quarta-feira, 24 de agosto de 2011

UMA HISTÓRIA CONTADA NUM FOLHETO DE CORDEL...

Um folheto de Apolônio Alves dos Santos

APOLINÁRIO E HELENA ENTRE OS LAÇOS DO AMOR

Santa musa protetora
Que inspira ao trovador
Me ajudei a versejar
Um romance de valor
Apolinário e Helena
Entre os laços do amor

Apolinário era filho
Da Paraíba do Norte
De Patos de Espinhara
Um sertão sadio e forte
Porém a fatalidade
Queria cortar-lhe a sorte

O pai de Apolinário
Era simples lavrador
Vivia sempre exercendo
A vida de agricultor
E Apolinário ajudava
Ao seu progenitor

Apolinário vivia
Em união exemplar
Junto com os seus irmãos
E seu pai a trabalhar
E à noite estudava
Em aula particular

Nos anos bons de invernos
Lucravam boa fartura
De milho, fava, algodão
Conforme sua cultura
Nas vazantes do açude
Colhiam muita verdura

Mas inesperadamente
Surgiu um ano precário
Com escassez do inverno
Que o pai de Apolinário
Perdera todos plantios
Devido o tempo contrário

Além do tempo contrário
Quando a lavoura nasceu
Uma peste de lagarta
De repente apareceu
Que no sertão em geral
Toda a lavoura comeu

Apolinário ficou
Lamentando a desventura
Porque a peste lhe trouxe
Aquela cruel tortura
Desde aí que começou
Do sertão a crise dura

Pois neste tempo ele tinha
Arranjando uma querida
Porém vivia pensando
No desmantela da vida
Como podia casar
Com a sua preferida

Era essa preferida
Uma distinta pequena
Muito simpática e formosa
Igualmente a Madalena
Com quinze anos de idade
E se chamava Helena

Helena gostava muito
Do jovem Apolinário
Porém seu pai era rico
Orgulhoso e usurário
Só queria dar a filha
A rapaz milionário

Apolinário também
Amava muito a menina
Mas era um amor oculto
Somente os dois em surdina
Sem o pai dela saber
Daquela amizade fina

Então vivia o rapaz
Lutando pra resolver
Este problema na vida
Como haveria de ser
Para casar com Helena
O que devia fazer

Seu pai também fracassado
Sem gado e sem plantação
Pois quando há uma crise
Naquele velho sertão
Quem está desprevenido
Sai a procurar remição

Apolinário sabendo
Que no Rio de Janeiro
Estava bom de verdade
Para se ganhar dinheiro
Viu-se obrigado a sair
Como pobre aventureiro

Pra fazer essa viagem
Combinou com os seus pais
Para comprar a passagem
Vendeu alguns animais
E tirou seus documentos
Embora triste demais

Porém antes de sair
Disse: “É dever sagrado
Eu ir ao pai de Helena
Fazer-lhe logo avisado
Que gostou da filha dele
Pra não deixá-lo enganado”

Assim pensou, assim fez
Na tarde do mesmo dia
Apolinário trajou-se
E seguiu pra moradia
Do velho pai de Helena
Pra expor o que pretendia

Chegando bateu na porta
O velho saindo fora
Perguntou-lhe “o que deseja?”
E ele sem ter demora
Lhe disse “é uma surpresa
Que venho trazer-lhe agora”

Apolinário lhe disse:
“Não quero lhe ser grosseiro
Eu gosto de sua filha
Vim lhe avisar primeiro
Que pretendo viajar
A fim de ganhar dinheiro”

“Vou pro Rio de Janeiro
Trabalhar com o intento
De me casar com Helena
Que não haja impedimento
E vim saber do senhor
Se aceita o casamento”

O velho lhe disse: “O quê?
Você é muito atrevido
Quer casar com minha filha?
Sujeitinho intrometido
Reconheça seu lugar
Deixe de ser enxerido”

Nesta hora Apolinário
Foi se erguendo do canto
Disse: “Velho, me respeita
Com grito não me espanto
Sou homem quanto o senhor
Não venha provocar tanto”

Tornou a dizer-lhe: “Apenas
Eu vim lhe participar
Porque no dia que eu
Sua filha raptar
Não me chame de covarde
Pois eu vim lhe avisar”

O velho irritou-se e disse:
“Já por ali, seu canalha
Se carregar minha filha
Comigo se atrapalha
Pois minha filha não é
Pra um da sua igualha”

