MARIA MADALENA EM CORDEL...

* * *

Um folheto de Severino Borges Silva 
O ROMANCE DE MARIA MADALENA

Leitor,leia este romance
Traçado por minha pena,
Um drama impressionante,
A mais empolgante cena
Do episódio da vida
De Maria Madalena.

Era Madalena filha
De Sir, um nobre judeu,
Eucádia foi sua mãe,
Lázaro foi irmão seu.
E Marta era sua irmã,
Pois de Eucádia nasceu.

O velho Sir era um homem
De completa retidão
E, do povo de Israel
Tinha consideração.
Sua esposa era um exemplo
Das filhas de Abrahão.

Residiam em Betânia
Naquelas datas primeiras,
Num sítio muito abundante
Circulado de palmeiras,
Igualmente as ricas fraudas
Do monte das oliveiras.

O velho Sir se sentava
Na sombra dos palmeirais
Contemplando as maravilhas
De Jeová, pai dos pais,
Recebendo a fria risa
Nas estações invernais,

muitas vezes ele pedia
A Jeová, sem desconte:
-Oh Deus! Tirai minha vida
Para eu ver outro horizonte,
Antes que Maria manche
As rugas da minha fronte.  

Pois ele por ela,havia
Sofrido mais de um desmaio.
Maria era uma deusa,
Pra namorar era um raio,
Em formosura, imitava
As flores do mês de maio.

Tocava harpa e cantava
Como um anjo Serafim.
O seu corpo era de um porte
Que nunca se viu assim,
O seu rosto tinha os traços
De um arcanjo ou querubim.

Seus cabelos encantavam
Flutuando sobre si,
Parecia que um dos raios
Do sol que banhou Davi,
Estava, efetivamente,
Embelezando-a ali.

E quando ela soltava
Seu cabelo fino e louro,
Parecia ter nos ombros
Um manto feito de ouro
E todos admiravam
Aquele belo tesouro.

Brilhava esse manto louro
Numa cútis branca e fina
As faces frescas, coradas
Como a maçã purpurina
Olhos lindos, azulados
Como o céu da Palestina.

Afinal, em boniteza
Madalena estava só
Desde a velha Galiléia
Aos barracos de Jacó
Nos lábios tinha o perfume
Dos cravos de Jericó.

Todo homem desejava
Tê-la por sua querida,
Pois outra da forma dela
Ali, não fora nascida
Ela era um sonho poético
Das maravilhas da vida .

E por ela ser assim
De Jerusalém,chegava
Cavalheiros importantes
Sua mão solicitavam
e ricos arcos de flores
Por cima dela,jogavam .

O velho Sir quando via
Toda essa comitiva
Reclamava. Ela dizia:
-Isto o senhor não me priva
Eu quero gozar a vida
durante enquanto for viva.

 O velho Sir e Eucádia
Choravam de fazer pena,
Envergonhados, por verem
Essa vergonhosa cena,
Produzida da beleza
Do rosto de Madalena.

Pois para ver Madalena
Chegavam a todo momento
Rapazes, em corcéis ricos
E Eucádia, no tormento
Dizia:- Oh, Deus, tirai-me
Deste cruel sofrimento.

A morte num certo dia
Batendo asas, foi cair
Sobre a virtuosa Eucádia
E dali, só quis sair
Quando viu a sua alma
Para o espaço subir.

O velho Sir chorou tanto
Que já não houve ninguém
Que aplacasse o seu pranto
E disse:- Não me convém
Eu viver. E com seis meses
Deixou a vida também.

Porém, antes de morrer
Chamou seus filhos primeiros
E disse:- Filhos queridos
Sejam vocês meus herdeiros
E me ouçam pois estou
Nos momentos derradeiros.

Abracem-me, que vou deixar
Hoje o mundo dos mortais
E não se esqueçam de honrar
As cinzas dos nossos pais,
Que por lembrança, deixam
Herdades especiais.

Olhou para Madalena,
Disse cheio de saudade:
-Minha filha, eu vou partir
Para a santa eternidade,
Porém te peço que deixes
A vida de vaidade.

