sexta-feira, 18 de outubro de 2013

A POESIA DE PATATIVA DO ASSARÉ...

Patativa do Assaré (Mar/1909 – Jul/2002)
* * *
TRÊS MOÇA


(Paródia do poema “Fulô de Puxinanã” do 
renomado poeta Zé da Luz)

Três moça, três atração,
Três anjo andando na terra,
Eu vi lá no pé da serra
Numa noite de São João.

A premêra era a Benvinda
E eu juro pro Jesus Cristo
Como eu nunca tinha visto
Uma coisinha tão linda.

Benvinda, o premêro anjo
Tinha a voz harmoniosa
Como as corda sonorosa
Do bandulim dos arcanjo.

A segunda, a Felisbela,
Era um mundo de beleza,
Não sei como a Natureza
Acertou pra fazê ela.

Os óio era dois primô
Com tanta quilaridade
Como quem sente sodade
De um bem que nunca vortô

A terceira ,a Conceição,
Era a mais nova das três
Parecia santa Inês
Quando sai na procissão.

Nunca houve sobre a terra
E não pode havê ainda
Quem diga qual a mais linda
Das moça do pé da Serra.

Se arguém mandasse jurgá
E a mais bonita iscuiê
Eu ficava sem sabê,
Pois todas três era iguá.

Quando oiei pras três menina
Oiei tornei a oiá,
Eu fiquei a maginá
Nas coisa santa e divina.

E o que ninguém desejô
Desejei naquela hora
Sê o grande Rei da Gulora
O Divino Criadô.


Mode agarrá as três donzelas,
Invorvê num santo véu
E levá viva pro céu
Pra ninguém mexê com elas.


* * *

AS PROEZAS DE SABINA


Derne o Sú até o Norte
O mundo cria de tudo,
Cabra fraco e cabra forte,
Um alegre, outro sizudo.
Diz o professo Raimundo
Que este nosso veio mundo
De tudo pissui com sobra,
Coisa bela e coisa feia,
Home do geno de uvêia,
Muié do geno de cobra.

A vida não vale nada,
Tudo veve a peleja
E o mundo é uma charada

Custosa de decifra.
Mas, como quarqué sujeito
Qué tê razão e dereito,
Dá notiça e discrimina

As coisa deste universo,
Eu vou conta nestes verso
As proeza de Sabina.

Sabina é muié dereita,
Munta honestidade tem,
Não apoia nem aceita
Brincadêra com ninguém.
E dessas muié valente,
Atrevida e renitente,
Que, quando pega a falá,
Nem o Satanás resiste.
E ainda hoje ela insiste
Neste Brasi de Cabrá.

Ela nasceu num pranêta
Afobado e revortado,
Não se assombra com careta
Nem tem medo de barbado.
Pensando nesta senhora,
Vem logo em minha mimora
O que diz certo canto
Nos seus verso nordestino:
“Paraíba masculino,
Muié macho, sim sinhô!

Há munta gente hoje em dia
Que conhece bem Sabina,
Viu suas istripulia
No tempo que era minina,
Pois era munto sapeca,
Ispatifava as boneca
Que lhe davam de presente
E das colega de escola,
Rasgava livro e sacola:
Sabina não era gente.

Sua mãe munto bondosa,
Com razão lhe castigava,
Mas porém, ela raivosa,
Pelo chão isperneava.
Demenhãzinha bem cedo,
O seu premêro brinquedo
Era matratá os gato;
Era raivosa e atrevida.
Toda hora de comida,
Sabina quebrava um prato.

Ficou moça munto bela,
Era um anjo, era um tesôro,
Mas, nunca ninguém viu ela
Com histora de namoro.
Nunca foi apaxonada,
Foi sempre bem respeitada
Por todo povo dali.
Era moça munto sera,
Não gostava de pilera.
De mangofa e qui-qui-qui.

Tinha boa qualidade
Aquela linda menina
E os rapaz tinha vontade
De namora com Sabina,
Mas quando os óio piscava,
A moça se retirava
E não dava confiança.
Era sisuda e sagaz.

Por isso, muntos rapaz
Já tava sem esperança.
Havia um rapaz peitudo,
Por nome de João Pompeu.
Sabia daquilo tudo,
Porém nunca esmoreceu.
Era amoroso e vaidoso,
Desses rapaz corajoso,
Que pra casa não magina,
Infrentá quarqué derrota
E andava perdendo as bota
Pra se casá com Sabina.

João Pompeu sempre dizia:
Quem percisa é quem percura,
Até que êle, certo dia,
Pra cuiê uma madura
Foi uma verde botá.
E mesmo sem namorá,
Sua sorte resorveu.
Com Sabina se incrontando,
Foi logo lhe preguntando:
Você qué casa cum eu?

Ela uviu e foi dizendo:
Lhe dou a minha premessa,

Mas porém, fique sabendo:
Nós tem que casá depressa,
Pois você não continua
Na minha casa e na sua
Se virando em lançadêra.
Veja que o nosso noivado
Não é pra ficá guardado
Como carne em geladêra.

E cada quá o mais ligêro,
Foi resorvê o seu prano.
Era aquele desespero:
Compra pano e cose pano,
Um corria e otro corria.
Com menos de cinco dia,
Tava pronto os inxová
E o casamento se deu.
Sabina com João Pompeu
Se casou sem namorá.

