sábado, 8 de dezembro de 2012

LITERATURA DE CORDEL...


* * *
Adauto Ferreira Lima
Quando o sujeito envelhece
Quase tudo lhe embaraça
Convida a mulher pra cama
Agarra, beija e abraça
Porém só faz duas coisas:
Soltar peido e achar graça.
Louro Branco
Antigamente eu fazia
Oito meninos brincando
Agora eu só faço um
Se for de barro amassando,
Com um pedreiro do lado
E seis servente ajudando.
* * *
Cego Clemente
Colega não vá brigar
Por causa de uma truaca;
Você vai bater num mole
E o mole dana-lhe a faca;
Quem mata se solta logo,
Quem morre toma na jaca.
* * *
Zito Siqueira
Mulher, se lembre das juras
Que fizemos na matriz;
Se esqueça de advogado,
De promotor e juiz;
Se acostume a levar ponta
Pra gente viver feliz.
* * *
Manoel Xudu
Eu acho muito engraçado
O padre Matuzalém
Quando distribui a hóstia
É pra dez, cinquenta ou cem
Mas bebe o vinho sozinho
Não dá um gole a ninguém!
* * *
José Alves Sobrinho
Eu também fui cantador
Repentista e violeiro,
Todo o norte brasileiro
Inda lembra, sim senhor,
O meu nome, o meu valor,
A minha voz estridente,
Porém, repentinamente,
A mão do destino atroz
Arrebatou minha voz.
Deixei de cantar repente
Eu era um uirapuru
Na voz e na melodia
Mas sem esperar, um dia
Fiquei qual urubu:
Sem voz, sem som, nu e cru,
Fui forçado a abandonar
A profissão popular
De cantar para viver!
Como é triste não poder
Cantar, sabendo cantar.
* * *
Severino Feitosa
Desta luta terá um vencedor
Que eu já posso contar com a vitória
Quem conhece meu verso e minha historia
Sabe o tanto que tenho de valor
Obedeça ao seu mestre por favor
Se comporte direito em minha escola
No gramado do verso eu sou cartola
Dominando quem entra no gramado
No Brasil meu nome é respeitado
O maior repentista da viola.
Valdir Teles
Nesse time de craques da viola
Tem Diniz, Ivanildo e Oliveira
Fenelon, Moacir, Louro e Ferreira
Zé Cardoso, Geraldo, Heleno e Lola
Mais você não é craque nem cartola
Pra ficar no comando e nem jogar
Vou mandar para o banco se sentar
Se faltar um reserva eu lhe aproveito
Mas você vai morrer sem ter direito
De vestir a camisa titular.
* * *
Geraldo Amâncio
Entre os Dez Mandamentos dos sermões,
Respeitar pai e mãe é o primeiro,
O defeito de um filho é ser grosseiro;
A virtude dos pais é serem bons.
Todo filho tem três obrigações:
Escutar, respeitar e obedecer;
Respeitar pai e mãe é um dever;
Esquecer mãe e pai é grosseria,
Se não fossem meus pais, eu não teria
O direito sagrado de viver.
* * *
Merlânio Maia
Nasci no Sertão me criei sertanejo
Foi Itaporanga o meu berço querido,
Sou paraibano, meu canto é sentido,
Igual o que sinto, o que ouço, o que vejo,
Nordestinidade é o canto que festejo
Deixando a viola me hipnotizar
Seu canto de encanto fez-me apaixonar
De lá até hoje meu verso é um emblema
Levando o Nordeste dentro de um poema
Trazendo o Sertão para a beira do mar!
Repente, embolada, desafio, poesia,
Os cocos de roda, mazurca e baião,
Forró pé de serra com xote e rojão,
Aboio dolente, ou viola vadia,
Cordel declamado de noite e de dia
Foi a educação do meu pré-escolar
O banco da escola foi pra completar
Pois tudo que eu tenho a poesia me deu
De verso em cascata o meu peito se encheu
Cantando galope na beira do mar!