Eu vou morrer porém Lázaro
Ficará no meu lugar,
Tu obedecendo a ele,
Não precisas adorar
A esses ricos, que vivem
Somente a te conquistar.

E dizendo estas palavras
Gemeu e logo expirou,
Marta quase se acabava
Quando seu pai se ultimou,
Mas Madalena, por ele
Poucas lagrimas derramou.

E logo do velho Sir
Ela esqueceu os deveres,
Desobedeceu a Lázaro,
 Desprezou os afazeres
Só se entretinha com causas
De diversões e prazeres.

Pois pra modas e prazeres,
Madalena tinha o dom,
Recebendo todo dia
Vestido bem feito e bom,
Dos negociantes, que
Vinham de Tiro e Sidom.

Lázaro com muita raiva
Reclamava muito a ela,
Várias noites,no seu quarto
Via por trás da janela
Quatro, cinco vultos negros.
Rondando, em procura dela .

ázaro viu, certa noite,
Olhando pela janela
Um homem cair morrendo
Esfaqueado, sem vela,
Ele enraivou-se de novo
E repreendeu a ela .

Madalena, tu não podes
Comigo, viver assim
Nesta  vida depravada,
O povo levando fim
Por tua causa e agora
Pensa e responde a mim.

Ela disse:-Pois então
Desde já, irei embora
Desta tua casa e nela
Não passo mais uma hora,
No castelo de Madalo
Irei residir agora.

Chamou logo seus criados
E uma velhinha de fé,
Seguiu para a Galiléia
Com eles,andando a pé
Até chegar no castelo
Do lago Genezaré.

Pois esse dito castelo
Ao  seu bom pai pertencia
Ela o havia herdado.
Lá fixou moradia
Vivendo toda liberta
Da forma que entendia.

Do castelo de Madalo
Ela fez seu paraíso,
Conquistando quem passava
Com o semblante de riso
E muitos por sua causa
Perderam todo o juízo

Trouxe de Cafarnaum
Quatro donzelas formosas
Para viverem com ela
E, nas festas mais pomposas,
Embrigarem as almas
Das pessoas virtuosas.

Mas era toda volúvel
Igualmente á mariposa,
Dizia:- Eu namoro a todos,
De nenhum serei esposa,
Minha virgindade eu levo
Pra dentro da fria lousa.

Todo dia, em seu castelo
Fazia um rico festim
Danças pelas densas sombras
Das ramadas de jasmim,
A sua vida brilhante
Diariamente, era assim.

Se apresentava nas danças
Envolvida em ricos mantos,
Entoava em sua harpa
Os mais amorosos cantos,
Era impossível, um homem
Resistir ao seus encantos.

Quando via seus amores
Dela ficarem distantes,
Banhava o castelo com
Perfumes inebriantes
Na mesma hora, se via
rodeada de amantes.

Assim a jovem vivia
No maior depravamento,
 Praticando o que queria
No  seu pomposo aposento
Que até o sol se escondia
Pesado de sentimento.

Uma certa madrugada
Ela saiu do jardim
E muito enfadada, entrou
No    seu rico camarim
Feito  com a perfeição
De um ornamento sem fim.

No seu camarim sentia
Impressões sublimes,gratas
Em ver os raios da lua
Brilhando sobre as cascatas
E dali a moça ouvia
Amorosas serenatas.

Logo assim que ela entrou
No  citado camarim,
enrolou-se de repente
Nas cobertas de cetim
Nisto um som melodioso
Ouviu além do jardim.

Era uma lira tocante
Que   pela brisa serena
Soltava um som melancólico,
De causar tristeza e pena,
Entrando pela janela
Do  quarto de Madalena.

Madalena levantou-se
Pois o som melodioso
Passava no seu ouvido,
Muito tristonho e queixoso,
Como quem dizia:-Ah! Quem
Me dera ser teu esposo!

Esta hora,ela sentiu
A furada de uma seta
Nas fibras do coração
Que a fez ficar pateta,
Pelas notas amorosas
Da lira de um ser poeta.

