sexta-feira, 5 de julho de 2013

UMA HISTÓRIA DO CONJUNTO SUCUPIRA...POR BERNARDO CELESTINO PIMENTEL.




         Ninguém faz omelete sem quebrar os ovos...
repito esta frase, diariamente,quando os meus pacientes referem DOR, após as cirurgias orificiais....

          Toda separação,toda briga,todo crime deixa as suas sequelas...é inevitável...é esta a regra geral...são necessários apenas olhos que vejam e mentes que analisem...

          Mas, agora,eu talvez fale de uma exceção, pelo menos aparente...

               Certa noite de boemia,estava no conjunto sucupira em Santo Antonio, tomando umas cervejas...eu trabalhava como médico no CRUTAC, recém chegado, havia concluído a residencia em cirurgia geral...
               Já era alta hora, e no recinto, eu e o dono do bar...começamos a conversar, sobre causa e efeito...
               O dono do bar, um líder sindical,petista, socialista...e ele começou a contar a sua história, que eu estou repetindo, pra vocês:
               Dr.Bernardo, quando eu tinha oito anos, ví meu pai discutir com minha mãe...ao longo da discussão, meu pai transfixou minha mãe com uma faca de  doze polegadas...a partir daí, meu pai foi preso, e eu abandonado no mundo...
               Na cidade, tinha uma benfeitora,Dona Arlete, que me acolheu, me dava comida, e mandava eu deixar o almoço de meu pai, na prisão...fiz isso muitas vezes...
               Certa vez, ao chegar na cadeia local,presenciei uma discussão de meu pai com  outro preso...como sempre, levava o almoço dele...não deu nem tempo de pai comer...
               Abruptamente, o referido preso, transfixou pai, com uma faca de doze polegada...portanto, na minha infância, sem afetos, sem brinquedos, sem sonhos, ví meu pai matar mamãe e ser morto por outro, os dois crimes por arma branca...

               Me criei sozinho...vivendo da caridade pública...nunca fui nem abençoado...as vezes, caminhava com os cachorros vira latas, soltos nas ruas da cidade e me sentia um deles...meus irmãos de abandono...frutos do mesmo desprezo...animais sobre os quais a natureza não teve nenhuma contemplação...só conjugávamos o verbo sofrer...e a imensa tristeza era a nossa cantiga de ninar...

A esta altura eu  me encontrava perplexo...o homem conversava normalmente, pausadamente...

               Para concluir, o homem falou:

o senhor sabe o que estas cenas causaram ao meu destino  ? 
resposta dele mesmo:
absolutamente nada...
sou um homem normal...
nunca tomei um tranquilizante, nem sou um homem desajustado, nem nervoso...

               A esta hora, o conjunto residencial sucupira era somente silencio,eu pedí a saideira, olhei para Nova Cruz, onde dormiam o meu pai e minha mãe, e disse pra mim, o resto da semana:
               Entre o céu e a terra, existe mais mistérios do que supõe a nossa vã filosofia...como falava SHAKESPEARES.

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