domingo, 20 de fevereiro de 2011

AGORA É TARDE, INÊS É MORTA...

O dito popular: "Agora é tarde, Inês é morta!" designa que não há mais o que fazer, não há mais como desculpar-se, pois que o tempo disso já passou.

Poucos sabem, mas essa frase se refere a um passado de Portugal. Ao Rei Dom Pedro I de Portugal (o nosso dom Pedro I em Portugal, era IV) e às suas primeiras núpcias.

Provavelmente nasceu em 1320 a menina a que deram o nome de Inês de Castro, uma filha natural de Pedro Fernández de Castro e de Aldonza Soares de Valladares. Desde pequenina, foi levada ao castelo de Peñafiel, onde viveu em companhia de Constanza Manuel.

Apresentados os dados iniciais, vamos à história: Alfonso IV, rei de Portugal, decidiu que chegara a hora de seu filho mais velho, Pedro, contrair matrimônio. E como soía acontecer nas famílias reais, o casamento era mais uma forma de firmarem-se alianças que de propriamente um ato de amor. Podemos até imaginar o diálogo nos dias de hoje:

- Pedro, meu filho, está na hora de te casares.

- Ihhh... que é isso, pai?... sai dessa!

- Não, meu filho. Como és meu príncipe e herdeiro, tens que asumir logo as atribuições do trono.

- Mas não amo ninguém, pai!

- E quem te disse que um rei tem direito a amar? Apenas te casarás com aquela que melhor for para o nosso reino.

- Humpf! fazer o quê?... se é o jeito...

- É sim. Vai-te logo acostumando com a idéia.

Dom Alfonso fechou contrato com a famĺlia de Constanza e esta foi a Portugal. Acompanhada de sua dama, Inês de Castro. após uma longa viagem, chegaram ao palácio de Portugal. Dom Pedro esperava a comitiva. Quando as damas desembarcaram, ele se apaixonou perdidamente... pela dama de companhia, Inês de Castro. Com o casamento firmado, foi ter as benditas núpcias com a esposa. Mas, a partir do dia seguinte, começou a perseguir e a cortejar de todas as formas possíveis... Inês. e tanto fez, e tanto insistiu, e (dizem) tão charmoso era, que ela não teve como resistir... acabou por ceder, também flechada pelo cupido.

Entregaram-se às delícias de seu amor proibido. Pedro a colocou na Quinta das Lágrimas, em Coimbra, onde ela era rainha e dona do coração dele. Enquanto isso, no palácio, Constanza, que também se apaixonara pelo príncipe, morria à míngua. Inanição. Deitara-se na cama após o nascimento de Fernando, filho e herdeiro e, como o marido não a procurava mais, deixou-se morrer lentamente.

Passaram-se alguns anos e Inês teve com Pedro vários filhos: Beatriz, João e Dionísio. Viviam em harmonia invejável. Dom Alfonso se preocupava: Inês era natural e filha de Castela; não poderia deixar o reino de Portugal para a prole dela. Chamou seu filho Pedro e novamente propôs que ele se casasse. Ao que ele respondeu:

- Com prazer, meu pai. Contanto que seja com Inês de Castro.
De nada adiantou o pai apontar as desvantagens políticas e sociais do casamento com a ex-dama de companhia da ex-mulher dele, Pedro se mostrou irredutível. Só se casaria se fosse com Inês de Castro. Percebendo que não conseguiria nada em apelar para o bom senso do filho, Dom Alfonso o enviou em uma missão para longe de Portugal. Mal o filho saía da cidade, o rei, ouvindo seus conselheiros, resolveu mandar matar Inês de Castro. Com ela longe da vista do filho, este aceitaria um novo matrimônio.

Foram três os cavaleiros - Gonçalves, Coelho e Pacheco - que se dirigiram à Coimbra a fim de executar a jovem bela, de corpo esbelto e olhos claros e tranqüilos, e colo "de cisne" - como diziam os portugueses. Ao chegarem lá, dom Alfonso apeou do cavalo e foi ter com a jovem. Ela defendeu-se tão doce e verdadeiramente que o rei desarmou-se. Voltando aos outros cavaleiros, fez como Pilatos: lavou as mãos e entregou a justiça aos outros. Que, rapidamente, se precipitaram sobre a jovem mãe cercada de seus três filhos, o mais novo ainda de colo e a mataram.

Quando Pedro retornou e viu apenas um dos seus filhos sobrevivendo e, devido à brutalidade presenciada, nunca pôde ser considerado normal, entrou em desespero. Para maior desespero do pai, ainda repetia que se casaria apenas se fosse com Inês de Castro. "Mas ela está morta!" - reclamava o rei e o pai. Pedro calava-se e permaneceu mudo por mais alguns anos até que o pai morreu em 1357. E, como diz o ditado, "Rei morto, rei posto".

Mal Dom Pedro foi coroado rei, mandou exumar o corpo de Inês, mandou limpar ossinho por ossinho, mandou ligar todo o esqueleto de sua amada. Fez com que o casassem com ela. A única rainha morta da história; a que foi coroada depois de morta. E, reza a lenda, Pedro ainda exigiu que todos da corte viessem beijar a mão descarnada e render homenagem à rainha Inês.

Dizem ainda que dom Pedro não conseguia mais dormir, pois, que cada vez que pegava no sono, vinha-lhe a imagem de Inês a lhe lamentar: "Se estivesses perto de mim, eu não teria morrido. Por que tiveste que te afastar de mim?". Ele acordava gritando e saía pelas ruas de Portugal a fazer festa ou.. ia para as masmorras fazer justiça.

Sim, porque desde que fora coroado rei, ele mandara prender nas masmorras os executores de sua rainha. E sempre que descia a fim de torturá-los mais um pouco, eles gritavam por clemência:

- Perdão, el-rei! perdão, el-rei!

Ao que Dom Pedro respondia, invariavelmente:

- Agora é tarde; Inês é morta.

Apesar de tudo, Dom Pedro I ficou conhecido como o "Justiceiro" e amado pelo seu povo, pois sempre que podia nas questões jurídicas, fazia valer a lei para o lado dos mais pobres. Dizem, também, que dom Pedro nunca mais se deitou com nenhuma outra mulher e permaneceu fiel a Inês até o dia de sua morte. Ele mandara construir um mausoléu para a rainha, no monastério de Santa Maria de Alcobaça, considerada a obra gótica máxima de Portugal. Defronte, mandou construir o prórpio mausoléu... para que, no dia do juízo final, ele primeiro possa rever a sua amada Inês.


Uma história de amor histórica e lendária, da qual já não há mais como separar a lenda do real.

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