Heleno Louro glosando o mote:
Quem nasceu pra não ter nada
Só pode ser como eu.
Já fui um bom construtor
De casa de alvenaria
Hoje ninguém quer um dia
Por muito pouco valor
Um já me disse o senhor
Fez aquele serviço meu
Uma parede pendeu
A outra já está quebrada
Quem nasceu pra não ter nada
Só pode ser como eu.
De casa de alvenaria
Hoje ninguém quer um dia
Por muito pouco valor
Um já me disse o senhor
Fez aquele serviço meu
Uma parede pendeu
A outra já está quebrada
Quem nasceu pra não ter nada
Só pode ser como eu.
Um sonho pra loteria
Eu tive no dia sete
Vinte e cinco dezessete
Uma voz assim dizia
Joguei-a no outro dia
E a mesma milhar deu
Mas Cesário se esqueceu
Botou a data atrasada
Quem nasceu pra não ter nada
Só pode ser como eu.
Eu tive no dia sete
Vinte e cinco dezessete
Uma voz assim dizia
Joguei-a no outro dia
E a mesma milhar deu
Mas Cesário se esqueceu
Botou a data atrasada
Quem nasceu pra não ter nada
Só pode ser como eu.
A fim ganhar duzentos
Pra vereador me inscrevi
Mas logo que me elegi
Cortaram meus vencimentos
Tirei com constrangimento
O período que foi meu
Meu sucessor se elegeu
Vai ganhar taxa marcada
Quem nasceu pra não ter nada
Só pode ser como eu.
Pra vereador me inscrevi
Mas logo que me elegi
Cortaram meus vencimentos
Tirei com constrangimento
O período que foi meu
Meu sucessor se elegeu
Vai ganhar taxa marcada
Quem nasceu pra não ter nada
Só pode ser como eu.
Já assumi o papel
De um simples professor
Agradecendo ao doutor
Silvio Nunes Rafael
Que como amigo fiel
A chance me ofereceu
O que doutor Sílvio deu
Lêleu tomou na entrada
Quem nasceu pra não ter nada
Só pode ser como eu.
De um simples professor
Agradecendo ao doutor
Silvio Nunes Rafael
Que como amigo fiel
A chance me ofereceu
O que doutor Sílvio deu
Lêleu tomou na entrada
Quem nasceu pra não ter nada
Só pode ser como eu.
Tinha um jumento afamado
Zé Cupira me encontrou
Com lambança me passou
Um cavalo espravonado
Com pouco tempo passado
O cavalo adoeceu
Dessa doença morreu
Já com uma perna aleijada
Quem nasceu pra não ter nada
Só pode ser como eu.
Zé Cupira me encontrou
Com lambança me passou
Um cavalo espravonado
Com pouco tempo passado
O cavalo adoeceu
Dessa doença morreu
Já com uma perna aleijada
Quem nasceu pra não ter nada
Só pode ser como eu.
Prá não ficar tão à-toa
Vendi o que possuía
Juntei toda economia
E comprei uma leitoa
Numa manhã calma e boa
Uma vara apareceu
A mesma porca comeu
Os bacorinhos na ninhada
Quem nasceu pra não ter nada
Só pode ser como eu.
Vendi o que possuía
Juntei toda economia
E comprei uma leitoa
Numa manhã calma e boa
Uma vara apareceu
A mesma porca comeu
Os bacorinhos na ninhada
Quem nasceu pra não ter nada
Só pode ser como eu.
Um dia minha madrinha
Deu-me uma franga pedrez
Esta quando com um mês
Tornou-se logo galinha
Deitei-a numa tardinha
A pintarada nasceu
Um dia a raposa deu
Comeu-a e a pintarada
Quem nasceu pra não ter nada
Só pode ser como eu.
Deu-me uma franga pedrez
Esta quando com um mês
Tornou-se logo galinha
Deitei-a numa tardinha
A pintarada nasceu
Um dia a raposa deu
Comeu-a e a pintarada
Quem nasceu pra não ter nada
Só pode ser como eu.
Em setenta fiz loucura
Toquei logo dois roçados
Ainda tinha uns trocados
Empurrei na agricultura
Limpei mato, a terra dura
A milharada cresceu
Uma chuva mais não deu
Perdeu-se já bonecada
Quem nasceu pra não ter nada
Só pode ser como eu.
