domingo, 23 de fevereiro de 2014

MÁSCARAS...

MÁSCARAS

  MENOTTI Del Picchia
O Beijo de Arlequim (texto parcial)...


ARLEQUIM
Que musicais surpresas
Não encerra a mudez destas cordas retesas...
CONFIDENCIAL A PIERROT

Olha: Penso, Pierrot, que não existe em suma,
entre a viola e a mulher, diferença nenhuma.
Questão de dedilhar, com certa audácia e calma,
numa ... estas cordas de aço e na outra ... as cordas d’alma!
O beijo da mulher! Ó sinfonia louca
da sonata que o amor improvisa na boca...
No contato do lábio, onde a emoção acorda,
sentir outro vibrar, como vibra uma corda...
À vaga orquestração da frase que sussurra
ver o corpo fremir tal qual uma bandurra...
Desfalecer ouvindo a música que canta
No gemido de amor que morre na garganta...
Colar o lábio ardente à flor de um seio lindo,
ir aos poucos subindo... ir aos poucos subindo...
até alcançar a boca e escutar num arquejo,
o universo parar na síncope de um beijo!
Eis toda a arte de amar! Eis Pierrot fantasista,
a suprema criação da minha alma de artista.
Compreendes?
Pierrot ansiado;
E A MULHER?
Arlequim, lugubremente:
A mulher? É verdade...
Levou naquele beijo a minha mocidade.
Pierrot
E agora? Onde ela está?
Arlequim, ironicamente místico:
No meu lábio, no ardor
desse beijo, que é todo um romance de amor!
Seduzido pela angústia da saudade:
No temor de pedi-lo e na glória de tê-lo...
No gozo de prová-lo e na dor de perdê-lo...
No contato desfeito e no rumor já mudo...
No prazer que passou... nesse nada que é tudo:
O passado!... a lembrança.... a saudade... o desejo...
Balbuciando:
Um jardim... Um repuxo ... Uma mulher... Um beijo...
(Longo silêncio de evocação e cismas).
Pierrot, ingenuamente:
É audaciosa demais a tua história...
Arlequim, ríspido:
Enfim,
Um Arlequim, Pierrot, é sempre um Arlequim.
Toda historia de amor só presta se tiver,
como ponto final, um beijo de mulher!

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