segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

UM DUELO DE POETAS...

ZÉ IMEIRA, O POETA DO ABSURDO.

ENCONTRO DE PATATIVA DO ASSARÉ COM A ALMA DE ZÉ LIMEIRA

Certa vez andando sorrindo e contente
cantando repente pelo mundo afora
ouvi uma voz bonita e sonora
dizendo: demora que eu já vou na frente
o dente é a língua e a língua é o dente
o K é o J e o J é o K
gambá é raposa e raposa é gambá
Raimundo é Francisco e Francisco é Raimundo
o mundo é o céu e o céu é o mundo
nos dez de galope da beira mar

Patativa do Assaré

– Ô voz atrivida me digas quem é
que eu sou do Assaré o gigante afamado,
poeta famoso atende o meu brado
e você vem agora pra bater-me o pé,
no tema do verso não perdi a fé
meu barco de rima vive a navegar
porém me respondas não queiras negar,
pois já não agüento este teu insulto
ouço a tua voz e não vejo o teu vulto
nos dez de galope da beira do mar

Zé Limeira

– Sou o ispirito forte de José Limeira
Serra do Texêra foi meu naturá
foi lá que eu nasci eu nasci foi lá
com faca de pedra e machado de cera
quando eu bato na água levanta a poêra
que o fogo rebenta do lado de lá,
você não tá dando nem deu e nem dá
a tua façanha é quem te condena
eu hoje te pelo e não dêxo uma pena
nos dez de galope da bêra do má

Patativa do Assaré

– Cantador Limeira engula a saliva
que eu sou o Patativa o grande poeta
não quero fofoca nem quero indireta
sou ave liberta e não serei cativa
cantador valente me vendo se esquiva
porque não se atreve comigo cantar
ninguém faz discurso no meu patamá
eu mando e comando no grande Nordeste
sou bravo e sou forte sou cabra da peste
nos dez de galope da beira do mar

Zé Limeira

– Tá no mamêlero tá na jurubeba
te móio as pereba com água de soda
a tua cantiga muito me incomoda
vai criar juízo cantador jereba
teus pés de pato teus óio é de peba
remexa pra lá e remexa pra cá
e agüente os bizôro do meu mangangá
comigo é no duro é fogo é pimenta
Patativa véio você não me agüenta
nos dez de galope da bêra do má

Patativa do Assaré

– Eu tenho a conduta de cantador forte
canto por esporte e ganho a partida
deu tapa na morte e pontapé na vida
vou do norte ao sul e vou do sul ao norte
a minha bravura não há quem suporte
já domei pantera, leão e jaguar
com tua zuada não vou me calar
ainda que traga trovão e curisco
eu não terei medo nem correrá risco
nos dez de galope da beira do mar


Zé Limeira

– No lugá que eu canto véio não rismunga
não bota calunga nem bota buneco
teu açude eu rombo e teu rio eu seco
no lugá que eu chego sou dono e sou dunga
te rasgo a camisa teu shorte e teu sunga
e um banho de fogo eu mando te dá
te boto de chife do boi na misera
o que tá fartando você não intera
nos dez galope da bêra do má

Patativa do Assaré

– Colega Limeira eu também sou grande
meu verso se expande com muita franqueza
tanto no compasso como na beleza
não há quem me vença não há que me mande
por este universo onde quer que eu ande
a sereia canta me ouvindo cantar
porém este assunto nós vamos mudar,
a minha vontade digo e não oculto
colega Limeira me mostra o teu vulto
nos dez galope da beira do mar

Zé Limeira

– Patativa véio dêxe de bobage
tu não tem corage e nem é bom sabê
com tua moleza tu não pode vê
nem mesmo um fiapo da minha bagage
eu sou Zé Limeira grande personage
porém o meu vurto não vou te mostrá
pruque você vendo começa a chorá
dá-lhe um currulapo cai no chão tremendo
fica surdo e mudo e tremina morrendo
nos dez de galope da bêra do má

Patativa do Assaré

– Então Zé Limeira pra me dar prazer
queira esclarecer sobre a tua vinda
com teu verso belo e a tuada linda
no mundo dos vivos o que vens dizer
qual o motivo de me procurar
estou encantado com o teu cantar
ouço com respeito com prazer e calma
a primeira vez que escuto uma alma
nos dez galope da beira do mar

Zé Limeira

– Eu vinha contente mas fiquei sem plano
entrei pelo cano pruque vejo aqui
que para os poeta deste Cariri
qualquer um versinho é limeriano
eu vejo fulano, beltrano e sicrano
cubrindo o rascunho do meu B abá,
qualquer farofinha fedendo a gambá
escapa de pena e vai pra Seu Elóia,
não tô satisfeito com tanta pinóia
nos dez de galope da bêra do má

Patativa do Assaré

– Colega Limeira não tenhas rancor
vejo o teu valor e a fama crescer,
são eles alunos querem aprender
e todos te prezam como professor,
falou seu Elóia nosso locutor
que o limeiriano vai continuar
há muitos alunos que vão se formar,
é tudo alegria não veja chafurdo
na bonita escola do grande absurdo
nos dez galope da beira do mar

