domingo, 17 de agosto de 2014

UMA PELEJA...

Cego Aderaldo cantando com Domingos Fonseca

Domingos Fonseca

Aderaldo eu vou na frente
Cantando conveniente
Vou traduzindo o repente
Que alguém dê atenção
Eu estou de prontidão
Junto com meu companheiro
Fazendo verso ligeiro
Eu oiço verso em quadrão

Cego Aderaldo

Eu cheguei nesse lugar
Mas aqui não é meu lar
Outras terra e outros mar
Outro céu e outro sertão
Vou falar de prontidão
Não é um cantar bem dito
Porem meu verso é bonito
Em quadrado, quadro, quadrão

Domingos Fonseca

Cheguei ao Rio de Janeiro
Junto com meu companheiro
De fato ganhei dinheiro
Mas já estou em percisão
Porém nesta ocasião
Dona Dulce nos convidou
E nossa sorte melhorou
Cantando oitavo em quadrão

Cego Aderaldo

Vou preparar o quadrado
E vou arrumar o esquadro
Para ver se faço quadro
Preparar a quadração
Ver as quadras como são
Depois do quadro bem feito
Canto muito satisfeito
O quadrado, quadro, quadrão

Domingos Fonseca

Eu dou a bala ao meu peito
Quadrando do mesmo jeito
Para ficar satisfeito
Quadro o dedo e quadro a mão
Quadro o café, quadro o pão
Quadro o pão, quadro o café
Quadro a igreja, quadro a fé
E termino tudo em quadrão

Cego Aderaldo

Pra fazê um oitavado
Pra ao depois ficá quadrado
Pra ficá sextivado
Vou fazê a quadração
Mostro os quadro como são
Tudo riscado ao compasso
Tendo lá um pé de aço
Em quadrado, quadro, quadrão


Domingos Fonseca

Quadro a fôrma, quadro o queijo
Quadro a boca, quadro o beijo
A vontade e o desejo
O gozo e a satisfação
Aqui tenho o coração
O coração e a vida
Quadro a praça e a avenida
E termino tudo em quadrão

Cego Aderaldo

Ó meu Deus, que cousa boa
Não levo a conversa à toa
Minha palavra revoa
Pela força de um pulmão
Não me dói o coração
E não é uma cousa louca
Sai o meu verso da boca
Em quadrado, quadro, quadrão

Domingos Fonseca

Eu não quero me gabar
Desejo apenas cantar
Agora é pra terminar
Que o moço acenou a mão
Eu olhei pra posição
Vou terminar meu repente
Sim, senhor, já estou ciente
Vou terminar meu quadrão.

* * *

Joaquim Vitorino cantando com Manoel Nenê um Martelo Agalopado

Joaquim Vitorino

Nos pediram um martelo agalopado
E eu, com todo o jeito e leveza.
Vou agora fazê uma defesa
De um corpo velho e depauperado,
De um espírito antigo, atrofiado,
Que só vive a Deus pedindo a morte,
De um fardo que não tem passaporte
Mas contudo se revela e tem destino;
Canta e brinca e diverte, Vitorino,
Cantadô de Viçosa e Boa-Sorte.

Manoel Nenê

Eu também já fui cantadô do norte,
Hoje sou cantadô de Alagoas,
Aqui estou brincando as minhas loas,
Não recramo o valô da minha sorte;
Se eu perdê, diz, também ninguém se importe,
De eu cantá e fazê as minhas loas,
Agradá muito bem essas pessoas,
E cantá no braço da “regra inteira”
Canta e brinca o véio Mané Ferreira
Que é o bamba poeta de Alagoas.

Joaquim Vitorino

Eu cheguei, sou o bamba em todas proas
Cantadô não despeja em minha frente
Só se ele fô muito inteligente
Invocá os patrões e as patroas;
Porém tu, comigo não caçoas
É preciso agora eu te dizê
Cuide bem em a matéria colhê
Que eu conheço do nome e do artigo,
Cantadô que em galope vem comigo
Ou é besta, ou é doido, ou qué morrê.

Manoel Nenê

Porém eu lhe dou um parecê
Não se faça cantô adientado,
Seja um home mais amoderado
Pra cumprires a orde e o devê,
Desta forma assim não pode sê
Dá prova de home mal inducado
Deve sê um pouco considerado
Falá sempre em palavra bem decente
Repare quem estivé aqui presente
Não qué vê pilhéria pro seu lado.

