quinta-feira, 14 de novembro de 2013

LITERATURA DE CORDEL...

O RAPAZ QUE NAMOROU UM TRAVESTI
Leitor, vou narrar um caso
que de fato aconteceu
com um nosso conhecido,
aliás, vizinho meu,
o qual gostou de uma jovem
que outro dia conheceu.
Como se sabe, o amor
deixa o homem meio cego,
levando ele a pisar
até em ponta de prego,
pois a paixão o emburrece
e altera seu próprio ego.
O tal a quem me refiro
era pessoa normal,
vivia tranquilamente
junto com seu pessoal,
preocupação nenhuma
perturbava seu astral.
Na verdade, era um sujeito
macho até prova em contrário
que acabou sendo motivo
de ironia e comentário
quando um dia apaixonou-se
e deu uma de otário.
Desprovido de malícia,
a ninguém nunca fez mal.
Cumpridor dos seus deveres,
sempre muito cordial,
o seu único ponto fraco
era a cachaça, afinal.
Quando ele estava “bicado”
espantava muita gente
com a mania que tinha
de se tornar eloquente,
mas engrolava as palavras
e bodejava somente.
Completara vinte anos,
estava na flor da idade.
Tinha seus sonhos de jovem,
muita força de vontade,
porém pra namorar tinha
alguma dificuldade.
Quando não bebia nada
sua conversa era pouca.
Raramente uma palavra
se ouvia da sua boca.
Talvez porque receasse
ser apanhado “de touca”.
Mas um dia ele encontrou
uma moça interessante
com a brancura da lua,
de beleza estonteante…
Por ela foi atraído
logo no primeiro instante.
Ela também, prontamente,
sentiu por ele atração.
O namoro teve início
já naquela ocasião
e em pouco se transformou
na mais ardente paixão.
Era bonito de ver
o casal de apaixonados,
pois se via em toda parte
aqueles dois abraçados,
alimentando ilusões
e lindos sonhos dourados.
Entre beijos e abraços,
o romance prosseguia.
A vida dos dois pombinhos
era um mar de harmonia.
Mas a onda às vezes muda
e acaba a calmaria.
Um amor que começou
tão repleto de esperança,
de um momento para outro
foi gerando insegurança
e envolvendo o rapaz
num véu de desconfiança.
Apesar de eles se amarem,
a moça, em vários momentos,
esquivava-se do moço
com falsos recatamentos,
reprimindo no seu íntimo
naturais assanhamentos.
Eles não se conheciam
desde a época da infância.
Ela era de outra cidade
e isto aumentava a ânsia
de estarem sempre juntos
ou se verem com constância.
Cada dia que passava,
mais o jovem tinha arroubo.
Como todo enamorado,
vivia em constante afobo,
porém aos olhos do povo
fazia papel de bobo.
Pois só ele não sabia
o quanto estava enganado.
Aquela bonita moça
por quem vivia encantado,
na verdade era um marmanjo
de madame disfarçado.
Era, enfim, um travesti
por mocinha se passando…
E o besta, apaixonado,
cada vez mais navegando
naquele barco furado,
numa ilusão naufragando.
Afinal, um dia, alguém
sempre deixa a guarda aberta,
justamente quando um corpo
outro corpo em ânsia aperta.
Só então aconteceu
a infeliz descoberta.
Quando o rapaz encostou
seu corpo no da “amada”,
notou logo que com “ela”
tinha alguma coisa errada:
sentiu algo diferente
na parte mais cobiçada.
Por fim quis passar a limpo
aquele achado esquisito,
mas percebeu na “garota”
um desespero inaudito.
E desistiu do intento,
apesar de muito aflito.
Depois, finalmente, tudo
ficou bem esclarecido,
pois aquela criatura
com quem estava envolvido,
não passava de outro jovem
em “mocinha” travestido.
O rapaz viu-se tomado
de grande decepção.
Aquilo feriu bem fundo
seu ingênuo coração,
e, além de tudo, serviu
de pilhéria e gozação.
Numa indecisão terrível,
não sabia o que fazer.
Era grande o seu desgosto,
preferia até morrer…
E, para afogar a mágoa,
vingou-se só em beber.
Mas a paixão que nutria
por aquele traidor
ia além das suas forças,
estava louco de amor.
Transformou-se então num ébrio
infeliz e sofredor.
E o pior é que a danada,
isto é, o outro rapaz,
também era apaixonado.
Ambos sofriam demais!
E, num sofrimento atroz,
nenhum dos dois tinha paz.
Porém tudo que começa
tem que um dia terminar.
O amor deles, portanto,
não podia prosperar…
Afinal, chegou ao fim
aquele caso invulgar.
Hoje, o rapaz iludido
amarga seus desencantos,
cabisbaixo, entristecido,
o rosto lavado em prantos,
triste vítima de um engodo,
atirado pelos cantos.
A todos enamorados
uma recomendação:
vale a pena ter cuidado,
prestar bastante atenção,
antes de a quem quer que seja
entregar o coração.
Aqui finda a narração
de um fato acontecido
com alguém que, perdidamente,
amou um ser travestido
de mulher – bancando o bobo -
e findou desiludido.

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