Zé Limeira

– Então Patativa lhe fico obrigado
mas dê meu recado pra cada poeta
que nunca se esqueça da rima correta
também no sentido precisa coidado,
o dado é o dia e o dia é o dado
nem mesmo uma virga não é pra faió,
avise os meninos pra quando rimá
faça como eu faço por favor não dêxe
iscama de rato e cabelo de pêxe
nos dez galope da bêra do má

Patativa do Assaré

– Parabéns Limeira porque compreende
que o valor se estende da famosa escola
cada professor trabalha e controla
e a nossa cultura cada vez mais rende,
você tudo sabe você tudo intende
porém este assunto nós vamos mudar
estou curioso para te escutar
com teus belos versos e as rimas suaves
mencionando alguns do nomes das aves
nos dez galope da beira do mar

Zé Limeira

– Patativa é besta que até causa dó
o gato, o mocó, raposa e macaco
punaré, catita, cutia e caçaco
lagaticha, briba, calango e privó
guachinim, tatu, peba e lapichó
somente a jibóia não quis impená
coberta de ispinho veve a se arrastá
eu sou um artista trabaio perfeito
mas no seu alejo não posso dá jeito
nos dez de galope da bêra do má

Patativa do Assaré

– A tua resposta eu achei excelente
sucessivamente tudo está mudado
o chefe dos chefes já foi afastado
o Brasil agora está bem diferente
nós temos agora novo presidente
saiu o Fernando entrou Itamar,
porém continua sem nada mudar
campeia a miséria que tudo consome
o rico roubando e o pobre com fome
nos dez de galope da beira do mar

Zé Limeira

– Eu também cunheço que o mundo é mudado
redondo é quadrado e saúde é doença
a prensa é da massa e a massa é da prensa
pecado é virtude e virtude é pecado
o colado é colo e o colo é colado
a Dindá é Dinda e a Dinda é Dindá
faz trinta semana que eu passei por lá
cavei no lajeiro e arranquei batata
com lôra morena criôla e mulata
nos dez galope da bêra do má

Patativa do Assaré

– Nós estamos dentro de um caos de miséria
é tudo pilhéria e semente do mal
cresceu a malícia e morreu a moral
se envolveram todos na baixa matéria,
a crise presente é séria bem séria
vem plano e mais plano e sem plano acertar
do campo a cidade da pista ao asfalto
reina a violência o roubo e o assalto
nos dez galope da beira do mar

Zé Limeira

– Lá no outro mundo também tem chamêgo
tem branco e tem negro tem mulato e lôro
tem cabra safado caçando namoro
chorando e gritando sem achar sucêgo,
ninguém muda o nome só muda de emprego,
Camônge é vaquêro nas terras de lá,
Malobá é tôro tôro é Malobá
derruba no mato e não fica ferido
e ele corre é nu, não corre vestido
nos dez galope da bêra do má

Patativa do Assaré

– Já vivo cansado da primeira vida
minha despedida não custará mais,
da minha velhice eu tenho os sinais,
meu cabelo branco e a pele encolhida
já vivo cansado da penosa lida,
já vivo cansado de tanto lutar
preciso de um canto para repousar
irei brevemente para a Santa Glória
e aqui neste mundo fica a minha história
nos dez galope da beira do mar

Zé Limeira

– A segunda vida tem a mesma sorte
tem furada e corte tem corte e tem furada
tem carro navio canoa e jangada
tem norte e tem sul e tem sul e tem norte
tem muié que reza e pede boa sorte
pra PC Faria que veve por cá
cumendo de esmola num triste pená
sentado na praia pescando de anzó
e levando dinhêro para o seu paió
nos dez galope da bêra do má

Patativa do Assaré

– Colega Limeira onde você vai
a todos atrais com o seu trocadilho
diz que o filho é pai e diz que o pai é filho
quem sai é quem entra e quem entra é quem sai
quem cai é quem tomba e que tomba é quem cai
a tua cadência eu sei bem julgar,
porém a peleja vamos terminar
aquilo que eu penso você também pensa
nesta sua escola não há quem lhe vença
nos dez de galope da beira do mar

Zé Limeira

– Gosto de zuada e gosto de fuxico
calado não fico não guardo silêncio
amarro dinheiro na ponta do lenço
e arrocho o barbante na ponta do bico
eu não cantei nada só fiz o prefico
mas já tá na hora de me retirá
mas porém eu vorto para te lascá
te dá outro arrocho te dá outro grito
fazer Patativa virá um musquito
nos dez de galope da bêra do má

Patativa do Assaré

– Voltou Zé Limeira da longa viagem
não me deu bagagem são elas por elas
as nossas bitolas e nossas tabelas
ambas mereceram a mesma mensagem
já estou bem velho mas tenho coragem
no lugar que eu chego valentão arriba
a minha companhia não há quem proíba
aumentei as cores da minha bandeira
cantei com a alma de Zé Limeira
poeta lendário lá da Paraíba.

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