Amigo Diógenes
Nada como o tempo para passar...
A Partitura tocada pelas chuvas nas telhas sempre me
entorpeceram...desde criança que
repito Neruda:eu sou um
passageiro da chuva...
Quando criança, mamãe me embalava na rede tocando no
acordeon: La Cumparsita e Lencinho Branco...dois tangos...quando cantava,
falava do boi da cara preta, que pega as crianças que tem medo de careta...
Ainda criança,aos 7 anos disse a minha mãe: tem música que
corta a gente como uma Gillete...Depois de adulto esccuto Artur da Távola repetir esta mesma frase
minha, ao apresentar músicas de Piazolla...Ele também dizia:Música é vida
interior, e quem tem vida interior jamais padecerá de solidão...Apesar de tudo
tinha Depressão, e o seu Psiquiatra era um Nocacruzense: Domício Arruda
Cãmara,Rj...com ele estabeleceu uma amizade,que o fez ser padrinho de um dos
seus filhos.
Fernando pessoa já falava dos Sinos da minha aldeia e dizia:
A primeira badalada já tem o som de repetida...Quando criança, me impressionava
atristeza provocada pelas badaladas,durante os enterros...Via nos sons a morte,
o fim do caminho, lágrimas, o Incognoscível...
A grande novidade do seu grande texto foi a autoria do Tantun Ergun...Não sabia que
era de São Tomaz de Aquino...
Tnente Freitas era excepcional, um compositor que eu comparava a Miguel Gustavo...Sempre me
procurava para me mostrar a nova canção que tinha composto...Fez o hino, que ainda hoje emociona á cidade:
José Peixoto, não temas a opressão,não é ala moça, que faz ganhar a
eleição...quem elege o candidato É VOTO, do eleitor consciente e nobre, por que
na realidade, O RICO NÃO GOSTA DO POBRE...
Na sua última visita, á nossa velha loja,me falou da sua
última composição: em dezembro de 76, muito marido vai ter desgosto...por que ,
com a nova lei, mulher feia vai pagar IMPÔSTO...
Olival era o
baterista do nosso conjunto: OS MARCIANOS...trouxe para o mundo uma de
suas filhas saxofonistas, fiz uma cesárea e liguei as trompas de Fátima...
Estava no Café Santa Clara, no MIDWAY, e uma moça se
aproximou e disse: O senhor é o Dr.
Bernardo...disse: sou...O Senhor foi quem me trouxe ao mundo...Como eu tinha
vontade de lhe conhecer...Aliás, em Nova Cruz só se fala em DR. Diógenes e em
Dr. Bernardo,tinha vontade de conhece-los...PODE ?
AOS 6 anos, passei na casa de Neco do CORREIO, á
noite,estava havendo uma farra: LUIZ TAVARES NO CLARINETE, CHIQUITO no
violão,ARNÔ no bandolin e Baltazar no pandeiro...pela primeira vez cantei uma
noite inteira, tomando guaraná e comendo carne assada...todos os músicos
ficaram admirados com a minha queda pra música...A partir deste dia, Neco
passou a me chamar de POETA...foi ele
que confeccionou o meu CRACHÀ...
Lembranças importantes para mim , eram AS CANTIGAS DOS
CEGOS...Na esquina da nossa loja, era o melhor ponto para se pedir esmolas,lá
sempre estavam dois cegos, cantando nas feiras, implorando o PÂO DE CADA DIA...Certa vez havia um colóquio popular
entre um cego e uma cega...A CEGA cantava em versos que, tinha tido vinte
machos mas ainda era virgem...o CEGO se
contrapôs também em versos: OU VOSMICÊ
NÃO TEM BUCETA OU SEUS MACHOS NÃO TINHAM POMBA...
Lembro de outros apelos, que os Cegos usavam para amaciar a
caridade dos transeuntes:
A MULHER E OCAVALO MORRERAM NO MESMO DIA...do cavalo eu tive
pena, a mulher deu me alegria : cavalo bom é difícil e mulher ruim tem todo dia...
Menina case comigo que tu não morres de fome,lá em casa tem
uma pinta e mãe mata e nós come, DE DIA TU COME PINTA E DE NOITE PINTA DE
COME...
JOÃO RAMOS ERA DA BANDA DE MÚSICA...POR COINCIDENCIA MORREU
ESTA SEMANA O SEU HERDEIRO MUSICAL: JARCIEL RAMOS,QUE TAMBÉM TOCOU NOS
MARCIANOS...
SOBRE A MÚSICA DE NOVA CRUZ , NÃO SE PODE ESQUECER:
1...O STÚDIO DE QUASE 24 HORAS DA CASA DE TIA NAZINHA,COM
ITAMAR NO ACORDEON, COM NELSON DO ACORDEON E BREJEIRO CANTANDO...SE TOCAVA
DIRETO,SÓ REVEZAVA OS GRUPOS...NA SALA EXISTIA
TODOS OS INSTRUMENTOS,QUEM SABIA TOCAR LEVANTAVA A TRAMELA DA PORTA E
ENTRAVA...A BEBIDA ERA NO MÁXIMO UM COPO DÁGUA FRIA DA QUARTINHA...Neste
tempo,o oitão da matriz era iluminado por lindos choros, que fazia os
transeuntes ficarem hipnotizados,vendo das janelas da casa...Isso se prolongava
até de madrugada, e Nova Cruz adormecia em
Paz... A agilidade de ITAMAR no acordeon,só pode ser comparada a de
SIVUCA...
Lembro também de seu JOQUINHA, na espreguiçadeira de pano,
tocando violão sete cordas,as músicas de Dilermano Reis, as vezes o cantor era
Manoel Pilar...
Me lembro de seu MANDURICO, o tipógrafo de PAULO BEZERRA,tocando violão e cantando com
sua voz de sons médio...tenor...Seu filho WILSON tocava PISTON, e João de Zé
PASSOS tocava SAX, era um músico militar, uma virtuose...
Guardei isto tudo dentro de mim...faz 66 anos que tento
andar, mas não conseguí sair da minha rua.