Era um casá bem unido,

Valia a pena se vê.
Entre muié e marido
Não havia fuzuê.
Aquelas duas pessoa
Tinha uma vida tão boa
Que fazia inveja a tudo.
Os dois contente vivia,
Eles junto parecia
Duas alma num canudo.

Porém, o tá Luçufé
Nunca se aqueta nem drome,
Veve atentando as muié,
Mode brigá com os home.
Muntas vez, a gente vê
A paz, o gozo e o prazê
De duas pessoa unida,
Mas logo depois o Diabo
Vem bardiá com o rabo
As água do má da vida.

João Pompeu era querido,
Todos lhe tinha amizade.
Foi sempre bem recebido
Na boa sociedade.
Gostava de passeá
E umas bicadas tomá
Com as pessoa granfina
Mas tinha pôca demora:
Toda noite às nove hora
Tava perto de Sabina.

Onde os amigo chamava
João Pompeu aparecia.
Sabina não se importava,
Mas lhe disse, certo dia:
João, você nunca se esqueça,
Sempre cedo me apareça,
Pois você já me comprende,
Tome as suas cachacinha,
Mas não vá saí da linha,
Se não você se arrepende.

Este consêio eu lhe dou,
Pra você toma coidado,
Pois já conhece quem sou,
Não se casou inganado.
Oiça bem o que lhe digo,
Ande com os seus amigo,
Pode fazê o seu gasto
Nos botequim, por aí,
Mas nunca chegue aqui
Fazendo de um pé dois rastro.

Dizia ela zangada:
É bom tomá meu consêio.
João não lhe respondeu nada,
Mas ficou munto vremêio
Uvindo aquelas razão
E disse com seus botão:
O diabo desta muié
Tá fazendo eu fica ruim,
Hoje eu vou ao botequim
E vorto quando eu quisé.

Na noite do mêrmo dia,
João Pompeu foi para o bá,
Pois bebendo êle queria
De Sabina se vingá .
Não tava de brincadêra,
Se sentou numa cadêra
Calado e munto sisudo,
Com jeito de quem se vinga.
Uísque, cerveja e pinga,
Ele ia inrolando tudo.

A noite tava incelente
E a palestra ia crescendo
E João Pompeu rinitente
Sempre bebendo e dizendo:
Quando eu pra casa vortá,
Se a minha muié brigá
E me recebê com grito,
Mostrando seu geno mau,
Lhe mostro com quantos pau
A gente faz um cambito.

Inquanto aquele pateta
Xingava a sua muié,
Em casa Sabina, inquieta
Tava como cascavé
Na hora que perde o bote,
Já preparando o chicote
Pra no marido batê.
Ia dentro e vinha fora,
Pois já era nove hora
E João sem aparecê.

A Sabina ia à cozinha
E andava nos corredô,
Como franga de galinha
Caçando canto pra pô.
E já bem de madrugada,
Interrogava, zangada:
O que diabo aconteceu?
Como a onça da mão torta,
Roncava no pé da porta,
Esperando João Pompeu.

Naquela noite, o coitado
Tava capaz de reboque,
Vortou munto embriagado,
Cacundo como um badoque.
Não podia se aprumá,
Tremia pra lá e pra cá
Que nem pano de bandêra,
As perna vinha trocada
Como birro de amunfada
Nas mão da muié rendera.

Tava o pobre João Pompeu
Sem entrada e sem saída,
O seu corpo esmoreceu
Com o peso da bebida,
0 pobre cambaliava,

Não sabia onde pisava,
la inriba e vinha imbaxo.
Assim mêrmo entrou na sala
E disse, tremendo a fala:
Sabina, eu sou cabra macho.

Sabina agarrou o marido,
Sem dó e sem compaxão,
Deu um soco desmedido,
Bateu com ele no chão,
Incarcou o pé no cangote
E foi descendo o chicote:
Pegue! Pegue! Pegue! Pegue!
Pra conhecê quem sou eu.
Bateu tanto em João Pompeu,
Como se bate num jegue!

E depois de tê surrado,
Mode mostrá sua fama,
Saiu com o desgraçado,
Jogou inriba da cama
E ainda ficou raiando,
Pileriando e zombando,
Dizendo com ameaça:
Esta pisa extravagante
E pra você, de hoje em diante
Aprendê tomá cachaça.

Na tarde do mêrmo dia,
João inda tava deitado.
Se levantá não queria,
Pruquê tava incabulado.
Sabina vendo a demora,
Disse: se levante agora,
Pois você não tá doente,
Não quero marido assim,
Se levante, cabra ruim,
Banhe o rosto, escove os dente.

Choroso e desconfiado
Se levantou João Pompeu,
Com o corpo incalombado
Da surra que a muié deu.
Em silêncio e paciente,
Banhou rosto, escovou dente,
Como Sabina mandou.
Sua vergonha era tanta,
Que o pobre só quis a janta,
Porque Sabina obrigou.



Depois daquela questão,
João mudou a sua vida,
Não foi mais a diversão
Nem que sabê de bebida.
Na sua vida privada,
Pra não vê seus camarada,
Munta vez vai escondido.
E tão grande a sua mágua
Que quando qué bebê água
Não bebe em copo de vrido.

Ficou bastante inzemprado
E a diciprina foi tanta,
Qui mêrmo tando infadado,
Meia-noite se levanta
Pra inganá seus menino.
Ficou um marido fino,
Sabe em casa trabaiá.
Barre casa e faz café,
Pra êle virá muié
Só farta dá de mama.

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