Me elevaram a secretário
Do prefeito do lugar
Não pude continuar
Devido ao pouco salário
Tomar outro itinerário
Ser ótimo me pareceu
Mas o que me sucedeu
Ganha quantia dobrada
Quem nasceu pra não ter nada
Só pode ser como eu.
* * *
José Queiroz de Souza glosando o mote:
Estou sentado na esquina da tristeza
Esperando o transporte da saudade.
Toquei logo dois roçados
Ainda tinha uns trocados
Empurrei na agricultura
Limpei mato, a terra dura
A milharada cresceu
Uma chuva mais não deu
Perdeu-se já bonecada
Quem nasceu pra não ter nada
Só pode ser como eu.
Me elevaram a secretário
Do prefeito do lugar
Não pude continuar
Devido ao pouco salário
Tomar outro itinerário
Ser ótimo me pareceu
Mas o que me sucedeu
Ganha quantia dobrada
Quem nasceu pra não ter nada
Só pode ser como eu.
* * *
José Queiroz de Souza glosando o mote:
Estou sentado na esquina da tristeza
Esperando o transporte da saudade.
De um passado de outrora tão feliz,
Só me resta, o saldo dos fracassos,
Porque o ser que eu gozei dos seus abraços,
Já está em outro plano que Deus quis,
E os castelos de areia que eu fiz,
Foram sonhos e sonhos não é verdade,
Porque o fantasma que hoje eu vejo é a idade,
Me empurrando para um abismo de incerteza,
Estou sentado na esquina da tristeza
Esperando o transporte da saudade.
Só me resta, o saldo dos fracassos,
Porque o ser que eu gozei dos seus abraços,
Já está em outro plano que Deus quis,
E os castelos de areia que eu fiz,
Foram sonhos e sonhos não é verdade,
Porque o fantasma que hoje eu vejo é a idade,
Me empurrando para um abismo de incerteza,
Estou sentado na esquina da tristeza
Esperando o transporte da saudade.
Na estrada do tempo eu caminhei,
Sempre em busca de aventuras eu andava,
Se descia, se subia nem notava,
Porque tinha ao meu lado quem amei,
Mas agora que sozinho eu fiquei,
Porque ela partiu pra eternidade,
E meu corpo já cansado na verdade,
Não requer desafio nem surpresa,
Estou sentado na esquina da tristeza
Esperando o transporte da saudade.
* * *
Dedé Monteiro glosando o mote:
Saltei mais de mil cancelas,
Na estrada dos desenganos.
Sempre em busca de aventuras eu andava,
Se descia, se subia nem notava,
Porque tinha ao meu lado quem amei,
Mas agora que sozinho eu fiquei,
Porque ela partiu pra eternidade,
E meu corpo já cansado na verdade,
Não requer desafio nem surpresa,
Estou sentado na esquina da tristeza
Esperando o transporte da saudade.
* * *
Dedé Monteiro glosando o mote:
Saltei mais de mil cancelas,
Na estrada dos desenganos.
Contei mais de mil palhoças,
Pequenas, pobres, singelas,
Passei por mais de mil roças,
Saltei mais de mil cancelas,
Dormi em mais de mil redes,
Saciei mais de mil sedes,
Desmanchei mais de mil planos,
Fiz mais de mil amizades,
Deixei mais de mil saudades,
Na estrada dos desenganos
Passei por mais de mil cruzes,
Acendi mais de mil velas,
Divisei mais de mil luzes,
Saltei mais de mil cancelas ,
Mais de mil vezes chorei,
E o pranto que derramei
Valeu por mais de mil anos…
Desfiz mil sonhos queridos,
Soltei mais de mil gemidos
Na estrada dos desenganos
Ganhei mil cabelos brancos,
Fiz mais de mil sentinelas,
Venci mais de mil barrancos,
Saltei mais de mil cancelas ,
Escutei mil passarinhos,
Pisei mais de mil espinhos,
Padeci por mil ciganos,
Ganhei mais não do que sim,
Deixei mil partes de mim
Na estrada dos desenganos.
