Ricardo Setti
Dirceu e Fux: acusador e acusado
É certamente grave, gravíssima a acusação feita pelo ex-ministro-chefe da Casa Civil e ex-deputado José Dirceu segundo a qual teve encontro com o ministro Luiz Fux durante a fase em que este realizava contatos para realizar seu “sonho” de chegar ao Supremo Tribunal Federal e que, no curso da reunião, Fux prometeu absolve-lo no caso do mensalão, caso fosse designado para a corte.
Dirceu fez a acusação em entrevista aos jornalistas Fernando Rodrigues e Monica Bergamo, da Folha de S. Paulo, publicada também no portal UOL.
A própria Folha, porém, lembrou que em dezembro do ano passado – espontaneamente -, Fux admitiu, durante em entrevista, que efetivamente se encontrara com Dirceu, mas negou ter prometido a absolvição. Disse também que, mais tarde, ao ler o processo do mensalão, ficou “estarrecido”.
O problema da acusação de Dirceu é que ela está cheia de interrogações soltas, sem respostas.
Primeira interrogação sem resposta: onde estão as provas?
O chefe da quadrilha do mensalão diz ter sofrido durante meses “assédio” do ministro Fux (então integrante do Superior Tribunal de Justiça) “através de terceiros, que eu não vou nominar”. E que o encontro em que Fux teria prometido a absolvição se deu depois desse “assédio”, quando Dirceu concordou em recebê-lo, mas foi a sós.
Segunda interrogação: por que não identifica quem são esses “terceiros”?
Dirceu conferiria solidez a uma acusação, que caso contrário se tornará leviana, irresponsável e até passível de processo, se trouxesse à público esses “terceiros”, que seriam advogados.
Terceira interrogação: Fux, afinal, teria prometido a suposta absolvição ao próprio Dirceu ou aos misteriosos “terceiros”?
Dirceu se contradiz ao longo da entrevista. Na primeira parte, diz, sobre o encontro: “Eu o recebi e, sem eu perguntar nada… (…) Ele tomou a iniciativa de dizer que ia me absolver. Textualmente”.
Mais adiante, porém, respondendo a outra pergunta dos repórteres, diz o seguinte: “Ele, de livre e espontânea vontade, se comprometeu com terceiros, por ter reconhecimento do processo, por ter convicção, certo?”
Afinal, a quem o ministro teria prometido?
Quarta interrogação: por que Dirceu não levantou esse problema DURANTE O JULGAMENTO?
Por que Dirceu só agora, na fase final do processo, em que cabem recursos que dificilmente reverterão a decisão do Supremo de condená-lo a 10 anos e 10 meses de cadeia, trouxe a público a denúncia?
Não faria muito mais sentido que trouxesse logo no começo do julgamento? A enorme barulheira que as declarações causariam poderia levar seus advogados a levantar a questão no plenário do Supremo, obrigaria a algum tipo de discussão entre os ministros, constrangeria Fux a dizer algo durante o julgamento. Quiçá – nunca se sabe – o ministro, pressionado, poderia declarar-se impedido?
Fux está há 13 meses no Supremo e sua atuação vem sendo correta, como foi durante os dez anos em que, antes disso, exerceu o alto cargo de ministro do Superior Tribunal de Justiça.
O lobby que desenvolveu para chegar ao Supremo, em que conversou até com diretores da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), não o enobrece nem um pouco, embora conte ponto a seu favor o fato de ser ele próprio quem contou. Certamente não é o primeiro ministro a fazer isso, nem será o último – o que tampouco torna esse comportamento aceitável.
Mas, no final das contas, nesse episódio com Dirceu, fica a palavra de um contra a palavra de outro.
E um – o que acusa – foi qualificado pelo Ministério Público Federal como “chefe da quadrilha” do mensalão, o que seria aceito pelo Supremo Tribunal. Foi condenado e está desesperado para livrar-se das barras da penitenciária.
E o outro – o acusado — é um juiz que, baseado nos autos, e com votos consistentes e elogiados pelo mundo jurídico, mandou para a cadeia, sem contemplação, mensaleiros graúdos, inclusive seu agora acusador.
Até que surja alguma eventual nova evidência, fico, portanto, com a palavra do ministro Luiz Fux.
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