Apolinário lhe disse:
“Isto é coisa da vida
Pois o amor quando é forte
Riqueza não intimida
Sendo por sorte ou destino
Toda arruaça é perdida”

Nisto o velho levantou-se
Babando e partindo a fala
Gritou bem alto: “Levante-se
Desocupe a minha sala
Não olhe nem para trás
Senão lhe meto uma bala”

Levantou-se Apolinário
Muito calmo e paciente
Viu-se obrigado a sair
Porque o velho valente
Armado com um revólver
Irado rangia o dente

depois que chegou em casa
Apolinário escreveu
Uma cartinha amorosa
Para Helena remeteu
Dizendo: “Confio em deus
Que serei esposo teu”

“Portanto dá-me um adeus
Que amanhã partirei
Para o Rio de Janeiro
E um dia voltarei
Com fé em nosso Bom Deus
Contigo me casarei”

“As minhas cartas procura
Aqui na mão de meu pai
No mais aceita um adeus
Que o teu querido vai
Viajar e tua imagem
Da minha mente não sai”

Quando Helena recebeu
A carta do seu amor
Logo remeteu-lhe outra
Pelo mesmo portador
Dizendo “a tua ausência
Vai me acabar de dor”

“Longe de ti, meu amor
Eu fico muito abatida
Maldita hora meu Deus
Antes não fosse eu nascida
Não quero nem assistir
A hora da despedida”

“Eu vou ficar implorando
À Santa Virgem Maria
Para que sejas feliz
Na paz da santa harmonia
Que fico na esperança
De te abraçar um dia”

Na manhã do outro dia
Apolinário aprontou-se
Depois que estava pronto
A viajar destinou-se
Pediu a bênção dos pais
E num cavalo montou-se

Saiu olhando pra casa
De sua Helena querida
Avistou-a na janela
Muito chorosa e sentida
Ele acenou com a mão
Dando a sua despedida

Helena também de lá
Dava com a sua mão
Mas não pôde resistir
Àquela triste emoção
Ali sofreu um desmaio
Caiu prostrada no chão

Sua mãe saindo fora
Vendo a filha desmaiada
Tratou logo em socorrê-la
Aflita e angustiada
Deram remédio e massagem
Na donzela apaixonada

Depois que ela tornou
O velho como uma hiena
Em vez de penalizar-se
Daquela penosa cena
Agarrou uma chibata
Para bater em Helena

Porém a velha agarrou-o
Com uma força tremenda
O velho disse “maldita
Alcoviteira estupenda
Agora vou te matar
Imprensada na moenda”

O velho em uma prensa
De imprensar algodão
Queria imprensar a velha
Porém nessa ocasião
Um filho com um porrete
Botou o velho no chão

Deixemos a confusão
Para tratar da viagem
Do jovem Apolinário
Deixando a bela paisagem
Vamos saber se no Rio
Ele encontrou vantagem

Apolinário chegando
Em Patos de Espinhara
Mandou pra trás o cavalo
E tomou um pau-de-arara
Em poucos dias chegou
Na cidade Guanabara

Em uma pobre pensão
Apolinário hospedou-se
Ainda sofreu uns dias
Enquanto não empregou-se
Ficou uns dias parados
Porém depois colocou-se

Apolinário empregou-se
Numa firma construtora
Ele era acostumado
A trabalhar na lavoura
Achou muito diferente
Aquela vida impostora

O encarregado era
Um preto mal-educado
Só botava Apolinário
No serviço mais pesado
Que os empregados velhos
Já tinham renunciado

Apolinário coitado
sem ter daquilo instrução
Deu um duro condenado
Largando o couro da mão
E o suor do seu corpo
Fazia poça no chão

Numa certa ocasião
Aquele preto ordinário
Quis ofender a moral
Daquele pobre operário
Houve briga e foram expulsos
O negro e Apolinário

Apolinário ficou
Parado mais de um mês
Mas na pensão onde estava
Morava um português
Que era comerciante
E amigo dele se fez

Esse dito português
Possuía no mercado
Uma barraca de gêneros
Com sortimento avultado
Tomou logo Apolinário
Para ser seu empregado

Apolinário acanhado
Mas logo se acostumou
Junto com o português
A prática logo pegou
A trabalhar no comércio
Logo se habilitou

De formas que o português
Ficou muito satisfeito
E tratava Apolinário
Com o mais fino conceito
Porque viu que ele era
Um empregado direito

