domingo, 31 de agosto de 2014

A CRONICA DO ANO...








Blink: a decisão num piscar de olhos

“Um morto despertou os vivos”

(Carlos Lacerda)

Blink! E num piscar de olhos,

                vi na minha frente: Guimarães 

Rosa, Lulu 

Santos e o filósofo grego Heráclito. O 

primeiro, no seu Grande Sertão: Veredas, 

que disse: 

               “A vida não é entendível; viver é 

negocio muito perigoso”; 

o segundo canta 

até 

hoje, em verso e prosa, que 

“Nada do que foi 

será de novo do jeito que já foi um dia: tudo 

passa; tudo sempre passará”; 

e o terceiro 

que filosofava na Grécia antiga ensinando: 

“É 

impossível banhar-se duas vezes no mesmo 

rio”... 

               Pois é caro leitor, é inútil querer 

entender esse mundo e os seus habitantes.

Mas, mesmo assim, sem entender o mundo, 

temos que admitir que o ser humano é 

realmente fantástico, e é inegável que Deus 

estava muito inspirado, quando pegou um 

monte de barro e fez dele a sua maior obra, 

com um cérebro e essa coisa chamada de 

inconsciente adaptável, que foi muito bem 

descrita, no livro BLINK, do autor Malcolm 

Gladwell: 

               “A única maneira pela qual os 

seres 

humanos poderiam ter sobrevivido como 

espécie por tanto tempo é que eles 

desenvolveram um tipo de dispositivo para 

tomada de decisões, capaz de fazer 

julgamentos muito rápidos com base em 

muito poucas informações... O inconsciente 

adaptável faz um excelente trabalho de 

avaliar o mundo, alertar a pessoa em caso 

de 

perigo, definir metas e iniciar a ação de 

maneira sofisticada e eficiente”.



               Pois bem! Entre uma piscadela e 

outra dos 

meus olhos, foi inevitável, diante dos últimos 

acontecimentos não pegar o livro 

“Depoimentos” de Carlos Lacerda, e abrir no 

capítulo XII: “Na noite de 23 para 24 de 

agosto, estávamos em casa de Joaquim 

Nabuco... abriram champanha, começamos 


comemorar. Soubemos que Getúlio já tinha 

renunciado àquela altura. Até que, já de 

manhã, não me lembro bem a hora, alguém 

telefonou anunciando o suicídio. É evidente 

que houve aquele momento assim, de não 

sei bem como definir o sentimento, em todo 

caso, não era de alegria; era um sentimento 

de pena do homem, da tragédia humana, da 

tragédia pessoal do homem, de imaginar a 

agonia em que um homem deve estar para 


chegar a dar um tiro no coração... para quem 

tivesse um mínimo de sensibilidade, via que 



que tinha acontecido no Brasil era o que 

aconteceu no drama de Shakespeare – Júlio 

César. A mesma multidão que aclamava 

Brutus e os assassinos de César, quando 

Marco Antônio fez seu discurso com o 

cadáver nos braços, começou a pedir a 

morte 

dos que tinham matado César. Foi assim 

que 

passei de vítima a assassino de Vargas”...

              Tudo isso aconteceu há sessenta 

anos, em 

1954. E não se espante, caro leitor, que 

estejamos vivenciando tudo novamente. 

               Nietzsche e o seu cérebro 

privilegiado, de 

inigualáveis aforismos, já tinha nos alertado: 

               “Esta vida, como você a está 

vivendo e já 

viveu, você terá de viver mais uma vez e por 

incontáveis vezes; e nada haverá de novo 

nela, mas cada dor e cada prazer e cada 

suspiro e pensamento, e tudo o que é 

inefavelmente grande e pequeno em sua 

vida, terão de lhe suceder novamente, tudo 

na mesma sequencia e ordem – e assim 

também essa aranha e esse luar entre as 

árvores, e também esse instante e eu 

mesmo. A perene ampulheta do existir será 

sempre virada novamente”.

E de repente, a perene ampulheta do existir 

virou mesmo. Dor, prazer, suspiro, 

pensamentos e acordamos com a notícia; “O 

avião caiu. Eduardo Campos morreu!”. Tudo 

como se fosse orquestrado pelo maestro 

chamado destino. Maktub! No mesmo dia da 


morte do seu avô Miguel Arraes; morre o 

neto, candidato do PSB a presidência da 

república. E é sempre no mesmo mês de 

agosto. Desgosto, tristeza, comoção, 

perplexidade e uma enorme de uma certa 

incerteza: “O mistério está em toda parte”. E 

quem se atreverá a desvendar o futuro a 

partir de agora?! Quem?!


Futuro que já é presente, ou melhor, já virou 

passado. E tudo corre e chega tão rápido, 

que pisco os meus olhos novamente e vejo 

os números 13 e 12. 

               Não sou muito bom em 

matemática. Mas, graças a Deus, que esses 

cálculos são possíveis de serem feitos por 

qualquer pessoa: 13 do PT; 13 é o dia da 

morte de Eduardo Campos. 12 anos de 

governo do PT (oito de Lula e quatro de 

Dilma); 12 é o capítulo do livro de Lacerda 

que está sendo reescrito agora... Longe, 

muito longe, de querer comparar Marina Silva 

com um Marco Antônio, mas a morte de 

César – assim como a de Getúlio Vargas e 

agora a de Eduardo Campos-, é capaz de 

promover mudanças inesperadas e 

inimagináveis nas nossas vidas. E tudo que 

se ver não é igual ao que a gente viu há um 

segundo...


               Em 12 dias, Marina Silva saiu de 

21% para 

34%. Subiu 13 pontos e iguala aos índices da 

presidente Dilma. E no segundo turno, o 

estrago é ainda maior: 

               “O país já não está 

diante de uma ‘onda Marina’ - afirma o 

jornalista Josias de Souza, no seu blog-, Mas 

assiste ao surgimento de um Tsunami 

eleitoral”.


Blink! Pisco os olhos mais uma vez. E escuto 

Carl Orff e o seu “Carmina Burana”: 

          “Oh, 

Fortuna/ És como a lua/ estado variável/ 

Sempre crescendo ou decrescendo”... e tudo 

muda mesmo o tempo todo no mundo... mais 

uma piscadela, e vejo a mensagem no 

WhatsApp, do meu colega de turma Fábio 

Marcelo: “Pinto! O homem faz planos, mas 

tudo está no controle de Deus. Se tiver de 

ser, ninguém vai impedir”...


Blink, blink, blink. Pisco os olhos e corro em 

direção a minha biblioteca. Abro a página 39, 

do Grande Sertão: Veredas e vejo a profética 

mensagem do amigo Guimarães Rosa: 
]
               “Deus 

é traiçoeiro! Ah, uma beleza de traiçoeiro – 

dá gosto! A força dele, quando quer – moço!- 

me dá o medo pavor! Deus vem vindo: 

ninguém vê. Ele faz é na lei do mansinho – 

assim é o milagre. E Deus ataca bonito, se 

divertindo... Viver é negocio muito 

perigoso!”...


Francisco Edilson Leite Pinto Junior – 


Professor, médico e escrito
r

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