* * *
Léo Medeiros glosando o mote:
Eu deixei de amar quem me queria
Para dar meu amor a quem não quis
Pequenas, pobres, singelas,
Passei por mais de mil roças,
Saltei mais de mil cancelas,
Dormi em mais de mil redes,
Saciei mais de mil sedes,
Desmanchei mais de mil planos,
Fiz mais de mil amizades,
Deixei mais de mil saudades,
Na estrada dos desenganos
Passei por mais de mil cruzes,
Acendi mais de mil velas,
Divisei mais de mil luzes,
Saltei mais de mil cancelas ,
Mais de mil vezes chorei,
E o pranto que derramei
Valeu por mais de mil anos…
Desfiz mil sonhos queridos,
Soltei mais de mil gemidos
Na estrada dos desenganos
Ganhei mil cabelos brancos,
Fiz mais de mil sentinelas,
Venci mais de mil barrancos,
Saltei mais de mil cancelas ,
Escutei mil passarinhos,
Pisei mais de mil espinhos,
Padeci por mil ciganos,
Ganhei mais não do que sim,
Deixei mil partes de mim
Na estrada dos desenganos.
* * *
Léo Medeiros glosando o mote:
Eu deixei de amar quem me queria
Para dar meu amor a quem não quis
Quem olhar para mim, por um instante
Saberá sem demora o que eu sinto
Meu olhar mostra a tela que eu pinto
Um quadro, sem moldura e ofuscante;
O pintor, sem sucesso, ignorante
No amor, não passou de um aprendiz
Teve lar, não zelou, vive infeliz
Porque foi apostar em fantasia.
Eu deixei de amar quem me queria
Para dar meu amor a quem não quis.
Saberá sem demora o que eu sinto
Meu olhar mostra a tela que eu pinto
Um quadro, sem moldura e ofuscante;
O pintor, sem sucesso, ignorante
No amor, não passou de um aprendiz
Teve lar, não zelou, vive infeliz
Porque foi apostar em fantasia.
Eu deixei de amar quem me queria
Para dar meu amor a quem não quis.
Fui covarde com quem me dedicou
Tanto amor, confiança e lealdade
Mergulhei no açude da vaidade
Sem demora a parede se arrombou;
A água, era muita, me levou
Escapei, oh meu deus! Foi por um triz
Mas carrego no peito a cicatriz
Que comprova, a minha covardia
Eu deixei de amar quem me queria
Para dar meu amor a quem não quis
* * *
José Lucas de Barros glosando o mote:
A viola, em silêncio, está chorando,
Com saudade da voz do violeiro.
Tanto amor, confiança e lealdade
Mergulhei no açude da vaidade
Sem demora a parede se arrombou;
A água, era muita, me levou
Escapei, oh meu deus! Foi por um triz
Mas carrego no peito a cicatriz
Que comprova, a minha covardia
Eu deixei de amar quem me queria
Para dar meu amor a quem não quis
* * *
José Lucas de Barros glosando o mote:
A viola, em silêncio, está chorando,
Com saudade da voz do violeiro.
Chico Motta viveu de cantoria,
Imitando as graúnas sertanejas,
Nos ardores de inúmeras pelejas
Que aprendeu a enfrentar com galhardia;
Seu programa, nem bem raiava o dia,
Acordava o sertão alvissareiro,
Mas, depois do seu verso derradeiro,
Que inda está, nas quebradas, ecoando,
A viola, em silêncio, está chorando,
Com saudade da voz do violeiro.
* * *
Paulo Nunes Batista glosando o mote:
O que pinga não fizer,
Demônio nenhum não faz…
Imitando as graúnas sertanejas,
Nos ardores de inúmeras pelejas
Que aprendeu a enfrentar com galhardia;
Seu programa, nem bem raiava o dia,
Acordava o sertão alvissareiro,
Mas, depois do seu verso derradeiro,
Que inda está, nas quebradas, ecoando,
A viola, em silêncio, está chorando,
Com saudade da voz do violeiro.
* * *
Paulo Nunes Batista glosando o mote:
O que pinga não fizer,
Demônio nenhum não faz…
O cara pega a garrafa
Encharca o corpo de pinga,
Depois se rebola, ginga,
Cai na loucura e na estafa…
Pesca em seco sem tarrafa,
Insulta até satanás…
Só vai dando para trás,
Chega até virar mulher…
Que o que pinga não fizer,
Demônio nenhum não faz…
Encharca o corpo de pinga,
Depois se rebola, ginga,
Cai na loucura e na estafa…
Pesca em seco sem tarrafa,
Insulta até satanás…
Só vai dando para trás,
Chega até virar mulher…
Que o que pinga não fizer,
Demônio nenhum não faz…
A pinga, a uca, a aguardente,
Essa tal dona Branquinha,
Pra fazer mal tá sozinha,
Faz de um mofino um valente…
Mas, não põe ninguém pra frente,
Quer seja velho ou rapaz…
Torna o sujeito incapaz,
Tira-lhe todo o mister,
Que o que pinga não fizer,
Demônio nenhum não faz…
* * *
Um folheto de José Pacheco
GRANDE DEBATE DE LAMPIÃO COM SÃO PEDRO
Para me certificar
Da morte de Lampião
Essa tal dona Branquinha,
Pra fazer mal tá sozinha,
Faz de um mofino um valente…
Mas, não põe ninguém pra frente,
Quer seja velho ou rapaz…
Torna o sujeito incapaz,
Tira-lhe todo o mister,
Que o que pinga não fizer,
Demônio nenhum não faz…
* * *
Um folheto de José Pacheco
GRANDE DEBATE DE LAMPIÃO COM SÃO PEDRO
Para me certificar
Da morte de Lampião
Arrumei o matulão
E andei p’ra me acabar
Não escapou-me um lugar
Do Brasil ao estrangeiro
Percorri o mundo inteiro
Procurando a realeza
Até que tive a certeza
Da morte do cangaceiro.
