sábado, 24 de junho de 2017

LITERATURA DE CORDEL...


João Paraibano
O que mais me admira
É ver o sapo inocente
Que gosta de lama fria
Mas detesta a terra quente
Vendo da cobra o pescoço
Pinota dentro do poço
Pra se livrar da serpente.
* * *
Rogaciano Leite
Eu nasci lá num recanto
Do sertão que amo tanto
Onde o céu desdobra o manto
Feitos de rendas de anil
Onde o firmamento extenso
É um grande espelho suspenso
Refletindo o rosto imenso
Da minha pátria o Brasil.
* * *
Rena  Bezerra
Lembro bem do meus banhos no riacho
De fazer arapuca lá na mata
Tomar banho escondido na cascata
E descer ribanceira mundo abaixo.
De subir no coqueiro e tirar cacho
No curral tomar leite sem ter nata
Ver os pássaros conduzindo uma cantata
E eu ficar lhes ouvindo bem contente,
Se o passado voltasse pro presente
Mataria a saudade que nos mata.
* * *
Henrique Brandão
Um aboio penoso do vaqueiro
Um cavalo relincha no roçado
A cancela, por onde passa o gado
A cafofa do pé de umbuzeiro
Um boi “brabo” cair no formigueiro
A cacimba na foz do ribeirão
O cuscuz, carne assada e o pirão
Um menino dizendo poesia
Uma porca fuçando a lama fria
Tudo isso são coisas do sertão.
Vaquejada, reisado e cantoria
Uma roça com milho pendoando
Um cigarro de palha, vez em quando
No programa de rádio, cantoria
A cigarra tocando a melodia
Um jumento deitado no oitão
Um sela, perneira e um gibão
Às seis horas louvar Nossa Senhora
Logo a lua se “amostra” sem demora
Tudo isso são coisa do sertão.
 