Por todo o Nordeste cantei com amor
Em Shows, em Congresso e até Cantoria,
As crenças diversas ouviram a poesia
Que trago na alma e derramo aonde for
Inflama-me o peito como o do Condor
Com a força que o verso nasceu pra levar
Com a rima e com a métrica peculiar
Do som tão precioso nascido do povo
Que remoça o velho e dá juízo ao novo
Cantando galope na beira do mar!
* * *
Idalzira Bezerra
Eu rimo quando estou triste
Para as mágoas espantar
Rimo quando tenho saudades
Pois é muito feio chorar
Rimo quando estou contente
Rimo quando estou ausente
Querendo te abraçar.
* * *
Dedé Monteiro
Quem não quer ficar velho é infeliz
Perde a calma de tudo e não sossega:
Passa o tempo no espelho atrás de prega
Pra depois dar serviço aos bisturis…
Quem remói a idade mas não diz,
Fica velho por dentro sem querer
Tenha fé, deixe a ruga aparecer,
Não se lance de encontro à natureza
Pra findar a viagem sem tristeza,
É preciso saber envelhecer.
* * *
Um folheto de Silas Silva
O SERTÃO NORDESTINO NUM ATRASO SECULAR
Veja o que deu o jornal
Aumentando o desengano
Não chove mais este ano
Em nenhuma zona rural
Dentro da previsão astral
Nem uma nuvem escura
Virá à terra a procura
Trazendo raio nem trovoada
A natureza tá reprovada
Sem água pra a agricultura.
Mediante as previsões
O homem vive em pranto
No Nordeste em todo canto
Já são grandes as aflições
Neste pelejar das nações
Esperando água tão pura
Rezando e fazendo jura
Implorando uma invernada
A natureza tá reprovada
Sem água para agricultura.
É um hospital sem paciente
É um peixe sem ter escama
É um ídolo sem ter fama
É uma arcada sem ter dente
É um rio sem ter corrente
É uma doença sem ter cura
É um sábio sem ter calçada
A natureza tá reprovada
Sem água para agricultura.
É um campo sem ter trave
É uma igreja sem ter sino
É um ambulante sem destino
É uma floresta sem ter ave
É um cadeado sem ter chave
É uma compra sem fatura
É um preso sem ter soltura
É uma tarrafa toda rasgada
A natureza tá reprovada
Sem água para agricultura.
É um casamento sem união
É uma cidade fora do mapa
É uma briga sem ter tapa
É uma padaria sem ter pão
É uma feira sem ter feijão
É u herói sem armadura
É um álbum sem ter figura
É uma arma descarregada
A natureza tá reprovada
Sem água para agricultura.
No sertão pernambucano
Estão tomando sopa de palma
Os políticos pedindo calma
Nesse antigo falso plano
O povo entra pelo cano
E nesta guerra de perjúria
Se acaba na desventura
Como se perde uma boiada
A natureza tá reprovada
Sem água para agricultura
A Paraíba pede socorro
Diz: Aqui não é diferente
Falta chuva, falta semente
Com fome eu sei que morro
Antes o mundo percorro
Viver aqui é uma aventura
Como a seca sem estrutura
Nesta região tão castigada
A natureza tá reprovada
Sem água para agricultura.
Com tanto poço perfurado
De grandiosa profundidade
Será no futuro de verdade
Um terrível campo minado
Entre cidade e serrado
Abalando toda estrutura
Além da perigosa fundura
Que fica na terra cavada
A natureza tá reprovada
Sem água para agricultura.
Padecerá a humanidade
Segundo o Apocalipse
Vira temores, praga e eclipse
Guerra, fome e tempestade
Digo, leitores, com brevidade
Na condição de criatura
O começo dessa amargura
Já aparece bem retratada
A natureza tá reprovada
Sem água para agricultura.