Andei nas areias gordas
Pilão sem boca e macumba
As ribeiras de cazumba
Estas eu remexi todas
Passei nas várzea das poudras
Fui à baixa da folia
Levei uma companhia
Deixei no bico da pata
Passei nas brechas da gata
Dormi na boca da jia.
Fui à Serra do Cambão
Desci na jumenta prenha
Mandei Chico Tomás Lenha
No Engenho de Felipão
Pindoba de Damião
Fica perto da Furada
Lá deixei um camarada
Caminhei mais légua
Dormi na baixa da égua
Perto da Tábua Lascada
Depois eu fui à Quinzanga
O Engenho de Seu Melo
Subi para o Birimbelo
Cheguei na Chã da Munganga
Tres cassetes de Zé Panga
Já fica do outro lado
Fui ao Cambito Quebrado
Do Rodete de Pinheiro
Deixei o meu companheiro
Na bargada dum cevado
Passei na Chã da Risada
Desci na Fazenda Mole
Fui à Usina do Fole
De Bertolina Pelada
Segui pela mesma estrada
Do alto da geringonça
Do tapado do Mendonça
Puxei para virador
E mandei um portador
Dormir na Boca da Onça
E atravessei os mares
Montado em um planeta
Que ao som de uma trombeta
Vinha descendo dos ares
Visitando aqueles lares
Terra de santos e fadas
Naquela mesma jornada
Encostei no arrebol
Cheguei na Terra do Sol
Na Casa da Madrugada
Ela me deu um abraço
E prestou-me bem atenção
Mandou chamar o verão
No reino do mestre Espaço
Depois chegou o mormaço
E saiu muito vexado
Porque estava ocupado
No palácio da manhã
Tratando da sua irmã
Mulher do vento gelado
Continuei a viagem
Com boa capa de luva
Porque a terra é de chuva
E mora Dona Friagem
Seu palácio era na margem
Do rio Major Relento
Descansei no aposento
Da velha seca puxada
Nesta noite a trovoada
Deu uma surra no vento
No reino da Branca Aurora
encontrei a brisa mansa
que vinha trazer lembrança
À princesa Deusa Flora
A neve aquela hora
Em sua alcova dormia
Depois o sol lhe surgia
Desfazer-lhe do regaço
Enquanto pelo espaço
A neve branca corria
P’ra saber de Lampião
Qual foi a parada sua
Subi à terra de lua
Escanchado num trovão
Encontrei um ancião
Velho, barbado e corcundo
Que vinha do fim do mundo
Me viu e foi me contando
Que viu São Pedro açoitando
Um espírito vagabundo
Chegou no céu, Lampião
A porta estava fechada
Ele subiu a calçada
Ali bateu com a mão
Ninguém lhe deu atenção
Ele tornou a bater
Ouviu São Pedro dizer
Demore-se lá. Quem é?
Estou tomando café
Depois vou receber
São Pedro depois da janta
Gritou por Santa Zulmira:
-Traz o cigarro caipira
Acendeu no de São Pranta
Apertou o nó da manta
Vestiu a casaca e veio
Abriu a porta do meio
Falando até agastado:
-Triste do homem empregado
Que só lhe chega aperreio
Abriu na frente o portão
Ficou na trave escorado
Branco da cor de um finado
Quando avistou Lampião
Mas com a trave na mão
Não temeu de lhe falar
E disse: -Aqui não se dar
Aposento a gente mal
Senão que entrar no pau
Acho bom se retirar
Lampião lhe respondeu :
Não venha com seu insulto
Você é um santo bruto
Que ofensa lhe fiz eu?
