quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

A POESIA DO POVO...

Bule-Bule cantando com Mocinha de Passira

MOURÃO DE SETE SILABAS (Trocado)

Mocinha de Passira

Troque o amor pela paz
Os lábios pelo sorriso
O sucesso no cartaz
A cabeça no juízo
A fonte no escarcéu
O firmamento no céu
A terra no paraíso

Bule-Bule

Cantiga no improviso
O ritmo na melodia
O teto troque no piso
A casa na moradia
O travesseiro na cama
A lingerie no pijama
E a hora morna na fria

Mocinha de Passira

Troque José por Maria
Depois Maria em José
O lavatório na pia
O bangalô no Chalé
A janta troque na ceia
A taba pela aldeia
E o cacique no pajé

Bule-Bule

O leite pelo café
Açúcar por adoçante
O sapato pelo pé
O troféu pela estante
Clero na religião
A reza na oração
E o próximo no semelhante

Mocinha de Passira

Ciência na cartomante
Cartomante na ciência
O ouro pelo brilhante
O perfume na essência
O cardápio pelo prato
Fotografia em retrato
Saudade em reminiscência

Bule-Bule

A distância na ausência
O desejo na vontade
O perdão na indulgência
O bem pela caridade
O Cristão por batizado
Padrinho por afilhado
Respeito por amizade

Mocinha de Passira

Mistura em promiscuidade
Correria em movimento
Capuchinho pelo frade
Batismo no sacramento
Sacramento no batismo
O amor no romantismo
A alma no sentimento

Bule-Bule

Imagem no pensamento
Aorta no coração
Receita em medicamento
Clínico por cirurgião
Enfermo pelo ferido
A pílula no comprimido
A drágea na injeção


Mocinha de Passira

Escabeche no pirão
Vinagrete na salada
O arroz pelo feijão
Purê na macarronada
Condimento no tempero
Cabrito pelo carneiro
Mão de vaca em feijoada

Bule-Bule

Tapioca por cocada
Pirulito em mariola
Fanta em soda limonada
Guaraná em coca cola
Uísque por aguardente
Reflexo pelo repente
Cantoria por viola

Mocinha de Passira

Beato pelo carola
Esquizofrênico em maluco
O fuzil pela pistola
A garrucha no trabuco
Canhão na artilharia
Bule-Bule na Bahia
Mocinha por Pernambuco

Bule-Bule

Esclerosado em caduco
Caduco em esclerosado
O castrado no eunuco
O eunuco no castrado
O grupo pelo conjunto
O tema pelo assunto
Mourão de sete em trocado

* * *

Severino Feitosa cantando com João Paraibano

Severino Feitosa

Nas emoções de quem canta,
eu vou ver se me atino,
descobrir mais uma curva
na rota do meu destino,
pra ver se minha mão pega
Na mão santa do Divino.

João Paraibano

Mais de um irmão nordestino,
eu vejo comparecer,
o movimento dos dedos
faz a viola gemer,
e ojuízo ordena as frases,
Que a boca espera dizer.

Severino Feitosa

Eu tenho que percorrer
toda rota do metrô,
ultrapassar as montanhas,
sem ter medo do platô,
que eu só acerto uma ida,
se eu souber por onde vou.

João Paraibano

Cada um irmão que chegou
achou o portão aberto,
nosso verso sai sem rumo,
da cidade pra o deserto,
como juriti com medo
dum tiro que passou perto.

Severino Feitosa

Entre bonitos e feios,
só tem um que Deus lapida,
o que nasce na certeza
de descobrir a jazida,
mas eu me sinto é exposto
na galeria da vida.

João Paraibano

De matéria combalida,
não vou dirigir bengala,
vou trocar pranto por riso,
pra dar de presente à sala,
nem que eu não ache a botija,
não deixo de procurá-la.

Severino Feitosa

Eu sei que o vento embala
as asas do passarinho,
leva o cisco da estrada,
arranca o talo do ninho,
como eu tiro repente
das cordas velhas do pinho.

João Paraibano

Em cada corda do pinho,
eu amarro uma canção,
não tem coisa mais bonita
do que Jesus na visão
e o batuque da viola
por cima do coração.

João Paraibano

Não me falta resistência,
tenho o Deus pra me ajudar,
se eu vim do ventre chorando,
Jesus me ensinou a cantar
e eu gostei tanto do canto,
que eu me esqueci de chorar.

João Paraibano

Canto o sentimento alheio,
pra não pensar em complôs,
mãe tá morta, pai tá velho,
pra ir pra cova depois,
enquanto eu possuir vida,
canto a saudade dos dois

Severino Feitosa

Eu não aprendi depois,
que o meu pai teve fim,
suas rosas se abriram
e se fecharam em meu jardim,
quando eu deixar de cantar,
meu Deus que será de mim.

