quarta-feira, 9 de novembro de 2016

A TROVA DE JOSÉ LUCAS DE BARROS...




José Lucas de Barros (1934 – 2015)
Sei que deste mundo lindo
vou sair, só não sei quando,
mas quero morrer dormindo
para entrar no céu sonhando.
*
Quando a jangada flutua
sobre as águas, ao luar,
é uma lágrima da lua
nos olhos verdes do mar.
*
O cego, com dedos certos,
tange a sanfona dorida,
e eu, com dois olhos abertos,
erro nas teclas da vida.
*
Para abraçar-te, menina,
meu anseio é tão profundo,
que a distância de uma esquina 
parece uma volta ao mundo.
*
Sem ter da mulher o afeto,
não tenho felicidade.
Homem nenhum é completo
quando lhe falta a metade.
*
O amor e o sonho, querida,
são graças que Deus nos deu…
Quem não ama não tem vida,
quem não sonha já morreu.
*
– Oh! Que demora sem fim
para tua decisão!
Chegou tão tarde o teu sim,
que já parecia um não!
*
Quando o tempo se levanta
no sertão, e a seca vem,
não morre somente a planta,
morre a esperança também!
*
Como é belo ver a planta
que abre flores nos caminhos,
nas horas em que Deus canta
pela voz dos passarinhos!
*
Vou brincar com pirilampos
e beijar as flores nuas
pra ver se encontro nos campos
a paz que fugiu das ruas!
*
Em muitas ocasiões,
só somos bons elementos
porque certas intenções
não passam de pensamentos.
*
– O perdão é que é o sinal
de perfeita lucidez…
Quem se vinga faz o mal
do jeito que alguém lhe fez.
*
Quem, na mocidade, trunca
os sonhos de amor e paz,
talvez não conserte nunca
o estrago que o tempo faz.
*
A menina seminua,
presa, disse ao detetive:
– eu não me queixo da rua,
mas do lar que nunca tive!
*
Mais vale da vida o espelho
que muitos sermões no templo…
Em vez de nos dar conselho,
seu padre, nos dê o exemplo!
*
Minha mulher reza tanto
aos pés de Nosso Senhor,
que eu vou precisar ser santo
pra merecer seu amor.
*
Quando estou em meu terraço, 
olhando os astros risonhos,
a Lua atravessa o espaço,
puxando o carro dos sonhos!

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