E mesmo o céu não é seu
Você também é mandado
Portanto esteja avisado
Se não deixar eu entrar
Nós vamos experimentar
Quem é que tem bom guardado
Você não entre atrevido
São Pedro lhe disse assim :
Ingresso a quem é ruim
Nesta porta é proibido
Não sabes que sois bandido
Roubador da vida humana
Alma ferina e tirana
Coração cruel perverso!
Como queres um ingresso
Nesta mansão soberana
-É certo fui bandido
Perverso, estrompa, voraz
Porém, quem foi não é mais
É mesmo que não ter sido
Mesmo eu sou garantido
Por um provérbio que tenho
Escrito sobre um desenho
Por pessoas elevadas
À qual diz: – Águas passadas
Não dão voltas a meu engenho
— Não quero articulação
Você aqui nada tem
— É como você também
Lhe respondeu Lampião
É porque do seu patrão
Você transmite um mandado
Eu tenho visto empregado
Sair do trabalho expulso
Sem direção, sem ricurso
Por qualquer trabalho errado
Ali falou São Bernardo
Que também vinha chegando
— Pedro você está brincando
Com este cabra safado?
Vá me chamar São Ricardo
E São Francisco da Penha
Diga a São Tomé que venha
E chame São Juvenal
Traga um pau do quintal
E uma lasca de lenha
São Pedro ergueu-se nos pés
E disse de cara feia:
— Pra dar num cabra de peia
Não precisa oito nem dez
E gritou por São Moisés:
— Vamos dar no bandoleiro
Saltou no meio do terreiro
Até preparar a faca
Gritando : – Quebra uma estaca
Arranque um pau do chiqueiro
São Paulo estava no quinta
Mas ouvindo a discussão
Apertou o cinturão
E botou a faca na cinta
Encontrou Santa Jacinta
Que lá vinha no caminho
E disse a Santo Agostinho
Arretorcendo o bigode:
Arreda que tu não pode
Eu pego o cabra sozinho
Porém antes de pegar
Desceu um grande corisco
Jogado por São Francisco
Da porta do quarto andar
Num tremendo ribombar
Um trovão também desceu
O espaço escureceu
Veio um forte pé-de-vento
Lampião neste momento
Dali desapareceu
Poeta tem liberdade
Sagrado dom da Natura
Conforme a literatura
Escreve o que tem vontade
Também a propriedade
Precisa o dono ter
Pelo menos vou dizer
Se meu espírito não mente
Poeta também é gente
Também precisa comer.
E andei p’ra me acabar
Não escapou-me um lugar
Do Brasil ao estrangeiro
Percorri o mundo inteiro
Procurando a realeza
Até que tive a certeza
Da morte do cangaceiro.
Andei nas areias gordas
Pilão sem boca e macumba
As ribeiras de cazumba
Estas eu remexi todas
Passei nas várzea das poudras
Fui à baixa da folia
Levei uma companhia
Deixei no bico da pata
Passei nas brechas da gata
Dormi na boca da jia.
Fui à Serra do Cambão
Desci na jumenta prenha
Mandei Chico Tomás Lenha
No Engenho de Felipão
Pindoba de Damião
Fica perto da Furada
Lá deixei um camarada
Caminhei mais légua
Dormi na baixa da égua
Perto da Tábua Lascada
Depois eu fui à Quinzanga
O Engenho de Seu Melo
Subi para o Birimbelo
Cheguei na Chã da Munganga
Tres cassetes de Zé Panga
Já fica do outro lado
Fui ao Cambito Quebrado
Do Rodete de Pinheiro
Deixei o meu companheiro
Na bargada dum cevado
Passei na Chã da Risada
Desci na Fazenda Mole
Fui à Usina do Fole
De Bertolina Pelada
Segui pela mesma estrada
Do alto da geringonça
Do tapado do Mendonça
Puxei para virador
E mandei um portador
Dormir na Boca da Onça
E atravessei os mares
Montado em um planeta
Que ao som de uma trombeta
Vinha descendo dos ares
Visitando aqueles lares
Terra de santos e fadas
Naquela mesma jornada
Encostei no arrebol
Cheguei na Terra do Sol
Na Casa da Madrugada
Ela me deu um abraço
E prestou-me bem atenção
Mandou chamar o verão
No reino do mestre Espaço
Depois chegou o mormaço
E saiu muito vexado
Porque estava ocupado
No palácio da manhã
Tratando da sua irmã
Mulher do vento gelado
Continuei a viagem
Com boa capa de luva
Porque a terra é de chuva
E mora Dona Friagem
Seu palácio era na margem
Do rio Major Relento
Descansei no aposento
Da velha seca puxada
Nesta noite a trovoada
Deu uma surra no vento
No reino da Branca Aurora
encontrei a brisa mansa
que vinha trazer lembrança
À princesa Deusa Flora
A neve aquela hora
Em sua alcova dormia
Depois o sol lhe surgia
Desfazer-lhe do regaço
Enquanto pelo espaço
A neve branca corria
P’ra saber de Lampião
Qual foi a parada sua
Subi à terra de lua
Escanchado num trovão
Encontrei um ancião
Velho, barbado e corcundo
Que vinha do fim do mundo
Me viu e foi me contando
Que viu São Pedro açoitando
Um espírito vagabundo
Chegou no céu, Lampião
A porta estava fechada
Ele subiu a calçada
Ali bateu com a mão
Ninguém lhe deu atenção
Ele tornou a bater
Ouviu São Pedro dizer
Demore-se lá. Quem é?