Chovendo sem preparação
O tempo fica desentendido
Até São José desprevenido
Sem resposta e sem devoção
Nos causando muita emoção
Lembrando a geração futura
Ter um santo de bravura
Com tanta promessa atrasada
A natureza tá reprovada
Sem água para agricultura
Ao Pedro dormiu demais
Vacilou e perdeu a chave
Agora só cai chuva suave
Matando lavoura e animais
Entre tantos outros mais
Vivendo a mesma loucura
Morte á fome se mistura
Nesta terra toda rachada
A natureza tá reprovada
Sem água para agricultura.
É um tempo ruim e ardoso
Pra quem tira da terra sustento
Neste processo longo e lento
O homem fica sem repouso
Em busca do líquido precioso
Almejando nuvem escura
Para garantir nossa fartura
A chuva precisa ser pesada
A natureza tá reprovada
Sem água para agricultura
No sertão tendo inverno
O verde logo se infesta
E a terá promove a festa
Afirmando o poder eterno
Em forma de ato fraterno
Neste quadro coloca moldura
Na paisagem toda a verdura
Pra ocultar década passada
A natureza tá reprovada
Sem água para agricultura
O São Francisco é produto
Na indústria seca devorosa
Com a transposição demorosa
E todo o inverno oculto
Não haverá ramagem nem fruto
E nesta alta temperatura
Vê-se açude de boa espessura
Com pouca água acumulada
A natureza tá reprovada
Sem água para agricultura.
É uma quizila sem despacho
É um cabaré sem rapariga
É u ringue sem ter briga
É um governo sem ter macho
É uma região sem ter riacho
É uma tumba sem sepultura
É um rico sem cobertura
É uma promessa renegada
A natureza tá reprovada
Sem água para agricultura
É um cabra sem ser da peste
É uma porta sem ter trinco
É uma orelha sem ter brinco
É um cowboy sem faroeste
É um concurso sem ter teste
É uma pedra sem ser dura
É uma cratera sem largura
É uma terra abandonada
A natureza tá reprovada
Sem água para agricultura
É um diamante sem brilho
É um filme sem ter artista
É uma praia sem ter surfista
É um revolver sem gatilho
É um sabugo sem ter milho
É um almoço sem ter mistura
É uma prótese sem dentadura
É um conto sem ter fada
A natureza tá reprovada
Sem água para agricultura
O clima continua variável
Desafiando toda ciência
Que estuda do raio potência
E a falta de água potável
Nesse mundo tão deplorável
Celebrando total desventura
Nesta légua tirana escura
Inclusive com alma tombada
A natureza tá reprovada
Sem água para agricultura
O rio que corre na região
Nas bacias hidrográficas
Sem as forças hidráulicas
Com pouca água sem pressão
Dificulta toda irrigação
Porque o relevo tem altura
Com afluentes sem fundura
Fica a vegetação atrasada
A natureza tá reprovada
Sem água para agricultura
O Nordeste está perdido
Mesmo com tanta prece
A chuva não acontece
O inverno foi suspendido
Deixando o peito ferido
Que viu tanta nuvem escura
Arco-íris dando cobertura
Impedindo a água jorrada
A natureza tá reprovada
Sem água para agricultura
É um furacão sem ter vento
É um comício sem palanque
É uma guerra sem ter tanque
É uma música sem instrumento
É um parto sem sofrimento
É um prédio sem ter altura
É um segredo sem ter jura
É uma casa sem ter fachada
A natureza tá reprovada
Sem água para agricultura
 
É uma lagoa sem ter sapo
É uma sinuca sem tabela
É uma novena sem ter vela
É um camelô sem ter papo
É um tecido sem ter fiapo
É um curso sem formatura
É um professor sem leitura
É uma conta toda errada
A natureza tá reprovada
Sem água para agricultura
É um inferno sem ter cão
É um pião sem ter ponteira
É um país sem ter bandeira
É um trem sem ter vagão
É um jogo sem ter confusão
É um livro sem ter brochura
É uma cova sem abertura
É uma bitola descontrolada
A natureza tá reprovada
Sem água para agricultura.

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