Acabou-se o som da lira,
Mas ela do camarim
Ouviu uma voz queixosa
Cantando além do jardim,
Uns versos mui comoventes
Por esta maneira assim.

-Dos viventes desse mundo
Eu sou o mais sofredor,
Pois  nasci numa montanha
De aspecto de terror,
Criei-me numa cabana
E hoje morro de amor.

Na noite que eu nasci
Longos trovões estrondaram,
Uns bandidos meus amigos
Com leite me alimentaram
E por filho do trovão
Depois, me apelidaram.

Porém minha descendência
Tem origem principal,
Pois sinto pular nas veias
Jorros de sangue real,
Hoje por causa do amor
Ninguém acalma o meu mal.

Por tua beleza eu sinto
Na minha alma o calor,
Como não vens à janela
Pérola e cândida flor,
Verás amanhã,na porta
Os restos do teu cantor.

Nesses versos, Madalena
Abriu depressa, a janela
E uma escada de seda
Arriou com bem cautela,
O cantor vendo a escada
Entrou no quarto, por ela..

E depois que Boanerges
Penetrou no camarim,
Ela pergunta:-Eras tu
Que estavas lá no jardim
Cantando num improviso
Coisas bela pra mim?

Ele lhe disse:-Era eu mesmo,
Pois tenho na minha idéia
Versos, que já têm causado
Surpresa,em alta platéia,
Porisso, todos me chamam
De: o cisne da Galiléia.

Ela lhe disse:-então, olha
Para a minha trança loura
E descreve em poesia
Com frase bem sedutora,
Porque e que todo o povo
Me chama de pecadora.

Ele disse:-És pecadora
porque teu lindo semblante
É como a aurora, que
Surge viva e radiante
Por entre as nuvens de opala
Trazendo luz cintilante.

O teu corpo é a imagem
Onde mora a poesia,
Teu corpo voluptuoso
Tem correntes de magia,
Em teus lindos olhos brilha
A serena luz do dia.

Teus dentes alvos e lindos
Qual pérolas ou marfins,
Os teus lábios nacarados
Brotam olor dos jardins,
Os teus cabelos de ouro
Têm o cheiro dos jasmins.

Entre as donzelas da terra
És tu a mais linda flor,
Teu sorriso é doce e leve,
Teu corpo tem linda cor,
Não posso ver tua imagem
Sem sentir febre de amor.

Tu és a flor de Betânia
Sublime e inspiradora,
O teu riso é palpitante,
Tua boca é sedutora,
Eis aí, porque o povo
Te chama de pecadora.

Nessa hora, Madalena
Estava quase suspensa,
Então disse a Boanerges:
-Pela poesia imensa
Dá um beijo em minha boca,
Eis a tua recompensa!

Porém quero que tu venhas
Noventa noites cantar
Aqui para eu ouvir bem,
Pois quero bem te pagar,
No fim das noventa noites
Meu amor, hás de ganhar.

Boanerges aceitou
O contrato, nessa hora
E como já estava perto
De surgir a branca aurora
Deu-lhe o beijo em sua boca,
Despediu-se e foi embora.

Assim decorreram noites
E a donzela de Madalo,
Ouvindo o som suavíssimo
Da lira do seu vassalo,
Deixando a alma nas chamas
E o coração em abalo.

Porém, numa madrugada,
Madalena, com cautela,
Levantou-se e logo abriu
Do camarim, a janela
E pôs-se a olhar os campos,
Debruçada sobre ela.

A brisa nesse momento
Soprava em seu camarim
E os louros raios de sol
Mostravam brilho sem fim,
Banhando as verdes ramagens
Das árvores do seu jardim.

As árvores balançavam-se
No sopro da ventania,
A passarada cantava
Em doce e santa armonia,
Louvando o poder de Deus
E a serena luz do dia.

Com isso, o seu pensamento
Ficou quase paralelo
E  subitamente, viu
Um homem feio, outro belo
Por debaixo das palmeiras
Do jardim do seu castelo.

Madalena viu que um
Era moço e bem distinto
E parou a uns vinte passos,
Distante do seu recinto,
Debaixo das verdes ramas
De um frondoso terebinto.

