terça-feira, 8 de setembro de 2015

A POESIA DE ZÉ LIMEIRA...



Zé Limeira (Teixeira, 1886 — 1954) foi o cordelista/repentista mais mitológico do Brasil. Era conhecido como Poeta do Absurdo. Nasceu no sitio Tauá, em Teixeira, cidade da Paraíba que foi o principal reduto de repentistas no século XIX.

Os temas que abordava em suas poesias e repentes eram variados e chegavam, muitas vezes, ao delírio. Pornografia era um tema recorrente, mas Zé Limeira ficou conhecido como "Poeta do Absurdo" por suas distorções históricas, poesias recheadas de surrealismo e nonsense, e pelos neologismos esdrúxulos que criava.

Vestia-se de forma berrante, com enormes óculos escuros e anéis em todos os dedos, e saía pelos caminhos de sua vida, cantando e versando.


Encontrados 3 pensamentos de Zé Limeira

Foi quando Tomé de Souza / Desembarcou na Bahia / Logo no primeiro dia / Passou o pau na esposa / Ligeiro que nem raposa / Comeu na frente e atrás / Depois, na beira do cais / Por onde os navio trafega / Comeu o Padre Nóbrega / Que os anos não trazem mais.

Eu me chamo Zé Limeira
De Lima, limão, limança
A estrada de São Bento
Bezerro de vaca mansa
Valha-me Nossa Senhora
Tão bombardeando a França!



Eu só gosto dessa moça
Porque tem vegetação
Porteira de pau a pique
Três pneus de caminhão
Peido de jumenta ruça
E haja chuva no sertão.





Cantando com Serra Branca

Serra Branca

Limeira meu negro velho,
você está em perigo:
um homem de sua idade,
quando vem cantar comigo,
só corta por onde eu risco,
só engole o que eu mastigo.

Zé Limeira

Você cantando comigo,
o sacrifício é maior:
porque não canta improviso
nem sabe nada de cor,
quanto mais você se apura,
mais eu lhe acho pior.

* * *

Cantando com Anastácio o mote:

Vou fazer serenata na calçada
Da menina que amei na minha vida.

Anastácio

Venho amando do tempo da infância
Uma linda menina que ainda prezo,
Inda quase maluco eu não desprezo
Sua imagem e a sua rutilância.
Desprezá-la seria ignorância.
Minha deusa bonita e preferida
Que por Deus para mim foi escolhida,
Minha estrela brilhante e consagrada…
Vou fazer serenata na calçada
Da menina que amei na minha vida.

Zé Limeira

Prá fazê serenata eu sou bambão,
Toco em frente, de banda, quina e lado.
Na viola eu até toco um bocado,
Sou ribombo e zuada de truvão.
Muitas vezes eu decanto uma canção
Lá no açude de Santa Margarida.
Eu me lasco mais faço uma ferida
No toitiço da velha madrugada…
Vou fazer serenata na calçada
Da menina que amei na minha vida.

Quando a guerra zuou dentro da França
Eu ouvi os estrondo do sertão.
Gosto muito de fava e de feijão,
A muié que eu quiri tinha uma trança.
Japonês e alemão entrou na dança,
As estrada do Brejo é tão comprida
É pecado matá vaca parida,
A Alemanha da China tá tomada…
Vou fazer serenata na calçada
Da menina que amei na minha vida.


* * *

Cantando com José Alves Sobrinho o mote

VOCÊ HOJE ME PAGA O QUE TEM FEITO
COM OS POETAS MAIS FRACOS DO QUE EU.

José Alves Sobrinho

Vou lhe avisar agora Zé Limeira
Dizem que quem avisa amigo é
Vou lhe amarrar agora a mão e o pé
E lhe atirar naquela capoeira
Pra você não dizer tanta besteira
Nesta noite em que Deus nos acolheu
Você hoje se esquece que nasceu
E se lembra que eu sou bom e perfeito
Você hoje me paga o que tem feito
Com os poetas mais fracos do que eu.

