terça-feira, 6 de setembro de 2016

UMA PÉROLA PARA O MOMENTO ATUAL...


(POR DR. ODÚLIO BOTELHO)
Esse episódio da cassação trouxe-me casualmente à memória (provavelmente pela lição implícita) esse belo poema de Jacques Prévert, traduzido por Carlos Drummond:
O GATO E O PASSARINHO
[Jacques Prévert, tradução de Carlos Drummond de Andrade]
A aldeia escuta desolada
o canto da ave maltratada.
É o único pássaro da aldeia
e foi o único gato da aldeia
que o devorou pela metade.
A ave deixa de cantar.
O gato deixa de roncar
e de lamber o próprio focinho.
A aldeia faz ao passarinho
maravilhosos funerais,
e o gato, que foi convidado,
segue o caixãozinho de palha
onde o pássaro se amortalha,
conduzido por uma menina
que não para nunca de chorar.
— Se soubesse que isso te faria sofrer tanto,
diz-lhe o bichano,
eu o teria comido todo
e te contaria, depois,
que ele havia batido asas,
batido asas para o fim do mundo,
para um lugar tão longe
que ninguém nunca voltou de lá.
Tu sofrerias muito menos,
só um pouquinho de tristeza
e outro pouquinho de saudade.
Nunca devemos fazer
as coisas pela metade.

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