quinta-feira, 27 de outubro de 2011

PROSA POÉTICA...

Inédito - Augusto de Guimaraens Cavalcanti


Não tinha túnel. O lado de dentro refletia o lado de fora. Nadando assim na piscina desses olhos verdes (alguém esperava o tiroteio passar).

Delírios oceânicos germinavam dos teus óculos: pequenas máquinas de enxergar.

Livros brotavam do seu peito. Sim, a cidade era dos arranha-céus

Sim, mas a felicidade não podia ser medida como uma mera

expectativa de pavimentação e argamassa.Em cada edifício alguém enlouquecia e tentava arranhar o céu. A cidade era daqueles que arranhavam os céus para depois

incendiar a própria noção de céu,

como os que arrancam as luas de isopor e depois desfolham os calendários,

como os vulcões presos dentro das lombadas dos dicionários,

como os encaixes que se desencaixam e permanecem belíssimos;

Os incêndios nunca correspondem às destruições

Sim, a cidade era dos arranha-céus, daqueles que cravavam suas garras

e depois bebiam tranquilamente

seus refrigerantes de petróleo.

Sim, mas mesmo assim flutuavam os pássaros de Hitchcock

Mesmo assim os planetas entravam em fusão

Mesmo assim sobrenadavam os corvos de Allan Poe

Mesmo assim as bibliotecas brotavam das árvores

Sim, a cidade era a cidade dos inocentes, daqueles que queriam as profundidades sem imersão,

daqueles que dançavam sem êxtases ou possessões,

dos iluminados no céu escuro. Sim, sim, a cidade pertencia àqueles que fotografavam tudo,

daqueles que sabiam que o susto era a alma do negócio.

Dos que arranham os céus com as unhas e depois saiam

distraídos para caminhar....

Sim, sim, sim, mas mesmo assim permaneceriam os venenos de veludo,

de beijos sem nomes, amores sem sobrenomes,

agendas sem datas, luas sem GPS, os olhos espirrando mel sobre os mortos

da noite anterior.

Mas mesmo assim nos permaneciam as asas crescendo durante a noite,

enquanto os inocentes dormiam;

asas que iam inflando como giletes e escorregavam de dentro de nossas peles até incharem tanto que logo arrebentavam de manhã e nos deixavam aqui mesmo tontos caídos e atordoados no continente do chão.

Nascíamos, também.



Augusto de Guimaraens Cavalcanti nasceu no dia 19 de julho de 1984. É um talentoso poeta da nova geração. Faz parte do grupo 'Os Sete Novos' ao lado dos poetas Domingos de Guimaraens e Mariano Marovatto. Publicou 'Poemas para se ler ao meio dia', 'Amoramérica' e 'Os tigres cravaram as garras no horizonte'. Apresenta-se constantemente em eventos de poesia no Rio de Janeiro com o CEP 20000. Prepara seu terceiro livro 'Fui para Bulgária procurar Campos de Carvalho'

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