quarta-feira, 6 de julho de 2011
DE PEDRO SIMON PRA DILMA:RESISTIR É PRECISO...
Pedro Simon lê Carta Aberta à Dilma no Senado Federal
Em discurso que definiu como uma “Carta Aberta” dirigida à presidenta da República, o senador Pedro Simon (PMDB-RS) aconselhou Dilma Roussef a resistir ás pressões do fisiologismo dos partidos políticos.
- Resista, sra. Presidenta, não se curve à chantagem política em nome da falácia da governabilidade, afirmou. Na avaliação do parlamentar, "ao resistir à corrupção, Dilma estará pautando a conduta não só do Executivo, mas também do Judiciário e, principalmente, do Legislativo." Senadores Ricardo Ferraço (PMDB-ES), Eduardo Suplicy (PT-SP) e Cristovam Buarque (PDT-DF) fizeram apartes de apoio ao pronunciamento de Simon.
TEXTO
CARTA ABERTA À PRESIDENTA DILMA ROUSSEF
"Senhor Presidente,
Senhoras Senadoras e Senhores Senadores:
Hoje, quem sabe, com a permissão do presidente dessa sessão e com o aval de todos os meus pares, eu pudesse modificar essa avocação inicial, para me dirigir, diretamente, à nossa presidenta da República.
Eu poderia me reportar a ela pessoalmente, até porque ela tem me demonstrado, nos nossos poucos encontros formais, uma atenção especial, diria até carinhoso, não sei se por respeito à idade, ou pelo muito que nos une, politicamente, nessa nossa trajetória histórica de luzes e de sombras.
Eu tenho a convicção de que milhões de brasileiros gostariam de ter, neste momento, o mesmo privilégio desta tribuna, cujos microfones têm o poder de levar as nossas vozes, tanto para os lares brasileiros, através da Rádio e da TV Senado, como para os gabinetes de todos os poderes.
Todos esses mesmos brasileiros, estou certo, têm, hoje, uma mensagem à Presidenta Dilma Roussef. Faço-o porque não posso fugir à responsabilidade que me foi dada pelo voto, a mais legítima procuração para falar em nome do coletivo. Faço-o, também, e por que não, pela coerência que me impus na construção da minha própria história.
Procuro uma palavra que possa simbolizar a nossa presidenta, ao mesmo tempo em que traduza o sentimento que deverá alinhavar essa nossa conversa. De um senador a uma presidenta, ambos eleitos e legítimos nas suas funções públicas. Busco, então, na presidenta, uma característica, uma maneira de ser, um predicado que possa completar e justificar o sujeito da minha mensagem.
Poderia ser “trabalho”. Poderia ser “obstinação”. Poderia ser “persistência”. Poderia ser “luta”. Poderia ser, quem sabe, “perdão”. De repente, eu me vejo diante de uma múltipla escolha, de características pessoais próprias da biografia de quem a vida é plena de sentimentos coletivos.
Talvez a melhor palavra para, ao mesmo tempo, constituir-se no mote dessa minha espécie de “carta aberta à presidenta da República”, ao mesmo tempo em que identifique, da forma que eu imagino ser mais fiel, a minha “destinatária”, seja “resistência”. Repito: resistência!
Vou ao nosso mais famoso dicionário. “Resistência”: “ato ou efeito de resistir; força que se opõe a outra, que não cede a outra; força que defende um organismo do desgaste de doença, cansaço, fome, etc.; aquilo que se opõe ao deslocamento de um corpo que se move; luta em defesa; oposição ou reação a uma força opressora; vigor moral, ânimo”
Portanto, Excelentíssima Senhora Presidente Dilma Roussef.
Acho que não preciso justificar a minha escolha, quando me lembro da sua história. Ela tem sido, até aqui, marcada por todos os significados da palavra “resistir”. No campo pessoal. No campo político. Enfim, no campo da sua própria vida.
As masmorras da vida jamais lhe fizeram esmorecer. Nem mesmo quando a força opressora, ou quando o sistema, lhe tentaram minar o último fio dessa mesma resistência. E, consequentemente, da sua existência.
Sei que, nesses momentos, não é fácil “oferecer a outra face”. Perdoar, quem sabe. Esquecer, difícil.
Mas, ainda que tenham sido momentos inesquecíveis, do ponto de vista histórico e pessoal, a Senhora está vivendo, hoje, o tempo mais importante da sua vida.
