O PÁSSARO CATIVO...
Armas, num galho de árvore, o alçapão
E, em breve, uma avezinha descuidada,
Batendo as asas cai na escravidão.
Dás-lhe então, por esplêndida morada,
Gaiola dourada;
.
Dás-lhe alpiste, e água fresca, e ovos e tudo.
Por que é que, tendo tudo, há de ficar
O passarinho mudo,
Arrepiado e triste sem cantar?
É que, criança, os pássaros não falam..
Só gorjeando a sua dor exalam,
Sem que os homens os possam entender;
Se os pássaros falassem,
Talvez os teus ouvidos escutassem
Este cativo pássaro dizer:
.
"Não quero o teu alpiste!
Gosto mais do alimento que procuro
Na mata livre em que voar me viste;
Tenho água fresca num recanto escuro.
Da selva em que nasci;
Da mata entre os verdores,
Tenho frutos e flores
Sem precisar de ti!
.
Não quero a tua esplêndida gaiola!
Pois nenhuma riqueza me consola,
De haver perdido aquilo que perdi...
Prefiro o ninho humilde construído
.
De folhas secas, plácido, escondido.
Solta-me ao vento e ao sol!
Com que direito à escravidão me obrigas?
Quero saudar as pombas do arrebol!
Quero, ao cair da tarde,
Entoar minhas tristíssimas cantigas!
Por que me prendes? Solta-me, covarde!
Deus me deu por gaiola a imensidade!
Não me roubes a minha liberdade...
Quero voar! Voar!
.
Estas cousas o pássaro diria,
Se pudesse falar,
E a tua alma, criança, tremeria,
Vendo tanta aflição,
E a tua mão tremendo lhe abriria
A porta da prisão....
Olavo Bilac
.
O apanhador de desperdícios
Uso a palavra para compor meus
silêncios.
Não gosto das palavras fatigadas
de
informar.
Dou mais respeito às que vivem de
barriga no chão tipo água pedra
sapo.
Entendo bem o sotaque das águas.
Dou respeito às coisas
desimportantes e aos seres
desimportantes.
Prezo insetos mais que aviões.
Prezo a velocidade das tartarugas
mais que as dos mísseis.
Tenho em mim esse atraso de
nascença.
Eu fui aparelhado para gostar de
passarinhos.
Tenho abundância de ser feliz por
isso.
Meu quintal é maior do que o
mundo.
Sou um apanhador de desperdícios:
Amo os restos como as boas
moscas.
Queria que a minha voz tivesse um
formato de canto.
Porque eu não sou da informática:
eu sou da invencionática.
Só uso a palavra para compor os
meus silêncios."
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