Então quando Apolinário
Já estava habilitado
O português para ele
Marcou-lhe bom ordenado
E lhe confiava tudo
Sem ter o mínimo cuidado

Aqui deixo Apolinário
Junto ao seu protetor
Vamos esperar um pouco
Enquanto o trovador
Vai ao Norte saber
Do seu verdadeiro amor

A pobre Helena vivia
Num sentimento precário
Quanto mais tempo passava
Mais aumentava o calvário
Chorava todos os dias
Pensando em Apolinário

Então todo fim de mês
Apolinário escrevia
E mandava para Helena
Objetos de valia
E mandava lhe dizer
Que jamais a esqueceria

Mas quando a pessoa espera
Alcançar felicidade
Não é difícil surgir
A negra fatalidade
Para jogar a pessoa
No lamaçal da maldade

Aquela dita pensão
Em que Apolinário morava
A dona era viúva
Porém a dita contava
Quarenta anos de idade
Mas ainda namorava

Pois ela sempre vivia
Pensando em Apolinário
Porém sabia que ele
Era pobre operário
Não lhe dava a entender
O seu amor salafrário

E sempre todos os dias
Que Apolinário saía
Ela entrava em seu quarto
Forrava a cama e varria
E sempre encontrava cartas
Que sua Helena escrevia

De formas que ela sabia
Daquela grande amizade
De Apolinário e Helena
Então chegou-lhe a maldade
De praticar contra ele
Uma grande falsidade

Aqui eu deixo este assunto
Para falar novamente
Do jovem Apolinário
Que vivia sorridente
Trabalhando de caixeiro
Por ser muito competente

Uma grande freguesia
Ele já tinha arranjado
De formas que seu patrão
Ficou muito interessado
Logo tomou-o como sócio
Pois achou-o capacitado

Aqui eu volto a falar
Na tal viúva outra vez
Quando viu Apolinário
Sócio do português
Por ser muito interesseira
Amante dele se fez

Ela disse: “Apolinário
Você precisa casar
Para ter uma proteção
Uma esposa e um lar
Porque o homem solteiro
Não tem pra quem trabalhar”

“Eu já estou para casar”
Respondeu Apolinário
“Com uma moça do Norte
Filha dum milionário
Para isto já estou
Arrumando o necessário”

“Estamos no mês de março
Quando for no fim do ano
Eu tenho que ir no Norte
Se não falhar o meu plano
Carrego Helena e me caso
Confio em Deus soberano

Ela disse: “Eu não tenho dúvida
Que você não vai dar sorte
Perca logo a esperança
Dessa garota do Norte
Ela lá arranja outro
E vai te mandar um corte”

Nesta hora Apolinário
Compreendeu certamente
Que aquela tal viúva
Já tinha na sua mente
A intenção de tomá-lo
Para o seu pretendente

Então naquela ilusão
A velha sempre esperava
Que ele a conquistasse
Pois ela sempre lhe dava
Confiança mais o moço
Pra ela pouco ligava

Um certo dia a viúva
Lhe perguntou com desdém:
“Apolinário, parece
Que você não me quer bem?”
Ele disse: “Eu só gosto
De Helena e mais ninguém”

A viúva vendo que
Ele não queria nada
Uma certa noite ela
Ficou desassossegada
Entrou no quarto do moço
Sem ele saber de nada

Apolinário dormia
Tranquilo não pressentiu
Ela usando uma chave
A porta do quarto abriu
De leve acendeu a luz
E o moço nada viu

Ao lado de Apolinário
A velha foi se sentando
Ele naquele momento
Do sono foi despertando
E foi sentindo o perfume
Da viúva o beijando

Nessa hora Apolinário
Sentiu um forte arrepio
A velha disse “meu filho
Em ti eu tudo confio
Por caridade me abrace
Que o tempo está muito frio”

Apolinário nervoso
Disse: “Dona Guilhermina
A senhora está maluca
Quer fazer minha ruína?”
Ela disse: “Meu benzinho
O teu amor me domina”

Aqui agora não sei
Descrever o que se deu
No outro dia a viúva
Para Helena escreveu
Dizendo: “Apolinário
De você já esqueceu”

“Ele agora está casado
Pois dele sou a consorte
Provo com esses retratos
Tenha calma e seja forte
Que por você nunca mais
Ele voltará ao Norte”

“Portanto fique avisada
E pode desvanecer
Do amor de Apolinário
Desde já pode esquecer
Que ele já me pertence
Pois o amo até morrer”

