O DEFEITO
José Bento era um fazendeiro muito rico, de uma cidade do interior. Era grosseiro com as pessoas pobres, e com elas evitava aproximação. Temia que lhe pedissem ajuda ou dinheiro emprestado. Dava adeus com a mão fechada, de tão mesquinho que era. Não tinha pena de ninguém e era considerado um homem perverso. Entretanto, era muito querido pelas pessoas ricas da cidade, a quem sabia agradar com presentes caros e produtos da sua fazenda.
Apesar de muito austero e mesquinho, o fazendeiro não gostava de mentiras ou falcatruas. Ajudava sempre aos políticos nas respectivas campanhas eleitorais, e por isso era muito respeitado.
Certo dia, José Bento foi procurado por um forasteiro, que lhe queria vender um cavalo de boa raça, por um preço razoável. Dizia que morava no Estado da Paraíba, e que estava precisando de dinheiro para pagar o tratamento da esposa, que se encontrava gravemente enferma.
O fazendeiro examinou o cavalo, gostou, e indagou ao forasteiro se o animal era sadio e vacinado. O homem respondeu que sim, e o negócio foi realizado. O fazendeiro pagou a importância pedida, e o forasteiro seguiu para o centro da cidade.
Algumas horas depois, o capataz da fazenda descobriu que o cavalo tinha um olho cego. Aí o bicho pegou…
O fazendeiro mandou localizar o forasteiro, com um recado para que ele voltasse à sua fazenda imediatamente. O capataz cumpriu a ordem, e trouxe o vendedor do cavalo até o dono da fazenda, que o recebeu com quatro pedras na mão. Com o olhar cheio de ódio, o rico fazendeiro dirigiu-se ao forasteiro, agarrando-o pelo colarinho da camisa. Chamou-o de ladrão, pois lhe vendera um cavalo cego de um olho, escondendo dele esse grave defeito. Disse-lhe que queria o dinheiro de volta, imediatamente, pois o negócio estava desfeito. Fez ameaças de mandar prendê-lo, caso ele não quisesse desfazer a venda.
O vendedor, que tinha esse cavalo como animal de estimação, empalideceu, ouvindo as palavras do fazendeiro, e, com a voz trêmula, tentou se defender, gaguejando algumas palavras:
- Meu patrão, eu lhe garanti que o cavalo não tinha qualquer defeito, e não tem mesmo não. O cavalo é sadio e ligeiro. É um animal bonito e forte. O que ele tem não é defeito. Ele é normal. Ser cego de um olho, não é ter defeito. Isso é uma infelicidade, que pode atingir qualquer pessoa, quanto mais um animal!…
O fazendeiro procurou controlar sua ira, no momento em que lhe veio à mente a imagem do seu pai, que cegara muito tempo antes de morrer. E o coração do austero fazendeiro fraquejou… Sua ira desapareceu, e ele permaneceu pensativo por alguns instantes.
Nessas alturas, o forasteiro já se preparava para devolver o dinheiro e levar o cavalo de volta.
Para sua surpresa, quase sem acreditar, ouviu o fazendeiro falar pausadamente, e com os olhos cheios de lágrimas:
- Você disse que quer vender o cavalo, para pagar o tratamento de sua esposa, que se encontra gravemente doente… Está bem… vou ficar com o cavalo. Vá em paz, amigo!
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