João Paraibano

Tudo o que quero pra mim
é a flor dos arvoredos,
gemido de sete cordas
da carapuça dos dedos,
e uma mulher de vergonha,
para esconder meus segredos.

Severino Feitosa

Eu faço calo nos dedos
nessas cordas desiguais,
cantar é o meu ofício,
o meu símbolo é sempre a paz,
nesse desenvolvimento,
que o meu juízo traz.

João Paraibano

Tudo o que eu quero é paz!
pra não viver de aperreio,
a minha estrofe bonita,
saída de um toque feio,
céu em cima, terra embaixo,
nosso trabalho no meio.

João Paraibano

Aos poucos vou marchando,
pra cova que nos consome,
com suor matando a sede,
o verso matando a fome
e o povo atrás de papel,
para decorar meu nome.

João Paraibano

Se faltar o que comer,
meu verso quebra o jejum,
em cada respiração,
eu quero verso comum,
e um pedaço de sertão
enganchado em cada um.

Severino Feitosa

O que eu acho comum
é enfrentar o sol quente,
me banhar na correnteza,
e me sentar no batente,
abrir os olhos pra o mundo,
e poder cantar repente.

João Paraibano

No calor da aguardente,
sinto o juízo agitado,
o verso nasce torcendo,
com meio quase envergado,
como agonia de cobra,
com espinhaço quebrado.

João Paraibano

No pé da serra rural
trabalhei de camponês,
nasci em 52,
já estou em 2003,
de tão feliz ainda sou
o artista de vocês.

João Paraibano

O pinho no peito preso
solta os primeiros ponteios,
e os nossos primeiros cantos,
como forma de gorjeios,
tirando ponta de espinhos
dos ferimentos alheios.

* * *

Geraldo Amâncio e Severino Feitosa cantando o mote:

São Mamede só foi bom
quando eu tinha dinheiro

Severino Feitosa

Meu amigo Manuel,
dessa bandeira procede,
se criou em São Mamede,
aquela terra fiel,
representou o papel,
de trabalhador, roceiro,
pois aqui é forasteiro,
veio escutar nosso som.
São Mamede só foi bom
quando eu tinha dinheiro.

Geraldo Amâncio

Naquele chão me criei,
desde a minha mocidade,
eu plantei muita amizade,
com todo mundo me dei,
mas depois que me mudei,
o povo ficou grosseiro,
é dali o violeiro,
por nome de Fenelon.
São Mamede só foi bom
quando eu tinha dinheiro.

Severino Feitosa

É minha terra importante,
aonde me batizei,
por lá muito trabalhei,
fui até comerciante,
de bar e de restaurante,
trabalhei o tempo inteiro
e escutei muito vaqueiro,
Zé, Severino e Solon.
São Mamede só foi bom
quando eu tinha dinheiro.

Geraldo Amâncio

Eu que sou um sertanejo,
me criei perto dos matos,
que fica perto de Patos,
onde eu matei meu desejo,
eu recebi muito beijo,
nesse tempo era solteiro,
inda hoje lembro o cheiro
da boca que tem batom.
São Mamede só foi bom
quando eu tinha dinheiro.

Severino Feitosa

Lá eu era conhecido
e virou logo uma zorra,
de Manuel da Cachorra,
me botaram o apelido,
naquele tempo sofrido
o trabalhador, roceiro,
viajante era cacheiro,
e corpete, califom.
São Mamede só foi bom
quando eu tinha dinheiro.

Geraldo Amâncio

Cada festa era mais linda,
em São Pedro ou São João,
se dançava em qualquer chão,
e o dia aguardava a vinda,
elétrica não tinha ainda,
foi violão ou pandeiro,
com o samba no terreiro,
com música de acordeon.
São Mamede só foi bom
quando eu tinha dinheiro.

Severino Feitosa

Pra meu pai e minha irmã,
trabalhei um tempo assim,
quando tudo ficou ruim,
eu não tinha mais um fã,
aí que doutor Gilvan,
notou o meu desespero,
que eu não tinha um cruzeiro,
pra comprar nem um bombom.
São Mamede só foi bom
quando eu tinha dinheiro.

Geraldo Amâncio

Eu tive muitos despachos,
pela minha mocidade,
eu lembro e sinto saudade,
andei nos rios, riachos,
só havia oito baixos
de um velho sanfoneiro,
o fole todo grosseiro,
fazendo fonronfonfom.
São Mamede só foi bom
quando eu tinha dinheiro.

Severino Feitosa

Era terra de fuxico,
de política, de folia,
mas eu farrava e bebia,
até na sombra do angico,
me chamava Mané Rico,
e eu só era barraqueiro,
mas gastava o tempo inteiro
nos forrós de Agamenon.
São Mamede só foi bom
quando eu tinha dinheiro.

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