“Um morto despertou os vivos”
(Carlos Lacerda)
Blink! E num piscar de olhos,
vi na minha frente: Guimarães
Rosa, Lulu
Santos e o filósofo grego Heráclito. O
primeiro, no seu Grande Sertão: Veredas,
que disse:
“A vida não é entendível; viver é
negocio muito perigoso”;
o segundo canta
até
hoje, em verso e prosa, que
“Nada do que foi
será de novo do jeito que já foi um dia: tudo
passa; tudo sempre passará”;
e o terceiro
que filosofava na Grécia antiga ensinando:
“É
impossível banhar-se duas vezes no mesmo
rio”...
Pois é caro leitor, é inútil querer
entender esse mundo e os seus habitantes.
Mas, mesmo assim, sem entender o mundo,
temos que admitir que o ser humano é
realmente fantástico, e é inegável que Deus
estava muito inspirado, quando pegou um
monte de barro e fez dele a sua maior obra,
com um cérebro e essa coisa chamada de
inconsciente adaptável, que foi muito bem
descrita, no livro BLINK, do autor Malcolm
Gladwell:
“A única maneira pela qual os
seres
humanos poderiam ter sobrevivido como
espécie por tanto tempo é que eles
desenvolveram um tipo de dispositivo para
tomada de decisões, capaz de fazer
julgamentos muito rápidos com base em
muito poucas informações... O inconsciente
adaptável faz um excelente trabalho de
avaliar o mundo, alertar a pessoa em caso
de
perigo, definir metas e iniciar a ação de
maneira sofisticada e eficiente”.
Pois bem! Entre uma piscadela e
outra dos
meus olhos, foi inevitável, diante dos últimos
acontecimentos não pegar o livro
“Depoimentos” de Carlos Lacerda, e abrir no
capítulo XII: “Na noite de 23 para 24 de
agosto, estávamos em casa de Joaquim
Nabuco... abriram champanha, começamos
a
comemorar. Soubemos que Getúlio já tinha
renunciado àquela altura. Até que, já de
manhã, não me lembro bem a hora, alguém
telefonou anunciando o suicídio. É evidente
que houve aquele momento assim, de não
sei bem como definir o sentimento, em todo
caso, não era de alegria; era um sentimento
de pena do homem, da tragédia humana, da
tragédia pessoal do homem, de imaginar a
agonia em que um homem deve estar para
chegar a dar um tiro no coração... para quem
tivesse um mínimo de sensibilidade, via que
o
que tinha acontecido no Brasil era o que
aconteceu no drama de Shakespeare – Júlio
César. A mesma multidão que aclamava
Brutus e os assassinos de César, quando
Marco Antônio fez seu discurso com o
cadáver nos braços, começou a pedir a
morte
dos que tinham matado César. Foi assim
que
passei de vítima a assassino de Vargas”...
Tudo isso aconteceu há sessenta
anos, em
1954. E não se espante, caro leitor, que
estejamos vivenciando tudo novamente.
Nietzsche e o seu cérebro
privilegiado, de
inigualáveis aforismos, já tinha nos alertado:
“Esta vida, como você a está
vivendo e já
viveu, você terá de viver mais uma vez e por
incontáveis vezes; e nada haverá de novo
nela, mas cada dor e cada prazer e cada
suspiro e pensamento, e tudo o que é
inefavelmente grande e pequeno em sua
vida, terão de lhe suceder novamente, tudo
na mesma sequencia e ordem – e assim
também essa aranha e esse luar entre as
árvores, e também esse instante e eu
mesmo. A perene ampulheta do existir será
sempre virada novamente”.
E de repente, a perene ampulheta do existir
virou mesmo. Dor, prazer, suspiro,
pensamentos e acordamos com a notícia; “O
avião caiu. Eduardo Campos morreu!”. Tudo
como se fosse orquestrado pelo maestro
chamado destino. Maktub! No mesmo dia da
morte do seu avô Miguel Arraes; morre o
neto, candidato do PSB a presidência da
república. E é sempre no mesmo mês de
agosto. Desgosto, tristeza, comoção,
perplexidade e uma enorme de uma certa
incerteza: “O mistério está em toda parte”. E
quem se atreverá a desvendar o futuro a
partir de agora?! Quem?!
Futuro que já é presente, ou melhor, já virou
passado. E tudo corre e chega tão rápido,
que pisco os meus olhos novamente e vejo
os números 13 e 12.
Não sou muito bom em
matemática. Mas, graças a Deus, que esses
cálculos são possíveis de serem feitos por
qualquer pessoa: 13 do PT; 13 é o dia da
morte de Eduardo Campos. 12 anos de
governo do PT (oito de Lula e quatro de
Dilma); 12 é o capítulo do livro de Lacerda
que está sendo reescrito agora... Longe,
muito longe, de querer comparar Marina Silva
com um Marco Antônio, mas a morte de
César – assim como a de Getúlio Vargas e
agora a de Eduardo Campos-, é capaz de
promover mudanças inesperadas e
inimagináveis nas nossas vidas. E tudo que
se ver não é igual ao que a gente viu há um
segundo...
Em 12 dias, Marina Silva saiu de
21% para
34%. Subiu 13 pontos e iguala aos índices da
presidente Dilma. E no segundo turno, o
estrago é ainda maior:
“O país já não está
diante de uma ‘onda Marina’ - afirma o
jornalista Josias de Souza, no seu blog-, Mas
assiste ao surgimento de um Tsunami
eleitoral”.
Blink! Pisco os olhos mais uma vez. E escuto
Carl Orff e o seu “Carmina Burana”:
“Oh,
Fortuna/ És como a lua/ estado variável/
Sempre crescendo ou decrescendo”... e tudo
muda mesmo o tempo todo no mundo... mais
uma piscadela, e vejo a mensagem no
WhatsApp, do meu colega de turma Fábio
Marcelo: “Pinto! O homem faz planos, mas
tudo está no controle de Deus. Se tiver de
ser, ninguém vai impedir”...
Blink, blink, blink. Pisco os olhos e corro em
direção a minha biblioteca. Abro a página 39,
do Grande Sertão: Veredas e vejo a profética
mensagem do amigo Guimarães Rosa:
]
“Deus
é traiçoeiro! Ah, uma beleza de traiçoeiro –
dá gosto! A força dele, quando quer – moço!-
me dá o medo pavor! Deus vem vindo:
ninguém vê. Ele faz é na lei do mansinho –
assim é o milagre. E Deus ataca bonito, se
divertindo... Viver é negocio muito
perigoso!”...
Francisco Edilson Leite Pinto Junior –
Professor, médico e escrito
r