Madalena olhou pra ele
Com olhar de simpatia,
Porém sentiu de momento
Uma estranha nostalgia,
Que já não compreendeu
O que seu corpo sentia.

Ela sentindo esse choque
Pensou de até levar fim
Inda tombou pra cair
Dentro do seu camarim,
Mas nisso ouviu que o homem
Falava,dizendo assim:

-A alma é mais que a comida
Com sua soberania,
O corpo é mais que o vestido,
Composto de galhardia
E não a causa coberta
Que não se descubra um dia.

Deixai a terra e segui
Para a bem-aventurança,
Que o que é de Deus é seguro
Com justiça e com bonança,
Só as belezas terrenas
São de pouca segurança.

E não convideis os ricos
Pra vossos festins amados,
Convidareis os paralíticos
Cegos,coxos e aleijados,
Pra ver se sereis um dia
Um dos bem-aventurados.

Nisso ela viu quando o homem
Olhando-a,disse com calma:
-Toma tua cruz e segue-me,
Que dou-te da vida, a palma
Pois vim para a Terra,salvar
Do inferno, o corpo e a alma.

Disse assim e retirou-se
Daquele enorme jardim.
Madalena arriou logo
As cobertas de cetim,
Quando virou-se, foi vendo
O homem em seu camarim.

Madalena perguntou:
-Quem está aí em pé ?
Ele respondeu-lhe logo:
-É Jesus de Nazaré,
Que busca tirar do erro
As almas de pouca fé.

Sai dessa vida de orgia,
Deixa teus adoradores
Que Deus amenizará
As tuas culpas e dores
Pois Ele enviou-me á Terra
Para salvar os pecadores.

E vim dizer-te que és
Uma ovelha desgarrada.
Sai deste castelo e volta
Pra tua antiga morada
De Betânia,que teus manos
Te esperarão na chegada.

Madalena logo ali
Solto do peito um gemido
E botou as mãos no rosto
Quase a perder o sentido,
Quando olhou, Jesus
Tinha desaparecido.

Nessa noite,Boanerges
Veio ver a sua amada;
Quando chegou no jardim
Viu a janela fechada
E o castelo em silêncio
Sem um ruído de nada.

Arrancou de sua lira
Notas suaves de amor,
Para ver se Madalena
Vinha acalmar sua dor,
Porém ela, nessa noite
Não quis ouvir o cantor.

De manhãzinha, o cantor
Cantou mais outra canção,
A fim de ver se a donzela
Abriu o seu janelão.
Não sendo correspondido,
Derramou prantos no chão.

Depois ouviu sobre as folhas
As abelhas em zum-zum
E viu sair do castelo
Duas moças em comum
Em procura da estrada
Que ia a Cafarnaum.

Ele conheceu que uma
Era Madalena bela
E seguiu ligeiramente
Logo no encalço dela,
Atento, para saber
Pra onde seguia ela.

Seguiu até quando elas
Em Cafarnaum chegaram
E na casa de um fariseu
Incontinenti, pararam,
Dando bom-dia a um velho
Que no portão encontraram.

Madalena perguntou
Ao velho que estava ali:
-Meu bom velho,me responda
se o Cristo se encontra aqui?
O velho lhe disse:-Está,
Entre, Ele espera por si.

Madalena deu seu véu
À outra, nesse momento,
Entrou na casa, levando
Uma taça de ungüento.
Boanerges, escondido,
Via todo movimento.

Tendo Madalena entrado
Na casa de Semeão,
Deparou-se com Jesus
Em grande reunião.
O povo avistando ela
Houve grande agitação.

E logo alguns murmuraram
Com frases de estupidez:
-Como é que esta mulher,
Que tanto escândalo já fez,
Atreve-se a penetrar
Num salão de honradez?

Com essa voz, Madalena
Ficou toda acabrunhada,
Aflita,pelo remorso
De sua vida passada,
Porém Jesus, para ela
Não olhou, nem disse nada.

Madalena comovida,
Soltou dos olhos azuis
Jorros de lagrimas quentes
E forçada pela luz
Foi cair banhada em prantos
Beijando os pés de Jesus.

