sexta-feira, 12 de março de 2010

Literatura de Cordel...

Severino Pinto

No lugar que Pinto canta
Não vejo quem o confunda
O rio da poesia
O meu pensamento inunda
Terça, quarta, quinta e sexta
Sábado ,domingo e segunda

Lourival Batista

Sábado, domingo e segunda
Terça-feira, quarta e quinta
Na sexta não me faltando
A tela, pincel e tinta
Pinto, pintando o que eu pinto
Eu pinto o que Pinto pinta

* * *

Numa cantoria de Otacílio Batista com Lourival Batista:

Otacílio Batista

Seu repente tem essência
É feito sem embaraço
Mas sua viola é tão feia
Que só parece um cabaço
Mais bonita do que ela
Eu tenho visto em palhaço

Lourival Batista

Mais feia que a dum palhaço
Mas o dono é inteligente
A sua é muito enfeitada
Mas é fraco o sseu repente
Não é coleira bonita
Que faz cachorro valente

* * *

Um cordel de Sá de João Pessoa

A MULHER QUE MATOU O DIABO EM TIMBAÚBA-PE

Timbaúba - vila pacata
Pequena porém decente
Não tem nada que abale
A vida daquela gente
Pode ser a bomba atômica
Ou uma seca inclemente.

A paz ali é sagrada
E está em todos os lares
Em Timbaúba os artistas
Estão em todos lugares
Ali viveu o Poeta-
Repórter José Soares.

Poeta que deixou nome
No Recife e mais além
Vendeu milhões de folhetos
Igual a ele ali não tem
Cantador de tanta fama
Não foi nem vai nem vem.

Hoje é reconhecido
Pois duas coisas sabia
O Zé Soares fazer:
Folhetos de poesia
Que narravam com beleza
Tudo o que acontecia.



E filhos em quantidade
Estão em todos lugares
Em folhetos e gravuras
Levando o nome Soares
Do Brasil para as lonjuras
Dos povos de além-mares.

Cada milhão que vendia
Dava pra comemorar
A rede toda tremia
Cumeeira a se agitar
Se ouvia uma gemedeira
Era o Zé a festejar!

Hoje tem muito artista
São mestres e professores
No Rio S.Paulo e Brasília
E mais outros arredores
Corre a fama dos Soares
Xilos, poetas, gravadores.

Nessa cidade tranqüila
Onde nada acontecia
O Capeta resolveu
Dar as caras outro dia
Eu conto o que sucedeu
Entre o Diabo e Maria.

Maria - fiquem sabendo
É uma mulher talentosa
Já teve trinta maridos
E a todos levou pra cova
Os homens ela tratava
Da forma mais vigorosa.

Por espalhar essa fama
Bandido ali não chegava
Pra bagunçar o coreto
Maria logo o expulsava
Fosse branco, fosse preto
Pro Inferno ela mandava.

Sem respeitar essa fama
Lá um dia apareceu
Um mulato assanhado
Dizendo – Eu sou mais eu
Quero conhecer Maria
E foi o que sucedeu.

O mulato era forte
Bem alto e apessoado
Se vestia com bom gosto
E trajava refinado
Pela pessoa se via
Não era pobre coitado.

Tinha o semblante sereno
Pinta de conquistador
Os olhos negros brilhando
Mostravam algum calor
Um riso franco e alegre
Aumentava o seu valor.

Encostou numa birosca
Pediu um litro de cana
Que fosse branca e bem fria
Feita de cana caiana
Todos beberam o brinde
Daquela figura humana.

Ouviu falar de Maria
Nessa roda de amizade
Enquanto a cana rolava
Sentiu a possibilidade
De ser coroado um rei
Ali naquela cidade.

Pra lavrar o seu intento
E gozar de mordomia
Houve por bem conquistar
De todos a simpatia
Mas tinha que dominar
Primeiramente Maria.