Joaquim Vitorino

Você diz e está bem empregado
Eu não aceito, porém faço o pedido
Do homem que é bem sucedido
Que aqui tem doutô e adevogado,
Tem até um culto deputado;
Esta dô que eu tenho, eu não regelo,
A sentença está dada, eu não apelo,
Você agora faça o que quizé
E bote o martelo que pudé
Que eu vou vê se inda sei cantá martelo

Manoel Nenê

Colega, o seu futuro eu não apelo
Não sou cantô da data aqui presente
Para cantá agora outro repente
Tou cansado, doente, tou banguelo,
Além disso ando magro e amarelo,
Porém eu nasci habilitado
E tenho essa habilitação:
Bote a sua viola e a canção
Que eu canto o martelo agalopado.

Joaquim Vitorino

Todo velho é teimoso e atravessado,
Do jeito que você é em galope,
Só canta imaginando e dando tope,
E logo em martelo agalopado;
Eu tenho pena dele assim, coitado,
De fazê hoje assim dessa maneira,
Serrando o que tivé na algibeira
Eu vou vê se a luta me envenena
Que portanto sou eu quem tenho pena
Cantando com o tal Mané Ferreira.

Manoel Nenê

Colega, tu me diz que canta bem
Porém esses pensamentos não são meus,
Eu tenho visto uma porção de erros teus,
Porém eu nunca contei isso a ninguém;
Eu chamo a rima a mim, a rima vem,
Para isso, te digo, é que eu me esmero;
Aqui estou cantando porque quero
Muito brando, moderno e bem macio,
Mas por forma de pilhéria e desafio
Por essa forma não venha que eu não quero.

Joaquim Vitorino

Eu tenho o coração do próprio Nero
Que mandou matá a própria mãe dele
E depois por intermédio daquele
Disse logo: o resultado eu espero;
Mando abri de frente a frente estando sério
Para saber no lugar que tinha ido,
E o canto em que ele tinha nascido,
Depois de saber tava satisfeito;
Mesmo assim eu faço do meu jeito
Com cantô, como tu, velho e inxirido.

Manoel Nenê

Colega, eu já tou reconhecido
Nessa pátria bondosa alagoana
Porque na terra pernambucana
Eu não conto lugá que eu tenha ido
Poeta como tu, entrometido
Que vem discuti no portugueis
Cantadô da marca de vocêis
Eu sozinho dou em 12 com uma vara
Eu passando a mão na sua cara
Nunca mais ela cabe um pince-neiz

Joaquim Vitorino

Esse aí foi Zé Soares quem fez
Cantando até com Rogaciano
Eu me lembro da data e do ano,
Eu me lembro do dia e do mês
Me diga meu amável freguês
Porque é que você já perdeu tanto?
É milhó que se coloque num canto
Se despeça do mundo e vá embora
Deixando que todo mundo chora
E se coloque ali nos pés de um santo.

Manoel Nenê

Colega, em martelo eu canto tanto
Que admira a toda humanidade,
Porque Deus me deu a felicidade
Prá cantá nesse mundo eu me garanto;
Eu tenho um pensamento quase santo,
Só não posso cantá no português
Mas no repente a galope eu canto um mês
Que um home não desmancha o meu martelo
Cantadô que dé em mim eu afivelo
Sendo um para mim é dois ou três.

* * *

José Alves Sobrinho glosando com Zé Limeira o mote:

Canta, canta, cantador,
Que teu destino é cantar.

Zé Limeira

Quando o carão tá cantando
É sinal que vem inverno,
Eu sou um nego moderno,
Foi não foi eu tou pensando.
Amanhã tô viajando
Pru sertão de Bogotá
Tico-tico no fubá,
Padre, juiz e doutor,
Canta, canta, cantador,
Que teu destino é cantar.

José Alves Sobrinho

Minha vida é esta cantiga,
Meu amor é esta viola…
Deus me botou nesta escola
Egrégia, sublime e antiga.
Se minha viola amiga,
Quiser um dia parar,
A dor não vou suportar
Porque ordena Nestor:
Canta, canta, cantador,
Que teu destino é cantar

Zé Limeira

Numa berada de serra
Dom Pedro ficou de coca,
Começou tirá taboca
Do cabeceira da terra,
Veio a febre berra-berra
Pru dentro dum caçuá,
Comendo o tamanduá
Da filha do Promotor,
Canta, canta, cantador,
Que teu destino é cantar.

José Alves Sobrinho

Este tema deslumbrante
Que nos deu Nestor Rolim,
Despertou dentro de mim
Um sentimento gigante!
Por isso eu canto perante
O povo deste lugar,
Já fazendo despertar
A musa do sonhador..
Canta, canta, cantador,
Que teu destino é cantar.

Zé Limeira

Se apagou-se a lamparina
Prumode o vento assoprou,
Me adiscurpe, seu Nestor,
Caboco da Palestina.
Joguei minha lazarina
No tronco do jatobá,
Fiz Lampião avuá
Na baixa do corredor,
Canta, canta, cantador,
Que teu destino é cantar.

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