Zé Limeira

Mais de trinta da sua qualistria
Não me faz eu correr nem ter sobrosso
Eu agarro a tacaca no pescoço
E carrego pra minha freguesia
Viva João, viva Zé, viva Maria
Viva a lua que o rato não lambeu
Viva o rato que a lua não roeu
Zé Limeira só canta desse jeito
Você hoje me paga o que tem feito
Com os poetas mais fracos do que eu.

* * *

Cantando com Anastácio Mendes Dantas o mote:

Viva a moça mais bonita

Anastácio Mendes Dantas

Amigos, no meu sertão
É onde existe menina
Mais bela que a bonina
Do jardim do coração,
Nas festas da apartação,
Quando o vaqueiro se agita.
Derruba o boi e faz fita
Por causa duma donzela
E grita, olhando pra ela:
Viva a moça mais bonita.

Zé Limeira

Já namorei uma Rosa
Que era nega cangaceira,
Gostava de fazê feira,
Tinha uma boca mimosa
Mais, por modo dessa prosa,
Escrevi pra Santa Rita…
Ronca o pombo na guarita,
Passa um poico no chiqueiro,
Diz o bode do terreiro:
Viva a moça mais bonita.

* * *

Cantando com Anastácio Mendes Dantas nos Oito Pés a Quadrão

Anastácio Mendes Dantas

Eu sou um cantador novo
Que agrada bem ao povo.
Com saudades me comovo,
Sinto mesmo uma aflição.
A flor que rola no chão
Deixa o aroma somente,
Na hora do sol poente,
Lá vão meus oito a quadrão.

Zé Limeira

Tu sois protestante e crente,
Água, riacho e vertente,
Quando a chuva desce quente
Enrolada num trovão,
Se alarma todo sertão,
Cururu desce nos eito,
Eu vou falá com o prefeito
No oito pés a quadrão.

Anastácio Mendes Dantas

A natureza é incrível,
Faz a terra no seu nível
Girar de modo impossível
Causando admiração…
O relâmpago, o trovão,
Arquivam-se pelo espaço,
Ligados pelo mormaço,
Lá vão meus oito a quadrão.

Zé Limeira

Sou um nego do cangaço,
Brigo de perna e de braço,
Com a ingrizia que eu faço
Assombro qualquer cristão…
Eu vou cantá no Japão
Lá dos Estados Unidos,
Dá quarenta e três gemidos
Nos oito pés a quadrão.

* * *

Cantando com José Vicente o mote:

São frios, são glaciais,
os ventos da solidão.

José Vicente

Quando se sente saudade
Duma pessoa querida,
Dá-se um vazio na vida
E dói esta soledade…
Ninguém suporta a metade
Da dor do meu coração,
Lembrando o aceno de mão
Do amor que não voltou mais…
São frios, são glaciais.
Os ventos da solidão.

Zé Limeira

Conheço a curva do vento
No calô da marizia,
Quando amanheceu o dia
Fui acordá o jumento.
O mocotó de São Bento,
Espora, freio e gibão…
Por trás do Monte Simão
Residia Ferrabraz…
São frios, são glaciais
Os ventos da solidão



O Apocalipse de Zé Limeira
Zé Ramalho
Composição: Zé Ramalho
Quem acha que é preciso
O mundo se acabar
Pra ver o povo virar
Teleco-teco na terra
Buliram na atmosfera
Desse sistema solar

Eu vejo que é muito frágil
Pitomba presa num galho
De aroeira parida
Humanidade fundida
No forno quente de belzebu

Eu vejo o apocali - psicologia profunda
De que um dia virá
Um astronauta para me salvar

Pressinto nuvens escuras
Enferrujando armaduras
Um terremoto lumar
O anjo da virgindade
Fará de toda maldade
Um cogumelo solar

Um amuleto divino
No braço do pequenino
Escapulário de luz
Explorador da bondade
Está em cada cidade
Até no brejo da cruz

Eu vejo no apocali - psicologia profunda
De que um dia virá
Um astronauta para me salvar

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