O princípio é o mesmo: a luta pelos milhões que estão, ou que continuam, lá fora. Dos subterrâneos de ontem e dos gabinetes de hoje. Os que estão lá fora da verdadeira cidadania. Os que estão lá fora, ainda, da verdadeira liberdade. E da verdadeira democracia.
Talvez a Senhora, apesar da experiência recente nos mais altos cargos da República, ainda assim não tivesse dado conta de que o poder também tem os seus torniquetes.
Antes, os porões. Agora, as coxias.
Por isso, vou repetir, sempre que necessário, a nossa palavra-chave: resistir.
Resista à continuidade da corrupção.
Antes, lhe exigiam nomes. Agora, trazem-nos.
A Senhora nunca deu os nomes, como afirmou, emocionada, naquela sessão aqui do Senado, “porque isso significava indicá-los ao corredor da morte”. Agora, não aceite indicações que não tenham o lastro da ética. Desviar o dinheiro público é, também, encaminhar outros nomes para o corredor da morte pela fome, pela falta de remédios, pela falta de segurança, pela falta de cidadania. Pela escuridão que persiste: a do analfabetismo.
Repito: os princípios são os mesmos. Resista!
Os poderes são harmônicos e independentes. Mas, a harmonia não pode ser alcançada através da imposição, principalmente se ela vier descalça dos melhores valores.
Se o poder tem que ser compartilhado, e se ainda é difícil fugir das tais “base de apoio”, é preciso saber em nome de quem, e de que, falam os “interlocutores”. Que interesses reais movem as tais “indicações”? Do bem coletivo ou dos interesses individuais e de pequenos grupos?
Não se curve à chantagem. Nomeie, apenas, profissionais cujos currículos sejam construídos pela competência e pelo profissionalismo e moldados pela ética. Aqueles que se proponham, tão somente, trabalhar pelo bem comum.
A sociedade brasileira foi às ruas e exigiu “ficha limpa” para todos os que se propõem exercer um mandato político. Isso deve ser estendido para todos os que ocupem um cargo público.
A ficha limpa tem que ser, necessariamente, um critério para qualquer nomeação, em todos os escalões do governo. Qualquer desvio de conduta tem que ser, necessariamente, acompanhado da devida punição. Que se inicia, obviamente, pela destituição do cargo. E que siga todos os demais trâmites legais, para que sirva de exemplo.
O País não pode continuar inerte aos esquemas de corrupção que se instalaram nas entranhas do poder. E, existem dois remédios para curetar essa verdadeira ferida, que sangra recursos públicos. O primeiro é preventivo: que os atos de nomeação sejam acompanhados, necessariamente, pela chancela da probidade do nomeado. O segundo é corretivo: se as luzes do poder ofuscarem a ética do nomeado, que ele não continue se protegendo com o “remédio caseiro” da impunidade.
O episódio recente, que envolveu um dos seus principais ministros, foi um sinal que alimenta, nos brasileiros, a esperança da devida mudança. Antes, as denúncias eram descaracterizadas por defesas pré-fabricadas. Por discursos de continuísmo. Neste episódio, a Senhora deu mostras de que não haverá tolerância com quem usa, em benefício próprio, os holofotes do poder, não importa quem seja.
Tenha a certeza, senhora Presidenta, de que a minha voz, aqui no Congresso, não é isolada. Os seus gestos de resistência terão, aqui, a ressonância construída pelo eco das ruas. Podemos, também aqui, ser minoria. Mas, a experiência recente dá conta de que a vontade popular atravessa as paredes dos gabinetes. Abre as coxias.
A sua resistência, senhora Presidenta, poderá ser, inclusive, um passo dos mais importantes para uma mudança de postura e de conduta, não só no Poder Executivo, mas em todas as outras instâncias, do Judiciário e, principalmente, do Legislativo.
Bom será o dia em que o Congresso votará, apenas e tão somente, segundo as convicções dos parlamentares. Segundo, como deve ser, as aspirações de quem eles representam. Que o voto em plenário não se constitua em um instrumento de troca para a liberação de emendas e a indicação de apadrinhados.
Se a proposta legislativa for aprovada, ou rejeitada, que seja porque as nossas consciências assim o oriente, e não porque se construiu maiorias a poder de promessas nem sempre lastreadas na boa conduta.
Quem sabe essa atitude seja, então, o início, de fato, de uma reforma política? Ou, pelo menos de uma reforma nas condutas políticas?