Ela havia tirado
Junto com Apolinário
Bonita fotografia
Dia dum aniversário
Esses serviram de escudos
Para seu plano falsário

Justamente foram esses
Que a viúva mandou
Na carta para Helena
Quando esta lá chegou
Helena ao recebê-la
Lendo a carta desmaiou

Que Apolinário casou-se
Logo correu o boato
Enquanto Helena dizia:
“Oh! rapaz falso e ingrato
Covarde fez um papel
Dum tipo péssimo e barato”

Agora deixo no Norte
Todo o povo comentando
Vamos ver Apolinário
No Rio sempre pensando
Em sua querida Helena
Notícia dela esperando

Era sempre de costume
Todo princípio de mês
Helena lhe remetia
Uma carta sem talvez
E ele mandava outra
Com a maior rapidez

Foram se passando os dias
Aquele mês se venceu
O outro já se findando
Ninguém notícia lhe deu
De seu pai nem de Helena
Notícia não recebeu

Pensava ele consigo
Que terá acontecido?
Helena estará doente?
Ou meu pai terá morrido?
Que problema será este
Que me fizeram esquecido

Assim todo fim de mês
Apolinário escrevia
Pra seu pai e pra Helena
Já quase sem alegria
Porém notícia nenhuma
Deles nunca recebia

Apolinário vivia
Acabrunhado da vida
Tristonho, sem distração
Com sua alma abatida
Porque não tinha notícia
De sua Helena querida

A viúva vendo ele
Tristonho e desconsolado
Fazia-lhe todo afago
Permanecia ao seu lado
Porém ele muito aflito
Com ela não tinha agrado

Aqui eu deixo o rapaz
Sofrendo melancolia
Vamos saber a viúva
O que era que fazia
E por que Apolinário
As cartas não recebia

Toda carta que o pai
De Apolinário mandava
A velha lia e depois
A dita carta rasgava
E os pedaços da mesma
Dentro do fogo jogava

Pois ela fazia assim
Para o pobre Apolinário
Não ter notícia de Helena
Em quem pensava diário
Assim o pobre inocente
Sofria grande calvário

Até seu sócio dizia
Para ele “não convém
Você viver tão tristonho
Não está vivendo bem?
Por que é que vive triste
O que é que você tem?”

Ele respondia: “Eu sinto
As saudades paternais
Nunca mais tive notícias
De meus estimados pais
E da minha queridinha
Que não esqueço jamais”

“Portanto meu velho sócio
Já não suporto a saudade
Precisamos dar balanço
Em nossa sociedade
Pois quero me desligar
Da nossa propriedade”

“Pois pretendo viajar
Para ver o que aconteceu
Por qual motivo o meu pai
Nunca mais me escreveu
Preciso saber se ele
Está doente ou morreu”

O sócio disse: “Está certo”
Deram balanço geral
Acharam vinte milhões
Só em moeda legal
Fora a mercadoria
Que fez o mesmo total

O português disse: “Eu fico
Com toda a mercadoria
Receba os vinte milhões
Que é de mais garantia
No mais aceite um abraço
E adeus até um dia”

Ele no dia seguinte
Apanhou um avião
Eram vinte e três de junho
Uma véspera de São João
No mesmo dia chegou
No seu amado torrão

Quando em Patos chegou
Foi procurar pela praça
Um carro de aluguel
Que era quase de graça
E disse: “Vamos correr
Enquanto a noite não passa”

O chofer lhe perguntou:
“O senhor para onde vai?”
Ele disse: “Para o sítio
Que aqui não me distrai
Quero festejar São João
Na fazenda de meu pai”

O chofer lhe disse: “Eu vou
Por cinco contos de réis”
Apolinário lhe disse:
“Ainda que fosse fez
Acelere seu motor
E pode atolar os pés”

Apolinário saltou
Bem perto da moradia
De seus extremosos pais
Traspassado de alegria
Ansioso por revê-los
Que há tanto tempo não via

Reinava grande alegria
Por ser noite de São João
Todas as fogueiras acesas
Iluminando o sertão
E os balões no espaço
Faziam circulação

Só se via o foguetão
Soltando lágrimas de prata
E os de lágrimas de ouro
Iluminando a cascata
E suas flechas queimadas
Caindo dentro da mata

Foi uma grande alegria
Naquela noite festiva
Quando viram Apolinário
Chegar com voz expansiva
Gritando: “Viva São João”
Todos responderam: “Viva!”

