sábado, 14 de dezembro de 2013

A PROSA DE VIOLANTE PIMENTEL...

  •   CENAS DO CAMINHO -
  • Violante Pimentel

    “NEM GENTE RICA, NEM GENTE POBRE…”

    Havia em Nova-Cruz uma família humilde, composta pela mãe, Dona Nina, viúva de um ferroviário, e seis filhos. Dona Nina era uma mulher decente, mas vivia isolada da vizinhança. Todos a evitavam, por causa de uma comprovada peculiaridade que ela apresentava: Colocava mau-olhado em tudo que admirasse.
    Em decorrência de várias coincidências, ela criou essa fama, difícil de desmanchar. Na mesma rua morava Dona Lia, uma conhecida professora de Inglês, que gostava muito de plantas e de costurar para a família. Às vezes, a professora encontrava-se, de manhã cedo, aguando seu jardim, e Dona Nina se debruçava no muro, para admirar as roseiras que ela cultivava.
    Puxava assunto, pedia sempre alguma rosa para levar para Nossa Senhora, e só saía quando Dona Lia lhe dizia que iria se preparar para ir ao Colégio, ministrar aulas. Era fato público e notório que, quando Dona Nina admirava muito uma roseira, no mesmo dia a roseira murchava, ou surgia, de repente, um formigueiro para destruir todas as suas folhas. Dona Lia, por causa disso, não gostava da nefasta presença dessa mulher, apreciando o seu jardim.
    Também aconteceu, por diversas vezes, de Dona Lia estar costurando, e Dona Nina entrar em sua casa, para lhe falar alguma coisa. Para não perder tempo, Dona Lia a atendia mesmo no quarto de costura. Coincidência ou não, a agulha da máquina se quebrava na mesma hora, e Dona Lia nem sempre tinha outra agulha em casa para substituir. Por diversas vezes ocorreu esse fato, obrigando a professora a atrasar o seu trabalho amador de costureira.
    Uma tarde, logo cedo, perto das festas de fim de ano, Dona Lia se encontrava terminando umas costuras, quando bateram palmas no portão. A professora ficou tensa, temendo que fosse alguma pessoa de cerimônia, a quem ela tivesse de atender na sala de visitas. Isso iria atrasar as costuras. Então, Dona Lia disse para o filho Bernardo Celestino, que tinha cinco anos de idade :
    - Bernardo, veja quem é! Veja se é gente rica ou gente pobre! Se for gente rica, diga que eu não estou; se for gente pobre, diga que arrodeie pelo quintal e venha até aqui ao quarto de costura.
    Bernardo Celestino foi olhar quem era e voltou correndo, muito aflito, sem saber se tinha agido certo ou errado. E se justificando, disse à mãe:
    - Mamãe, eu disse logo que a senhora não estava! E quer saber de uma coisa? Não era gente rica, nem gente pobre! Era gente canalha, mamãe! Canalha!…
    E Dona Lia, curiosa, perguntou:
    - Mas quem era mesmo?
    Ele respondeu:
    - Era Dona Nina!!!
    Dona Lia tinha certeza de que a agulha da máquina teria se quebrado, com a presença indesejável de Dona Nina. Com um sorriso aliviado, deu graças a Deus pelo filho Bernardo Celestino ter dito à mulher que ela não estava em casa. Precoce e inteligente, o menino, de apenas cinco anos, evitou que a mãe se atrasasse nas costuras.
    Bom mesmo foi o desabafo de Dona Lia, que era muito espirituosa: ”Bicho danado! Você fez muito bem! Essa visita ia me atrapalhar
    !!!”

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