- Você tem planos de investir na fase musical de Sivuca na Paraíba?

Sua pergunta contém uma boa sugestão. Porém, por enquanto, precisarei de algum tempo para divulgar os dois livros que já estão prontos até começar a abranger outro viés do percurso de Sivuca. Provavelmente, o terceiro passo na produção literária será cuidar da publicação de “A Bossa Nova de Sivuca”, um trabalho de minha autoria, que mereceu o prêmio Crítica Musical da FUNARTE, em 2008.

- Você organizou algum site com a obra de seu pai?
Está em processamento um novo site para a divulgação a todo o público de estudiosos, pesquisadores e jornalistas, em que estará disponibilizado em boa parte, o material levantado pela pesquisa. Será indiscutivelmente o site mais completo sobre Sivuca. Ele só será disponibilizado ao público após o primeiro evento de lançamento do livro, que deverá acontecer no Rio de Janeiro. Está citado nas notas do livro como sugestão de consulta aos leitores que desejarem maiores esclarecimentos, além daqueles que estão contidos no texto. Sabemos que para contar uma história biográfica nem sempre podemos soterrar o leitor em uma narrativa tediosa, que acumula informações e perde de vista a dinâmica e a emoção dos acontecimentos. Especificamente para o jovem leitor, a narrativa precisa acontecer com bastante leveza. Assim, os dados informativos foram entendidos como complemento e estarão disponíveis no novo site.

- Ainda existem discos lançados no exterior que não foram lançados aqui. Você pretende ir atrás dessas obras?
É verdade. A maior parte da discografia de Sivuca não foi lançada no Brasil. Ele teve discos gravados em Portugal, França, Suécia, Estados Unidos e Japão. Por esse motivo, ele possui muitos fãs no exterior. Já fui atrás dessas obras e elas estão catalogadas e digitalizadas em um acervo completo sobre a discografia de Sivuca. O acervo organizado por mim contém, inclusive, todas as gravações de Sivuca em 78 rotações. Este material é muito rico e foi analisado em minúcias na biografia. Segui uma perspectiva cronológica, como embasamento para a reflexão em torno da vida e da obra de nosso querido sanfoneiro.

- Qual foi a parte mais marcante da discografia que você pesquisou?
A parte mais impactante do levantamento da discografia de Sivuca são as participações dele em discos de outros artistas. A quantidade de títulos é extraordinária e os gêneros musicais são os mais diferentes. Encontramos Sivuca em discos que vão desde o pop rock brasileiro e internacional, até exercícios de piano a quatro mãos. O público leitor da biografia “Magnífico Sivuca Maestro da Sanfona” irá se surpreender com a amplitude da revelação de um Sivuca que já havia sido consagrado nacionalmente como maestro, em 1948.

- Dos discos de Sivuca quais deles os direitos lhe pertencem? Quem detém os direitos sobre a discografia de Sivuca?
É interessante a sua pergunta e bastante atual. Os discos são propriedade de várias gravadoras e compõem os acervos destas companhias. Quando uma gravadora nacional é comprada por outra multinacional, os acervos são transferidos. Algo semelhante à condição do escritor que entrega suas obras às editoras e perde o controle sobre elas. Se não houver o interesse ou mobilização por parte das gravadoras para reeditar os antigos títulos, os fonogramas ficam perdidos em depósitos. O problema atual é que o mundo digital abriu inúmeras possibilidades de acesso a gravações que até então, poderíamos dizer que estavam perdidas. A facilidade de acesso a toda uma sorte diversificada de gravações está impondo uma mudança substancial no universo da venda de discos. Ainda veremos o aprofundamento de tantas mudanças. Por causa dessa realidade em metamorfose, por exemplo, o Ministério da Cultura está convocando a sociedade a participar da discussão sobre a reestruturação da legislação dos direitos autorais. Assim, a venda de discos e a sobrevivência das gravadoras são parte deste universo em metamorfose.
- E discos, o público pode aguardar novidades?
Estou certa de que todo o trabalho que desenvolvo desde 2006, para manter viva a memória de meu pai, vem contribuindo para motivar o público em busca dos discos de Sivuca. Esse movimento gera uma demanda, que pode vir a sensibilizar as gravadoras para reeditar os discos que muitos aguardam. O compromisso com a preservação do patrimônio cultural musical brasileiro movimenta meu trabalho e me motivam a perseverar, para que o público brasileiro tenha franqueado o acesso a uma obra de grande valor, como o legado de Sivuca. Devido ao exercício de minha profissão como socióloga, entendo que este compromisso é permanente. No meu caso, experimento uma motivação dupla, por conta da minha condição de filha única. É impossível deixar cair no esquecimento, com o passar dos anos, a memória do meu pai. Ele pode sobreviver na lembrança de muitos por algum tempo, porém é fundamental disputar um espaço no gosto da juventude. E isso só acontece com muito trabalho.

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