Mas,com tudo isso, Jesus
Não deu-lhe a mínima atenção,
Continuou conversando
Perante a reunião
E nada fez distraí-lo
Da sua conversação.

Nessa hora,Madalena
Botou com carinho e zelos
Ungüento nos pés de Cristo
Sem ouvir os atropelos.
Depois,enxugou-lhe os pés
Com seus macios cabelos.

Nisso, o velho Semeão
Disse em voz blasfemadora:
-Se esse homem fosse profeta
Via que esta sedutora
Que beijou-lhe os pés agora
É a maior pecadora.

Com essa frase, Jesus
Virou-se sem ter demora
Pra Semeão e lhe disse:
-Eu só falo quando é hora.
Escuta, que vou dizer-te
Uma coisa certa,agora.

Era um grande criador
Que tinha dois devedores.
Um, de quinhentos dinheiros,
Sofrendo grandes clamores.
Outro, devendo cinqüenta,
Sofrendo os mesmos horrores.

Ele perdoou aos dois,
Cheio de graça e amor.
Eles ficaram contentes
Devido ao grande favor.
Qual dos dois devia mais
Amar esse criador?

Diz o velho:-O de quinhentos
Devia amá-lo melhor
E o que devia cinqüenta
Amá-lo em ponto menor
Isto porque o primeiro
Tinha a divida maior.

Jesus disse:-muito bem
Julgaste com pura fé,
Só que não me deste ainda
Água que eu lavasse um pé.
Esta lavou-me com lagrimas,
Pecadora como é.

E disse pra Madalena:
-Esquece os dias passados,
Levanta-te, que serão
Perdoados teus pecados
E volta para residência
Dos teus irmãos adorados.

Madalena ali sentiu
Força da divina luz
E retirou-se,deixando
Seus lindos mantos azuis
Para os pobres,que esperavam
A saída de Jesus.

E pra seu velho castelo
Ligeiramente rumou
Junto com a sua dama,
Que logo lhe acompanhou.
Boanerjes, acompanhando-a,
Por esta forma falou:

-Madalena, em teu amor
O meu coração se veste,
Eu quero saber se tu
Esqueceste o que disseste
A mim lá no teu castelo,
Numa jura que fizeste.

Nisso, ela baixou os olhos
E disse num tom sisudo:
-Boanerjes,tu me esqueces
Que minha idéia eu não mudo,
De hoje em diante, entre nós
já terminou foi tudo.

Pois eu não preciso mais
Das orgias,nem de amores,
De riqueza e de castelo
Nem também de adoradores
Só adoro a um, que tira
A culpa dos pecadores.

E se queres ser feliz,
Toma também tua cruz
E obedece às palavras
Do Santo Mestre Jesus,
Que só Nele encontrarás
A fonte de viva luz.

Boanerjes observou
Toda a conversa,com calma,
Ouvindo na sua mente
Um da viva, outro da palma,
Sentindo um poder estranho
Bem no íntimo da alma.

E quando cuidou de si
Ela já tinha saído.
Ele exclamou:-Oh, ingrata,
Tem dó deste desvalido!
Quando lembrou-se da mãe
Caiu no chão sem sentido.

Nisso, passa um cavaleiro
Numa rica montaria,
O qual leva Boanerjes
Transpassado de agonia
Para a gruta do profeta,
Onde sua mãe vivia.

Madalena deu de esmola
Suas riquezas sobradas
E voltou para Betânia
Pra ver as velhas chapadas.
Lá, pediu perdão a Lázaro
De suas culpas passadas.

E ficou com seus irmãos
Deveras arrependida,
Cumprindo as ordens de Cristo
Junto a sua irmã querida
E o mano, que não deixava
De zelar por sua vida.

Ia completar três anos
Que Jesus, o mestre,havia
Deixado Genezaré,
Onde sua mãe vivia,
Mas de voltar novamente
Á rica Genazaré.

A santa virgem Maria
Já esperava com fé,
Junto a Maria Cleofas
Suzana e Salomé,
Jesus voltar novamente
Á rica Genazaré.