O povo todo brincava
Ao redor da fogueira
Assando milho na brasa
Nesta hora prazenteira
Apolinário surgiu
No meio da brincadeira

Tão grande foi o espanto
E maior foi a surpresa
Quando viram Apolinário
Chegar ali com presteza
E abraçar ali todos
Com máxima delicadeza

Depois disto Apolinário
Perguntou: “Quedê meu pai?”
O velho escutando a voz
De dentro da casa sai
Foi logo abraçando o filho
De alegre quase cai

Perguntou Apolinário
“Quedê minha mamãezinha?”
Um garoto seu irmão
Lhe disse: “Está na casinha”
Apolinário correu
Para abraçar a velhinha

Nisto passaram a noite
No maior contentamento
Ali ninguém dormiu mais
Foi grande o divertimento
O prazer foi sem igual
Pra todos do aposento

Ele perguntou: “Meu pai
O que foi que aconteceu?
Que o senhor nunca mais
Uma carta me escreveu
Como é que vai Helena
Está doente ou morreu?”

O velho disse: “Está viva
Porém muito indignada
Desde que você casou-se
Que ela pobre coitada
Só leva a vida a chorar
Não tem distração de nada”

“Depois que eu me casei?”
Apolinário indagou
“De onde vem esta história
Que o senhor me falou
Não estou compreendendo
Me conte o que se passou”

O velho disse: “Não sei
Seja verdade ou boatos
Helena aqui recebeu
Uma carta e uns retratos
Mandados por tua esposa
Guilhermina Souza Matos”

Nessa hora Apolinário
Compreendeu a cilada
Exclamou: “Oh! infeliz
Velha falsa condenada
Que coração traidor
Natureza desgraçada”

“Fez para mim e Helena
A mais cruel falsidade
Uma tragédia maldita
Para ver nossa amizade
Sem resultado cair
Na pantanal da maldade”

Perguntou ele “meu pai
O senhor me escrevia?”
O velho respondeu: “Claro!
Todo mês eu remetia”
Ele disse: “Então as cartas
A miserável escondia”

Aqui encerro este assunto
Daquela trama malvada
Deixemos Apolinário
Já ciente da cilada
Vamos saber como Helena
Soube da sua chegada

No outro dia bem cedo
Espalhou-se o comentário
O povo todo dizia
“Esta noite Apolinário
Chegou do Rio de Janeiro
Um grande milionário”

Helena estava dormindo
Acordou quando vaqueiro
Entrou dizendo: “Esta noite
Chegou do Rio de Janeiro
Apolinário de Souza
Trouxe bastante dinheiro”

Helena ouvindo isto
Sentiu um grande calor
Nessa hora foi entrando
No seu quarto um beija-flor
Beijou-lhe dando talvez
Notícia do seu amor

Helena se levantou
Seu cabelo em desalinho
Ao chegar no quintal
Foi entrando um garotinho
Sem que ninguém pressentisse
Entregou-lhe um bilhetinho

“Quem mandou este bilhete?”
Helena lhe perguntou
Ele disse: “Apolinário
Que esta noite chegou
Deseja falar contigo”
Só disse isto e voltou

Dizia assim o bilhete:
“Helena, minha querida
Se conforme e nunca pense
Que por mim foste traída
Foi uma trama sinistra
Duma mulher pervertida”

“Foi a minha senhoria
Que é dona da pensão
Aonde estou residindo
Que fez a contradição
Hoje foi que vim saber
Desta horrenda traição”

“Ouça a voz da consciência
Não me julgue traidor
Pode vir falar comigo
Porque se possível for
Suicidar-me-ei
Em prova do nosso amor”

“Portanto querida venha
Com a máxima brevidade
No mesmo ponto de outrora
Que te declaro a verdade
Pois eu quero te provar
Que tudo foi falsidade”

Ela findando de ler
No mesmo instante sentiu
Renovar sua esperança
E ao mesmo tempo ouviu
Uma voz dizer-lhe: “Vai
Que teu amor ressurgiu”

Logo tomou atitude
E seguiu com brevidade
Pra aquele mesmo local
Em que jurou amizade
A seu amante querido
Com pura felicidade

Apolinário esperava
Debaixo duma aroeira
Onde eles namoravam
Todo dia a tarde inteira
Aonde fez a Helena
Uma jura verdadeira

Quando Helena chegou
Pertinho de Apolinário
Disse ele: “Vem querida
Amenizar meu calvário
Embora tu me julgues
Um tipo muito ordinário”