* * *
Otacílio Batista
Minha mãe me criou dentro do mar
Com o leite do peito de baleia
Me casei no oceano com a sereia
Que me fez repentista popular
Canto as noites famosas de luar
E linguagem das brisas tropicais
Entre abraços e beijos sensuais
Nos embalos das ondas seculares
Conquistei a rainha mãe dos mares
E o que é que me falta fazer mais?
* * *
Zé de Cazuza
O pobre do retirante
Viaja sem rumo certo
Quando está fatigado
Acha um juazeiro perto
Parecendo um guarda-chuva
Que Deus armou no deserto.
* * *
Guaipuan Vieira
É bem feliz quem escreve
E vê sua obra estudada
É imortal quem tem vida
Vida diversificada
Já conquistou sua glória
Prá no céu fazer morada
* * *
Joaquim Venceslau Jaqueira
Eu andei de déo em déo
E desci de gáio em gáio
Jota a-já, queira ou não queira.
Eu não gosto é de trabaio,
Por três coisa eu sou perdido:
Muiê, cavalo e baraio!…
* * *
Inacio da Catingueira
Há dez coisas neste mundo
Que toda gente procura:
É dinheiro e é bondade,
Água fria e formosura,
Cavalo bom e mulhé,
Requeijão com rapadura,
Morá, sem sê agregado,
Comê carne com gordura.
* * *
Bob Motta
Nem ostra, nem catuaba,
nem caldo de tubarão,
culhão de touro ou pirão,
nem mesmo, uma caldeirada;
vai levantar a “finada”,
que vive olhando p’ro chão.
Nem pentelho de barrão,
lhe digo, na minha verve;
isso de nada lhe serve,
quando se acaba o tezão.
* * *
Um folheto de Olegário Fernandes da Silva
O HOMEM QUE CASOU COM A JUMENTA
Jesus pai poderoso
Minha poesia aumenta
Enquanto eu escrevo um causo
Que todo mundo comenta
O homem deixou a mulher
Pra casar com a jumenta
Isto foi na Paraíba
Município de Campina
Deixou a sua esposa
Por nome de Jarmelina
E amigou-se com a Jega
Para cumprir sua sina
Esse causo se deu
Na Paraíba do Norte
O homem pra casar com burra
Precisa que seja forte
Uns diz que é safadeza
E outros diz que é sorte
No mundo aparece coisa
Que parece uma novela
Um homem assim não tem
O valor de uma cadela
Olhe na capa do livro
Ele abraçado com ela
Seu nome Senhor Pereira
Com Jarmelina casado
Porém há mais de mês
Que ele vinha amigado
Namorando uma jumenta
Lá num canto reservado
Ele avistando a jumenta
Ficou hipnotizado
la abanou as orelhas
Como quem dar um recado
E ele com ar de louco
Quase morto e apaixonado
A jumenta olhou pra ele
Fez um sinal de amor
Ele abraçou-se com ela
Chamando de minha flor
Somente tu é quem cura
A minha triste dor
E ai seguiu direto
A casa do fazendeiro
E lhe comprou a jumenta
Pelo um avultado dinheiro
E levou-a para casa dizendo
És meu amor verdadeiro
Ele chegou em casa
Botou na estribaria
e abraçava com ela
Alegremente sorria
Era amigado com ela
Mais a mulher não sabia
Desse dia por diante
Ele ficou diferente
Só ia em casa almoçar
E voltava rapidamente
Pra abraçar-se com a jumenta
O seu amor excelente
Tudo que a mulher fazia
Para ele não prestava
Somente com a jumenta
Ele se consolava
Ele beijava a jumenta
E ela também lhe beijava
E assim mais de dois meses
Em casa ele não dormia
Às dez e meia da noite
De casa ele sumia
E só voltava pra casa
No romper do novo dia
Nas obrigações de casa
Ele fez certo resumo
A mulher desconfiada
Como sempre e de costume
E assim desta maneira
Foi aumentando o ciúme
Ele trazia para casa
Fava,farinha e pimenta,
Milho, feijão e arroz
Levava para jumenta
E dessa vez sua esposa
Quase que se arrebenta
A mulher ele dava dez contos
E a Jega ele dava cem
A mulher passando fome
E a Jega passando bem
Sua esposa dizia
Outra mulher ele tem
A mulher se aperriou
E ficou apavorada
Ela dizia Pereira
Tem outra namorada
Mais eu tô indo e pego
Os dois numa emboscada
Ela disse se eu pegar
A parada vai ser cinzenta
E eu meto pau nos dois
Quebro perna, braço e venta
Mas deixa que ele estava
Amigado com uma jumenta
E assim ficou tocalhando
Toda hora e todo dia
Até que pegou os dois
Dentro da estribaria
Ele abraçado com a burra
Fazendo o que bem queria
A sua esposa legítima
Chama-se Jarmelina
E ele brincando com a burra
Chamava ela Cravina
Dizia que vamos casar
Que nosso signo combina
Ela dava beijo nele
Ele dava beijo nela
Ela se abraçava com ele
Ele se abraçava com ela
Sem verem que a velha estava
Escondida na cancela
Ela abriu a porteira
E saiu devagarzinho
Chegou com um toro de pau
Na ponta só tinha espinho
E danou na cara dele
Que arrebentou-lhe o fucinho
A jumenta pulou de lado
Ele se esparramou ao chão
Além da queda e da dor
Levou mais um empurrão
E a mulher foi a cidade
Se queixar ao capitão
Ela contou toda a história
Ao capitão Luiz
Seu caso é judicial
Só quem resolve é o juiz
Ela disse eu vou agora
Pra ver o que ele diz
Ao Juiz ela contou
Como foi todo ocorrido
Eu quero me desquitar
Daquele cabra bandido
Então vá buscar ele
Prá o caso ser resolvido
O Juiz disse este homem
Por certo é maluco
Prá atender o Juiz
No mesmo instante chegou
E a sua história amorosa
Ao Juiz ela contou
O Juiz disse a sua esposa
Pede prá ser disquitada
O senhor com uma jumenta
Ela fica envergonhada
Ele disse a burra é minha
Isso não quer dizer nada
Eu também peço o disquite
Meu com minha mulher
Depois disto ela pode
Casar com quem quiser
E eu caso com a jumenta
Dê o caso no que der
O Juiz pra ele falou
Com a frase muito grosseira
Você vai deixar sua esposa
Nova bonita e fagueira
Pra casar com uma jumenta
E fazer sua caseira
Essa mulher que era minha
Até o diabo arrenega
O homem é ouro de lei
Nada ruim não lhe pega
Dessas mulheres que tem hoje
É muito melhor uma jega
E mesmo o senhor está vendo
A caristia é sem fim
Eu faço a feira pra casa
Ela ainda acha ruim
E a jumenta eu sustento
Com salambaia e capim
Nisso chegou Abraão
Que viu todo negócio
Disse perante ao Juiz
Já que assinei o divórcio
Vou casar com Jarmelina
Para de Pereira eu ser sócio
Dentro de dois minutos
Fizeram a transação
Pereira casou com a Jega
Prenda do seu coração
Jarmelina também casou
Com o poeta Abraão.

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