Numa manhã, em que a brisa
Soprava pela folhagem,
Jesus chegou novamente
Revestido de coragem
Dentro de Cafarnaum
De sua ultima viagem.

A santa virgem saiu
Com suas vestes azuis,
Juntamente as três Marias
Pra onde estava Jesus,
Mostrando em Cafarnaum
A sua divina luz.

Maria abraçou Jesus
Chorando como ninguém
No maior pranto possível
Pedia a Ele também
Para não pisar no pó
Da ímpia Jerusalém.

Jesus disse:-Minha mãe
A data já está chegada
Minha hora se aproxima,
Não devo temer a nada,
Pois minha morte já foi
Pelo meu pai, decretada.

Eu desci do Céu à Terra
Para pregar a verdade,
No entanto ela será
A minha finalidade,
Mas meu sangue lavará

Ela disse:-Então me leva
Contigo, meu Santo lírio
Para eu também ajudar-te
A sofrer este martírio,
Pois quero exaltar contigo
Meu derradeiro delírio.

Jesus disse:-Minha mãe,
Eu me apartarei de ti
Por pouco tempo, mas levo-te
Para o reino do Rabi,
Porém antes, muitas lágrimas
Hás de derramar aqui.

Pois breve verás os dramas
De minha morte e paixão.
Jesus ao falar-lhe assim,
Osculou a sua mão
E seguiu com seus discípulos
Para a margem do Jordão.

Estando ele no Jordão
A sua lei exercendo,
Viu chegar um caminhante
Para o seu lado correndo,
O qual lhe disse:-Senhor,
O Lázaro esta morrendo.

Maria manda dizer
Que pela vossa virtude
Vá escondê-lo,pois lá
Não tem outro que lhe ajude,
Só o Senhor poderá
Restituir-lhe a saúde.

Jesus disse:-Essa doença
Não é para ele morrer.
É uma mudança que ele
Na vida tem que fazer,
Pra que o filho de Deus
Se glorifique em prazer.

Depois de ouvir tais palavras
O mensageiro voltou,
Mas quatro dias seguidos
No Jordão inda passou,
No decorrer destes dias,
Nosso Lázaro expirou

Na hora que ele morreu
Foi grande a calamidade
Madalena lamentava
Que causava piedade
Pelas circunvizinhanças
Do sitio até na cidade.

Choravam Marta e Maria
De causar horror e pena;
Boanerjes suspirava
Vendo a dolorosa cena,
Porém não tirava a vista
Do rosto de Madalena.

Os tormentos foram tantos
Como nunca houve assim
E o prelúdio das flautas
Redobrou até o fim.
Lázaro foi enterrado
Num sepulcro, no jardim.

Com quatro dias que
Lázaro tinha morrido,
Jesus chegou em Betânia,
Soube do acontecido,
Pois Marta contou-lhe tudo
Num pranto desensofrido.

Jesus disse:-Te consola
Que ele ressuscitará
Porque o que crê em mim
Aqui, não perecerá
Ainda tendo morrido
Novamente viverá.

Ao dizer isto seguiu
Para o lugar destinado,
Que Lázaro, há quatro dias
Havia sido enterrado,
Viu Madalena chorando
Pelo seu irmão amado.

Logo o sepulcro de Lázaro
Jesus olhou e foi vendo,
Mandou retirar a tampa,
Mas Marta chegou correndo
E disse:-Senhor,não abra
Que o corpo já está fedendo.

Jesus olhou para ela
Com os santos olhos seus
E disse:- Marta, confia
Nos santos poderes meus,
Pois todos que me acreditam
Verão a glória de Deus.

Más ninguém quis destampar
O tal sepulcro citado..
Jesus ajoelhou-se e disse
-Vinde meu pai adorado,
Pra que este povo saiba
Que por vós fui enviado.

E botou a mão na tampa
Do sepulcro nessa hora
E disse num som profético:
-Levanta Lázaro, agora!
Nisso, a tampa levantou-se
E Lázaro saiu fora.

