quinta-feira, 12 de setembro de 2019

A POESIA QUE AUTA DE SOUZA FEZ TRES DIAS ANTES DE MORRER, OFERECIDA A AMIGA E TAMBEM POETISA ANNA LIMA, A QUEM CHAMAVA: O DOCE SABIÁ DA MATA...POR BERNARDO CELESTINO PIMENTEL

              Luz e sombra
           [Versos escritos três dias antes da morte da autora]
(À poetisa Anna Lima)

Vamos seguindo pela mesma estrada,
Em busca das paragens da ilusão;
A alma tranqüila para o Céu voltada,
Suspensa a lira sobre o coração.


Ris e eu soluço... (Loucas peregrinas!)
E em toda parte, enfim, onde passamos,
Deixo chorando os olhos das meninas,
Deixas cantando os pássaros nos ramos.


Porque elas amam tua voz canora,
Ó delicado sabiá da mata!
E eu lembro triste a juriti que chora
E a voz dorida em lágrimas desata.


Gostam de ver-te o rosto de criança
Limpo das névoas de um martírio vago,
O lábio em riso, desmanchada a trança,
No olhar sereno a candidez do lago.


Até perguntam quando sobre a areia
Em que tu pisas vão nascendo rosas:
“Bela criança, tímida sereia,
Irmã dos sonhos das manhãs radiosas.


Por que trilhando a terra dos caminhos,
Onde o teu passo faz brotar mil flores,
Esta velhinha vai deixando espinhos
E um longo rastro de saudade e dores?”


Não lhes respondas... Pela mesma estrada
Sigamos sempre em busca da Ilusão;
A alma tranqüila para o céu voltada,
Suspensa a lira sobre o coração.


Vamos; desprende a doce voz canora,
Que ela afugenta da tristeza o açoite;
E, enquanto elevas o teu hino à aurora,
Eu vou rezando as orações da noite...
- Auta de Souza, in “Horto”, 1900.

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