A princípio ela foi
Pelo cabra iludida
Ele tinha boa fala
E palestra comedida
Maria de Timbaúba
Ficou por ele caída.

Tendo Maria nas mãos
Por força do seu fascínio
O Diabo feito gente
Usou muito tirocínio
E em breve Timbaúba
Estava no seu domínio.

Feito Imperador dali
Ele deitou e rolou
Convite, carta, mensagem
Pro Inferno ele mandou
Em breve a Diabada
Em Timbaúba aportou.

Não pode dar muita folga
Pressa gente rabo-quente
Se você lhe dá o pé
Ele quer a mão da gente
E quanto mais tem velório
Mais o Demo tá contente.

Timbaúba era a terra
De respeito e de recato
Viu de repente perder
O respeito ali no ato
E virar uma bagunça
Aquele lugar pacato.

Maria não se deu conta
Daquela dominação
Pois iludida no amor
Ficou cega e sem razão
Foi assim que Timbaúba
Virou terreiro do Cão.

Mas a mulher é bendita
Com o dom que Deus lhe deu
Enfrenta qualquer desdita
E defende o que é seu
Quando é ludibriada
Quem ela encara perdeu.

Maria foi reparando
Em tudo que acontecia
Viu que o Diabo tomava
Tudo aquilo que queria
Agora vais ter comigo!
Disse com raiva Maria.

Voltou pra casa ligeiro
Encontrou a coisa tal
Que mais parecia domingo
Ou terça de carnaval
Cercado de cem Diabas
Em tremenda bacanal.

Estava lá o seu homem
Que até então confiava
Maria o lar adentrou
Logo a todos expulsava
A tapa e a pescoção
Assim ela os tratava.

Houve uma resistência
Entre as Diabas presentes
Existe muita ousadia
No meio daqueles entes
Mas Maria destroçou
Todas aquelas valentes.

Era Diaba pelada
Que corria pelas ruas
Outras saíam voando
A mil sentando as puas
O povo admirou-se
De ver as Capetas nuas.

O mulato assim se viu
De repente abandonado
Sentiu também que perdia
O que tinha conquistado
Disse não saio sem luta
Pois aqui é meu reinado.

Aí o Cabra mostrou
Que o Demo é coisa ruim
Com arte se preparou
Para Maria dar fim
Pensando – Eu mato ela
Timbaúba tá pra mim.

Antes que ele se armasse
Maria deu o golpe fatal
Chegou ao Cão dengosa
Carinhosa e coisa e tal
Deixou-o todo sem jeito
Destruiu-lhe todo o mal.

A mulher foi bem corada
Cheirando perfume bom
Tendo a face rosada
Pinta a boca com batom
Não há Cão que resista
Pois esse é o seu dom.

Os cabelos escorridos
Pelos ombros oleados
Com óleo de pau-cheiroso
Bem lisos e penteados
A negrura reluzente
Tenta a todos os Diabos.

Inda mais nossa Maria
Vestia roupa de chita
Daquela cheia de flores
Da qual não há mais bonita
Um decote cujos seios
Até ao Capeta excita.

Assim no quarto pegou
O cabra desprevenido
Tão adoidado ficou
Quase perdeu o sentido
Quando percebeu Maria
No transparente vestido.

A mulher então usou
Toda a sua sedução
Os lábios doces de amor
Murmuravam a canção
O corpo quente e moreno
Era mesmo a tentação.

Maria tirou a roupa
E ficou nua em pêlo
Ao Capeta se entregou
Sem fazer nenhum apelo
Somente daquele jeito
Findaria o desmantelo.

Deu-lhe a surra de amor
Como só ela saberia
Dez dias passou na cama
Deixando o Cão na agonia
Que acabou não resistindo
Morreu no último dia.

Respirando aliviada
O Demo ela enterrou
Viu a sua Timbaúba
Em clima de muito amor
Defendida pelas fêmeas
Orgulhosas sem temor.

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