Estou tomando café
Depois vou receber
São Pedro depois da janta
Gritou por Santa Zulmira:
-Traz o cigarro caipira
Acendeu no de São Pranta
Apertou o nó da manta
Vestiu a casaca e veio
Abriu a porta do meio
Falando até agastado:
-Triste do homem empregado
Que só lhe chega aperreio
Abriu na frente o portão
Ficou na trave escorado
Branco da cor de um finado
Quando avistou Lampião
Mas com a trave na mão
Não temeu de lhe falar
E disse: -Aqui não se dar
Aposento a gente mal
Senão que entrar no pau
Acho bom se retirar
Lampião lhe respondeu :
Não venha com seu insulto
Você é um santo bruto
Que ofensa lhe fiz eu?
E mesmo o céu não é seu
Você também é mandado
Portanto esteja avisado
Se não deixar eu entrar
Nós vamos experimentar
Quem é que tem bom guardado
Você não entre atrevido
São Pedro lhe disse assim :
Ingresso a quem é ruim
Nesta porta é proibido
Não sabes que sois bandido
Roubador da vida humana
Alma ferina e tirana
Coração cruel perverso!
Como queres um ingresso
Nesta mansão soberana
-É certo fui bandido
Perverso, estrompa, voraz
Porém, quem foi não é mais
É mesmo que não ter sido
Mesmo eu sou garantido
Por um provérbio que tenho
Escrito sobre um desenho
Por pessoas elevadas
À qual diz: – Águas passadas
Não dão voltas a meu engenho
— Não quero articulação
Você aqui nada tem
— É como você também
Lhe respondeu Lampião
É porque do seu patrão
Você transmite um mandado
Eu tenho visto empregado
Sair do trabalho expulso
Sem direção, sem ricurso
Por qualquer trabalho errado
Ali falou São Bernardo
Que também vinha chegando
— Pedro você está brincando
Com este cabra safado?
Vá me chamar São Ricardo
E São Francisco da Penha
Diga a São Tomé que venha
E chame São Juvenal
Traga um pau do quintal
E uma lasca de lenha
São Pedro ergueu-se nos pés
E disse de cara feia:
— Pra dar num cabra de peia
Não precisa oito nem dez
E gritou por São Moisés:
— Vamos dar no bandoleiro
Saltou no meio do terreiro
Até preparar a faca
Gritando : – Quebra uma estaca
Arranque um pau do chiqueiro
São Paulo estava no quinta
Mas ouvindo a discussão
Apertou o cinturão
E botou a faca na cinta
Encontrou Santa Jacinta
Que lá vinha no caminho
E disse a Santo Agostinho
Arretorcendo o bigode:
Arreda que tu não pode
Eu pego o cabra sozinho
Porém antes de pegar
Desceu um grande corisco
Jogado por São Francisco
Da porta do quarto andar
Num tremendo ribombar
Um trovão também desceu
O espaço escureceu
Veio um forte pé-de-vento
Lampião neste momento
Dali desapareceu
Poeta tem liberdade
Sagrado dom da Natura
Conforme a literatura
Escreve o que tem vontade
Também a propriedade
Precisa o dono ter
Pelo menos vou dizer
Se meu espírito não mente
Poeta também é gente
Também precisa comer.
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