19 dezembro 2014CENAS DO CAMINHO - Violante Pimentel
O CHAPÉU
Dona Francisca era uma senhora respeitável, decente, e uma dona de casa exemplar. Casada com um viúvo com quatro filhas e dois filhos pequenos, o casal teve mais dois filhos. Apesar de nunca haver passado necessidade, a mulher tinha mania de economizar. O marido tinha uma ótima situação financeira, era mão aberta e gostava de fartura. A mulher, ao contrário, era sovina, e tudo que fazia era pensando em economizar.
Dona Francisca guardava a caixa de fósforos no bolso do quimono, e era quem acendia o fogo; coava o café, e guardava o pó coado numa lata de leite vazia, para aproveitar no dia seguinte; usava a graxa grudada na panela em que torrava a carne, para fazer farofa; guardava cascas de queijo e de pão para dar de esmola. A sua mania de economizar parecia um problema patológico.
As roupas que ela mandava costurar para as enteadas eram maiores do que os padrões normais. Ela justificava, dizendo que elas estavam em crescimento, e, assim, as roupas não ficariam logo perdidas. Mas para as mocinhas isso era um sofrimento, pois , como pré-adolescentes, já eram vaidosas. Entretanto, nenhuma das quatro enteadas tinha coragem de protestar. A madrasta era austera e não admitia ser contrariada.
Em décadas passadas, fazia parte da indumentária feminina o uso de chapéu. As senhoras usavam chapéu quando iam a algum lugar especial.
Com sua mania de economizar, Dona Francisca vivia remontando tudo o que podia, e, por isso, resolveu remontar um antigo chapéu que há muito tempo deixara de usar. Para lhe dar aspecto de novo, a mulher enfeitou o chapéu com flores coloridas e um laçarote cor- de- rosa, muito chamativo e hilário. À noite, Dona Francisca se produziu para ir ao Cinema Nordeste com uma senhora amiga. Muito gorda e bonitona, a madrasta colocou o chapéu na cabeça e pediu a opinião de uma das enteadas:
- Lia, que tal o meu chapéu?
A adolescente, mesmo achando o chapéu horroroso, respondeu:
- Está formidável, Francisca…Você está linda!!!
De repente, chegou a amiga esperada e Dona Francisca repetiu a pergunta:
- Celícia, que tal o meu chapéu?
A amiga de Dona Francisca se encostou na parede, pôs a mão na boca e falou:
- Francisca, está horrível! Em nome de Jesus, tire esse chapéu!!! Se você for com ele, vai levar uma vaia…
Dona Francisca respondeu:
- Pois Lia disse que estava formidável!!! Tenha vergonha, Lia!!! Por que você não disse que estava feio?
Assustada, a enteada respondeu:
- Eu tive medo de dizer que estava feio…
O gênio de Dona Francisca era tão forte, que ela, mesmo assim, usou o ridículo chapéu para ir ao cinema…
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