Resista, mais uma vez, senhora Presidenta. Os primeiros meses do seu governo sempre deram a indicação de que este meu discurso seria desnecessário. Sinais evidentes de que os critérios de prioridade de escolha caminham no sentido de impor restrições a imposições de nomes e de ações.
De repente, a imprensa passou estampar avaliações no sentido de que lhe faltava traquejo político, ao não atender aos pleitos dos parlamentares. De não liberar emendas. De não nomear os indicados pelos “líderes”. De não receber os propensos “interlocutores”. E, ato contínuo, algumas nomeações, de sobrenomes plenamente conhecidos, começaram a ser veiculadas, na mesma imprensa. Indicação de quem? Em nome de quem?
Senhora Presidenta, se era “falta de traquejo” não nomear apadrinhados, em nome da falácia da “governabilidade”, continue “inexperiente”. Construiremos, assim, outra “experiência”. Melhor, mais legítima e mais ética.
Resista, senhora Presidenta, a essa “experiência política” que, há tanto tempo, lutamos para que seja mudada. E é isso que, até aqui, louvamos no seu governo. Não se curvar a chantagens políticas, em nome da tal “governabilidade”. A governabilidade, sem aspas, virá da legitimidade popular, de quem depositou, nas urnas, a esperança de que a Senhora é, de fato, um sinal de mudança na conduta política deste país.
Resista, senhora Presidenta. Não há que se curvar a um Congresso que, pela atitude de alguns e não da maioria, ocupa, há muito tempo, o rodapé da legitimidade popular. Uma Casa que é o sustentáculo da democracia. E que precisa mudar, portanto. Nada se sustenta, enquanto faltar essa mesma legitimidade. E o Congresso só vai mudar quando ele for, efetivamente, independente. E que a harmonia entre os poderes se construir com a argamassa do interesse coletivo.
Não permita que o Legislativo execute. Por outro lado, também não continue a atitude de governos que lhe antecederam, nefasta para a nossa legitimidade, do Executivo legislar. Utilize-se das medidas provisórias, tão somente, quando elas forem, realmente, necessárias e urgentes. Neste caso, e as últimas discussões legislativas assim estão indicando, o Congresso também vai resistir. As Medidas Provisórias são, para o Congresso, também, tal e qual, um torniquete.
Difícil falar em independência de poderes, quando o Congresso utiliza o voto como moeda de troca para nomeações e liberações de recursos que ele mesmo votou, no Orçamento. E quando o Executivo inunda esse mesmo Congresso com medidas tipicamente legislativas. Os parlamentares não foram eleitos para executar. Nem o Executivo para legislar.
Resistamos, todos nós, portanto, senhora Presidente. O que está em pauta, ou em jogo, novamente, hoje como antes, é a democracia.
É a primeira vez que o País elege uma mulher para dirigir os seus destinos. Alguém cuja sensibilidade lhe é nata. Dizem muitos que foi um sinal de desejo de continuidade. Em algumas questões, não nego. Continuidade da diminuição da pobreza. Das disparidades regionais e pessoais de distribuição de renda. Da inclusão, portanto, dos milhões de brasileiros que ainda permanecem algo assim como clandestinos dentro de seu próprio país.
Mas, não há como negar que a sua eleição foi um sinal mais que evidente de desejo de mudança. Aliás, querem alguns que nada seja alterado nos mecanismos de poder. São os mesmos que avocam os tais “riscos à governabilidade”. Querem manter os seus privilégios.
Os riscos à governabilidade virão se vicejarem a corrupção, a impunidade, a troca de favores, a falta de legitimidade das nossas instituições públicas. A falta de democracia e a falta de cidadania.
Há que se resistir, portanto. Acrescento mais uma definição de “resistência”, ainda extraída do nosso mais popular dicionário: “força que se opõe ao movimento de um sistema”.
Foi contra o movimento de um sistema que lutamos antes. Se permanecem resquícios fortes desse mesmo sistema, é contra ele que devemos continuar a nossa luta, hoje. Com as mesmas armas dos nossos ideais, não importa o tempo.
É o que eu tenho a dizer à nossa presidenta Dilma Rousseff.
Estou certo, pelo que tenho ouvido nas minhas andanças, de que é o que o povo brasileiro também tem a dizer à presidenta da República.
Era o que eu tinha a dizer, deste plenário."
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