Todo o povo admirou-se
Quando Lázaro ressurgiu,
Logo um perfume de flores
Todo o povo ali sentiu
Jesus com seus discípulos
Pra Jeruzalém seguiu.

Chegando em Jeruzalém
Hospedou-se numa aldeia
E na quinta-feira santa
Por volta das sete e meia
Da noite, deu aos discípulos
O pão da ultima ceia.

Depois da ceia, Jesus
Passou por densas palmeiras
De Sidom e dirigiu-se
Subindo longas ladeiras,
Às dez da noite, chegou
No monte das Oliveiras.

A essas horas, o vento
Soprava impetuoso,
A lua estava mostrando
Um semblante lacrimoso,
Como quem denunciava
Um momento doloroso.

Naquela noite tristonha
Jesus de face prostrada,
De quinta pra sexta-feira
Às duas da madrugada
No monte das Oliveiras,
Foi preso sem fazer nada.

Do monte, foi escoltado
Para a casa de Caifás,
As quatro Marias, vendo
Ele preso, foram atrás,
Juntas com Pedro e com João,
Com Tiago e outros mais.

Jesus foi interrogado
Perante a grande platéia
Depois disto, o conduziram
Para outra rica assembléia
De Pilatos, que era o grande
Governador da Judéia.

De Pilatos, ele teve
A ultima condenação,
Para morrer numa cruz,
No Monte Calvário, então,
Lugar que há séculos dormiam
Os ossos de Eva e Adão.

E foram buscar pra ele
Logo um madeiro pesado,
Na sexta-feira, às dez horas
Jesus havia chegado
No monte e às quinze horas
Foi na cruz crucificado.

Quando ele subiu à cruz
O sol empalideceu
E numa estrela brilhante
No firmamento, estendeu
Sua luz, até na hora
Que Jesus Cristo morreu.

Na hora que ele morreu
Pregado na grande cruz,
Passam atrás de agasalhos
Legiões de urubus,
Porque naquele momento,
Houve trevas, faltou luz.

E prolongados trovões
Em mil partes estrondaram,
A Terra mudou de cor,
Vários montes desabaram,
O véu do tempo rasgou-se
E os mortos ressuscitaram.

Maria, mãe de Jesus,
Chorava de causar pena,
Junto a Maria Cleofas,
A Suzana e Madalena,
Que não suportavam mais
Os dramas da triste cena.

José de Arimatéia
Botou seu corpo, afinal
Num sepulcro e no outro dia
O filho de Deus real
Subiu cercado de anjos
Para a corte divinal.

Mas ainda apresentou-se
A Maria Madalena
Em cima do seu sepulcro,
Na madrugada serena,
Então Maria contou
Aos discípulos, essa cena.

Depois disso,Madalena
Perdeu dos olhos azuis
O brilho, a cor, a beleza
E seguiu, levando a cruz,
Até o dia em que foi
Pra onde estava Jesus.

Quando chegou esse dia
A sua carne cansada
Entrou para a sepultura
Pela virgem acompanhada,
Que viu seus restos mortais
Até a última morada.

Assim a flor de Betânia
Ao seu sepulcro baixou,
Unida no pó da terra,
Nunca mais se levantou,
Seu espírito subiu,
A matéria aqui ficou.

A Santa Virgem, também
Atrás dela fez subida
Pra onde estava Jesus,
Ela ficou garantida,
Distante de imaginar
Nos aperreios da vida.

Boanerges, o poeta
E cantor da Galiléia,
Seguiu a lei de Jesus
Pregando em toda a Judéia
O ritmo do Evangelho,
Com força na santa idéia.

Depois que ele percorreu
As terras da Palestina,
Deixou a vida também
E subiu na tela fina,
A fim de ver Madalena
Na santa corte divina.

Aqui termino leitor,
Toda, historia bem traçada
Por minha acanhada pena,
Contando a cena passada
Da vida de Madalena,
Completa, sem faltar nada.

Betânia foi o lugar
Onde viveu Madalena,
Rodeada dos amantes,
Galante como verbena
E sempre foi perdoada
Sua horripilante cena.