quinta-feira, 17 de dezembro de 2015

LITERATURA DE CORDEL...

Cordel de Abraão Batista (Escrito em abril de 1985)
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Jovem fugindo da morte
A existência na terra
É mistério impensável
Nasce um, e morre outro
No sofrível ou insuportável
Uns sorrindo, outros cantando;
Uns da vida se lastimando
Por ser esta muito instável.
Uns sobem e descem a ladeira
Com rara naturalidade
Outros não querem aceitar
Da vida a realidade
Por isso, esses se estrepam
E as dores neles se trepam
Com toda a velocidade
E é justamente por isso
Que escrevo, eu dessa vez
Buscando a vida passada
Em território chinês;
Não sei se pra lá ou pra cá
Mas foi numa cidade Chambá
No ano um, dois ou três…
Nessa cidade Chambá
Existia um fazendeiro
Poderoso, bom e valente
Dono de muito dinheiro
Tinha gado e tinha terras
Sete açudes e duas serras
E por cima, hospitaleiro.
Esse fazendeiro possuía
Um excelente coração
Sua casa da fazenda
Era como a de Salomão
E o povo da redondeza,
Disse a minha certeza:
O queria como irmão.
Na fazenda ele tinha
No serviço um capataz
Que o atendia muito bem,
Um belo e moço rapaz
Com 18 anos de idade
Por isso até na cidade
Se espandia o seu cartaz.
Esse rapaz, do fazendeiro
É quem fazia todo recado
Na cidade de manhãzinha
Ele ia para o mercado
Comprar carne e verdura
Tempero e rapadura
Sem nunca mostrar enfado.
Numa manhã esse rapaz
No mercado, ele avistou
Num recanto de parede
Que quase se assombrou
A morte bem pensativa
Olhando-o radiativa…
E depressa se afastou.
Fugiu de perto, com medo
O nosso belo rapaz
Para a fazenda do patrão
Como um verdadeiro az
E dentro do casario
Ele ficou muito sombrio
O que não era contumaz.
No outro dia bem cedo
Ao mercado ele voltou
Para fazer o de costume,
As compras todas comprou
Mas lá estava num canto
A morte, com olhar de espanto
Que o pobre quase tombou.
Correndo fez suas compras
Se escondendo na multidão
do olhar faminto da morte
com olhar de escuridão,
pois novamente correu
e nunca mais se esqueceu
daquela horrível visão!
No outro dia o mesmo
Com o rapaz aconteceu…
Fez as compras depressa,
Para a fazenda correu
E em casa esse coitado
Ficou muito assombrado
Nem sequer água bebeu!
Os amigos vendo aquilo
Para ele lhe perguntaram
Mas o rapaz muito calado
Sua história se ignoravam;
Assim, ele foi definhando
Consigo se lastimando
Com os dias que lhes restavam.
No quarto dia, o patrão
Chegou pra ele e indagou,
Meu rapaz quero saber
Porque você se reservou
Anda triste, encabulado
Não come, anda invocado
Quem foi que o machucou?
Não é nada!… Disse o rapaz
Olhando para o patrão
O que? – Com a sua cara
Se vê que seu coração
Está triste, muito confuso
E dentro desse meu uso
Quero lhe dar a proteção.
O rapaz ainda quis
Esconder a realidade
Mas devido a insistência
Usou da sinceridade
E foi dizendo: meu patrão
Estou perdido! Não sei não…
– Vou embora dessa cidade!
Vou-me embora, porque
A morte quer me matar
Todo dia no mercado
Ela está a me esperar
E ainda não me matou
Porque ela não me pegou,
E caiu ele a chorar.
O patrão disse: não chore
Nós daremos um jeito nisso
– pegue o meu cavalo branco
Se apronte e dê sumiço
Desapareça da redondeza
Pois com muita esperteza
Quebramos dela o feitiço.
Desse jeito o rapaz fez:
Se aprontou sem dar demora
Pegou a roupa que pode
E saiu de mundo à fora
Com arroz, carne e farinha
Seis rapaduras, uma galinha
Sal, café e boa espora.
O rapaz na mesma hor4a
Por um atalho seguiu
No bom sentido contrário
O seu trajeto ele viu
Botou um pano no rosto
Pra ninguém ver o seu rosto
Foi o que se deduziu.
Sete dias e sete noites
Ele andou sem descançar;
Eu não sei como o cavalo
Ainda o podia carregar
Até que em cidade distante
Ele entrou triunfante
Pensando nela ficar.
Num hotel bem reservado
Confiante se hospedou
E num quarto da hospedaria
No último andar ele ficou;
Abriu a porta do quarto
Almoçou ficou bem farto
Fez sua cama e deitou.
Quando foi no outro dia
Que o sol apareceu
O rapaz abriu os olhos
E veja o que aconteceu:
A morte estava no quarto…
E o rapaz sentindo-se farto
Pulou da janela e morreu!
Da janela ele pulou
Se esparramando no chão
Daí a cinco minutos
Juntou grande multidão
Uns diziam – que mote feia!
Olhem ele está sem meia…
Estava na cama, o pobretão!
Por que um rapaz desse
Toma decisão dessa assim?
Alguém dizia – foi empurrado
Deve haver outro Caim!
Chamem logo o delegado
E vamos ver se o finado
É honesto ou é ruim.
O delegado chegou logo
Fez o seu levantamento
Levou o corpo pro necrotério
Fez autópsia com instrumento
E disse: não foi matado
Mandou logo um recado
Para a cidade de nascimento.
Mandou um polícia avisar
Na fazenda do ex-patrão
Que o rapaz tinha morrido
Estatelado no chão
E quando o soldado chegou
Direito ele avisou
Com observável emoção.
O patrão, com a notícia
Logo a morte procurou
Onde ela fazia ponto
E para ela lhe perguntou –
Por que matou o meu rapaz?
Você é filho do satanaz!
Sorrindo, a morte falou:
Cale a boca ó meu senhor
Você não sabe de nada
O patrão disse: eu não mandei
Que ele fosse pela estrada?
Será que você adivinhou
Onde meu rapaz se hospedou?!
E a morte deu uma risada…
Ele não disse a você
Que eu estava pensativa
Olhando fixa pra ele
Muito séria e radiativa?
Pois bem, eu estava pensando
Como levá-lo daqui, tramando
Para a cidade primitiva.
Pois é – naquela cidade
É que eu queria o encontrar
E somente naquele local
É que eu podia o matar!
Pois ninguém foge da morte
E nem traça a própria sorte
E nem bebe água do mar.

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