Nesse momento Helena
Disse para ele assim:
“Você bancou a espécie
Dum tipo muito ruim
Porque depois de casado
Foi que lembrou-se de mim”

Apolinário lhe disse:
“Helena eu fui iludido
Por Deus queira acreditar-me
Porque também fui traído
Por causa daquela infâmia
É que me julgas fingido”

“A carta que recebeste
Com uma fotografia
Foi duma mulher infame
Que nos fez a covardia
Conforme fui informado
Pois ainda não sabia”

“Fez isto só por despeito
Por eu não dar-lhe atenção
Como eu não quis amá-la
Fez esta contradição
Fazendo tu esquecer-me
Por meio duma traição”

“Pois nem sequer uma carta
De ti não recebi mais
Desde março para cá
Não pude viver em paz
Só porque não recebia
Nem notícias de meus pais”

“Durante todo esse tempo
Sofri ansiosamente
Mas tua imagem de santa
Nunca me saiu da mente
Por não receber notícias
Resolvi partir urgente”

Helena lhe respondeu:
“Perdoa anjo querido
Pois eu pensei que você
De mim estava esquecido
Mediante aquela carta
Julguei o caso perdido”

Apolinário lhe disse:
“É bom a gente esquecer
Aquela trama maldita
Que tanto nos fez sofrer
Tratemos doutros assuntos
Que nos dêem melhor prazer”

“Querida, vamos embora
Para o Rio de Janeiro
Vou comprar nossas passagens
De avião passageiro
E vamos casar no Rio
Perante Deus verdadeiro”

“Amanhã logo cedinho
Daqui eu viajarei
Para comprar as passagens
Mas à tarde voltarei
E aqui de novamente
Contigo conversarei”

E ali se despediram
Com um abraço apertado
Helena beijou-o chorando
Por ter ali renovado
Um amor que estava morto
Foi ali ressuscitado

No outro dia cedinho
Apolinário saiu
Já tinha dito a seu pai
O plano que decidiu
Que não falasse a ninguém
Ao velho preveniu

Foi à cidade comprou
As passagens de avião
Para o Rio de Janeiro
E ficou de prontidão
Para a noite de São Pedro
Foi marcado no talão

Nesse mesmo dia à tarde
Voltou bastante apressado
Para falar com Helena
Conforme havia tratado
Ela já o esperava
Naquele ponto marcado

Apolinário lhe disse:
“Helena minha querida
Comprei as nossas passagens
Se apronte e se decida
Pra na noite de São Pedro
Fazermos nossa partida”

Então aqueles dois jovens
Ficaram ansiosamente
Esperando aquela noite
Mas todo povo inocente
Somente os pais do rapaz
É que estavam ciente

O velho pai de Helena
Nisto não tinha cuidado
Sabia que Apolinário
Já havia se casado
E que tinha sido trama
Ninguém lhe tinha avisado

Então naquela fazenda
Do velho pai de Helena
Nessa noite de São Pedro
Ia haver uma novena
A casa estava enfeitada
Com flores de açucena

Como de fato que houve
Foi uma festa estupenda
Com diversas distrações
Muita bebida e merenda
Era tanta gente que
Não cabia na fazenda

Ali num grande forró
Dançava toda a moçada
Quando foi a meia-noite
No melhor da batucada
Helena se disfarçando
Fugiu na hora marcada

Apolinário já estava
Com um jipe lhe esperando
Helena chegando ali
Foram logo se beijando
Tomaram assento no jipe
E foram se despistando

Quando o dia de São Pedro
Já havia amanhecido
Os velhos pais de Helena
Fizeram grande alarido
Quando descobriram que
Helena tinha fugido

Ela já tinha chegado
Junto com Apolinário
Dentro do Rio de Janeiro
Aprontaram o necessário
E no outro dia à tarde
Foram aos pés do vigário

Enquanto ali todo o povo
Comentava o que se deu
Com oito dias depois
Que isto aconteceu
O velho pai de Helena
Uma carta recebeu

Vieram as fotografias
De Apolinário e Helena
Ela de véu e grinalda
E um buquê de açucena
O velho de tanta ira
Quase que se envenena

A carta dizia assim:
“Meu caro sogro estimado
Abençoe sua filha
E fique bem conformado
Desculpe a Apolinário
Este seu genro e criado”

A viúva quando viu
Apolinário casado
Levada pelo desgosto
Vibrou um golpe acertado
Em cima do próprio peito
Seguiu num barco furado.

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